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Monstrengo superstar
Estréia hoje no Brasil o terror sul-coreano
"O Hospedeiro", sucesso de crítica no exterior e recorde de público em seu país; à Folha, o diretor Bong Joon-ho se diz influenciado por Spielberg e Shyamalan
LEONARDO CRUZ
EDITOR-ASSISTENTE DA ILUSTRADA
Desde suas primeiras exibições públicas na Quinzena dos
Realizadores do Festival de
Cannes do ano passado, o enorme lagarto mutante criado pelo
sul-coreano Bong Joon-ho tem
feito estragos por onde passa.
A criatura anfíbia é o astro de
"O Hospedeiro", produção
mais vista na história do cinema da Coréia do Sul, eleito um
dos melhores filmes de 2006
pela imprensa européia e motivo de críticas positivas de quase
toda a mídia norte-americana.
Com a chegada hoje do filme
ao Brasil, o público de São Paulo, Rio e Brasília poderá conferir as causas desse frisson. A
partir de um fato verídico, Bong
criou um filme de terror diferente do convencional, com
passagens de humor burlesco e
sátira política e social.
Em 2000, americanos de
uma base militar em Seul ordenaram o despejo de 400 garrafas de formol no rio Han. Na vida real, o caso gerou um impasse político internacional. Na
ficção de Bong, criou um monstro do tamanho de um microônibus, que seqüestra e come seres humanos. "O Hospedeiro"
acompanha a saga de uma família comum para resgatar sua
filha caçula, raptada e guardada
nos esgotos de Seul para virar
petisco mais tarde.
Na entrevista exclusiva a seguir, feita por e-mail, Bong
Joon-ho, 37, explica suas influências para escrever e dirigir
"O Hospedeiro" e se mostra cético em relação à refilmagem de
sua obra por Hollywood.
FOLHA - Quando e por que você decidiu fazer "O Hospedeiro"?
BONG JOON-HO - Na época do colégio, eu morava perto do rio
Han e gostava de sonhar acordado, olhando o rio. Também
era um grande fã de monstros,
como o do lago Ness. Um dia
pensei: como seria se um
monstro como o Nessie surgisse do Han, um espaço cotidiano
dos moradores de Seul? Era o
ponto de partida. E o caso do
despejo de material tóxico, em
2000, foi perfeito para alguém
que preparava a história de um
monstro vindo do rio Han.
FOLHA - Que filmes e cineastas serviram de inspiração para "O Hospedeiro"?
BONG - Um filme que me inspira é "Sinais", de M. Night Shyamalan. Ele trata da invasão
alienígena, mas achei interessante porque é mais focado na
família do personagem de Mel
Gibson. "O Hospedeiro" também foca uma família disfuncional. Outras influências são
"O Enigma de Outro Mundo",
de John Carpenter, apesar de o
filme não ter relação direta
com "O Hospedeiro"; "Tubarão", de Steven Spielberg,
quando consideramos o tubarão como um monstro; e
"Eclipse Mortal", de David
Twohy, apesar de este não ser
visto como uma obra-prima.
FOLHA - Há, como no Japão, uma
tradição de fazer filmes de monstro
na Coréia?
BONG - Nenhuma. Na Coréia, o
gênero monstro/criatura tem
sido desprezado do ponto de
vista artístico. E nos aspectos
técnico e industrial, esse tipo
de filme é considerado um negócio de alto risco, pois requer
muito dinheiro. Então, assim
que decidi trabalhar no projeto,
tive de suportar as ressalvas e o
desprezo de muitos colegas cineastas, que vêem o gênero como infantil e arriscado.
FOLHA - "O Hospedeiro" mescla
terror com humor e crítica política.
Qual a importância dessa mistura?
BONG - Gosto quando sentimentos aparentemente não
harmônicos são misturados.
Essa fusão deixa os filmes mais
realistas, pois refletem a sutileza e a complexidade das emoções humanas da vida real. E o
cinema é o melhor meio para
captar essas emoções.
Quando escolho um certo gênero ("Memórias de um Assassino" [2003, lançado em DVD
no Brasil] era um policial, "O
Hospedeiro", um filme de
monstro), minha intenção é
quebrar suas convenções. É natural essa fusão de gêneros.
FOLHA - Por que as críticas aos
EUA?
BONG - Há no filme uma sátira
política e comentários irônicos
em relação aos EUA. Mas o filme também critica a sociedade
coreana e seu sistema político,
então não é justo afirmar simplesmente que "O Hospedeiro"
é um filme "anti-EUA".
FOLHA - A Universal comprou os direitos para uma refilmagem de "O
Hospedeiro". Qual será seu envolvimento no projeto?
BONG - Se virar uma refilmagem verdadeiramente incrível,
ficarei feliz de ter sido o diretor
do original. Se o "remake" for
um filme estúpido, então o original terá ainda mais valor. O
"remake" será responsabilidade exclusiva de seu diretor.
Agora estou concentrado em
criar novas histórias, então não
quero me envolver em um "remake". E também acho que o
estúdio não está interessado
em minha participação.
Não me importo se eles fizerem tudo novo e diferente, mas
pessoalmente gostaria que os
personagens da família continuassem desajustados como no
original. A grande diferença entre o original e a refilmagem é
que o novo filme deve ser melhor tecnicamente, mas será
adaptado aos interesses do
grande estúdio. Aí está a graça e
o limite do "remake".
FOLHA - Qual sua opinião sobre o
interesse de Hollywood por filmes
asiáticos, refazendo muitos deles?
BONG - Creio que Hollywood
está cada vez mais perdendo a
criatividade, por isso os "remakes" de filmes asiáticos. A indústria coreana tem produzido
títulos únicos e dinâmicos.
Colaborou CÁSSIO STARLING CARLOS, crítico
da Folha
NO BLOG - Conheça os próximos
projetos do diretor Bong Joon-ho e saiba mais sobre o cinema coreano
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