São Paulo, sexta-feira, 18 de maio de 2007

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Monstrengo superstar

Estréia hoje no Brasil o terror sul-coreano "O Hospedeiro", sucesso de crítica no exterior e recorde de público em seu país; à Folha, o diretor Bong Joon-ho se diz influenciado por Spielberg e Shyamalan

LEONARDO CRUZ
EDITOR-ASSISTENTE DA ILUSTRADA

Desde suas primeiras exibições públicas na Quinzena dos Realizadores do Festival de Cannes do ano passado, o enorme lagarto mutante criado pelo sul-coreano Bong Joon-ho tem feito estragos por onde passa.
A criatura anfíbia é o astro de "O Hospedeiro", produção mais vista na história do cinema da Coréia do Sul, eleito um dos melhores filmes de 2006 pela imprensa européia e motivo de críticas positivas de quase toda a mídia norte-americana.
Com a chegada hoje do filme ao Brasil, o público de São Paulo, Rio e Brasília poderá conferir as causas desse frisson. A partir de um fato verídico, Bong criou um filme de terror diferente do convencional, com passagens de humor burlesco e sátira política e social.
Em 2000, americanos de uma base militar em Seul ordenaram o despejo de 400 garrafas de formol no rio Han. Na vida real, o caso gerou um impasse político internacional. Na ficção de Bong, criou um monstro do tamanho de um microônibus, que seqüestra e come seres humanos. "O Hospedeiro" acompanha a saga de uma família comum para resgatar sua filha caçula, raptada e guardada nos esgotos de Seul para virar petisco mais tarde.
Na entrevista exclusiva a seguir, feita por e-mail, Bong Joon-ho, 37, explica suas influências para escrever e dirigir "O Hospedeiro" e se mostra cético em relação à refilmagem de sua obra por Hollywood.

 

FOLHA - Quando e por que você decidiu fazer "O Hospedeiro"?
BONG JOON-HO -
Na época do colégio, eu morava perto do rio Han e gostava de sonhar acordado, olhando o rio. Também era um grande fã de monstros, como o do lago Ness. Um dia pensei: como seria se um monstro como o Nessie surgisse do Han, um espaço cotidiano dos moradores de Seul? Era o ponto de partida. E o caso do despejo de material tóxico, em 2000, foi perfeito para alguém que preparava a história de um monstro vindo do rio Han.

FOLHA - Que filmes e cineastas serviram de inspiração para "O Hospedeiro"?
BONG -
Um filme que me inspira é "Sinais", de M. Night Shyamalan. Ele trata da invasão alienígena, mas achei interessante porque é mais focado na família do personagem de Mel Gibson. "O Hospedeiro" também foca uma família disfuncional. Outras influências são "O Enigma de Outro Mundo", de John Carpenter, apesar de o filme não ter relação direta com "O Hospedeiro"; "Tubarão", de Steven Spielberg, quando consideramos o tubarão como um monstro; e "Eclipse Mortal", de David Twohy, apesar de este não ser visto como uma obra-prima.

FOLHA - Há, como no Japão, uma tradição de fazer filmes de monstro na Coréia?
BONG -
Nenhuma. Na Coréia, o gênero monstro/criatura tem sido desprezado do ponto de vista artístico. E nos aspectos técnico e industrial, esse tipo de filme é considerado um negócio de alto risco, pois requer muito dinheiro. Então, assim que decidi trabalhar no projeto, tive de suportar as ressalvas e o desprezo de muitos colegas cineastas, que vêem o gênero como infantil e arriscado.

FOLHA - "O Hospedeiro" mescla terror com humor e crítica política. Qual a importância dessa mistura?
BONG -
Gosto quando sentimentos aparentemente não harmônicos são misturados. Essa fusão deixa os filmes mais realistas, pois refletem a sutileza e a complexidade das emoções humanas da vida real. E o cinema é o melhor meio para captar essas emoções. Quando escolho um certo gênero ("Memórias de um Assassino" [2003, lançado em DVD no Brasil] era um policial, "O Hospedeiro", um filme de monstro), minha intenção é quebrar suas convenções. É natural essa fusão de gêneros.

FOLHA - Por que as críticas aos EUA?
BONG -
Há no filme uma sátira política e comentários irônicos em relação aos EUA. Mas o filme também critica a sociedade coreana e seu sistema político, então não é justo afirmar simplesmente que "O Hospedeiro" é um filme "anti-EUA".

FOLHA - A Universal comprou os direitos para uma refilmagem de "O Hospedeiro". Qual será seu envolvimento no projeto?
BONG -
Se virar uma refilmagem verdadeiramente incrível, ficarei feliz de ter sido o diretor do original. Se o "remake" for um filme estúpido, então o original terá ainda mais valor. O "remake" será responsabilidade exclusiva de seu diretor. Agora estou concentrado em criar novas histórias, então não quero me envolver em um "remake". E também acho que o estúdio não está interessado em minha participação. Não me importo se eles fizerem tudo novo e diferente, mas pessoalmente gostaria que os personagens da família continuassem desajustados como no original. A grande diferença entre o original e a refilmagem é que o novo filme deve ser melhor tecnicamente, mas será adaptado aos interesses do grande estúdio. Aí está a graça e o limite do "remake".

FOLHA - Qual sua opinião sobre o interesse de Hollywood por filmes asiáticos, refazendo muitos deles?
BONG -
Creio que Hollywood está cada vez mais perdendo a criatividade, por isso os "remakes" de filmes asiáticos. A indústria coreana tem produzido títulos únicos e dinâmicos.


Colaborou CÁSSIO STARLING CARLOS, crítico da Folha

NO BLOG - Conheça os próximos projetos do diretor Bong Joon-ho e saiba mais sobre o cinema coreano


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