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CRÍTICA
Com história simples, filme atinge dimensão rara no cinema
PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA
Pequeno grande filme sobre
o perdão, "O Filho" é o quinto longa de ficção dos irmãos Luc
e Jean-Pierre Dardenne e o primeiro a ser exibido comercialmente no Brasil. Ele segue fielmente o estilo de "A Promessa" e
"Rosetta", outros dois "pequenos
grandes filmes" desses extraordinários diretores belgas treinados
na escola do documentário: narração elíptica, câmera na mão e
um rigor ético bressoniano.
"O Filho" bem poderia se chamar "O Pai". A câmera acompanha o tempo todo a figura de um carpinteiro de meia-idade. A história se desenrola exclusivamente
de seu ponto de vista, a partir do
momento em que sua rotina é alterada pela chegada de um aprendiz à marcenaria onde trabalha.
Quem é esse jovem? Por que ele,
e não os outros, merece atenção
redobrada do marceneiro? Por
que a desconfiança evidente, o
olhar que espreita por frestas a
ação do garoto? "O Filho" se constrói quase como um suspense.
Nos primeiros 20 minutos, a câmera não vê o rosto do aprendiz.
Durante esse tempo ela praticamente não sai do pescoço de
Gourmet, sentindo sua respiração
alterada. Só a partir do momento
que algumas informações são reveladas é que a câmera ganha liberdade. Mas aí o espectador já sabe quem é aquele garoto e é da
movimentação da câmera que
nasce a tensão, baseada na proximidade entre os dois atores.
É cinema puro, talvez até purista demais para os padrões de hoje.
Mas o rigor dos irmãos Dardenne
é algo a ser valorizado. A tragicidade da situação de "O Filho" não
é pontuada por choro nem vela.
Não há música, por exemplo. A
secura dá o tom, o que não significa que a emoção esteja ausente.
A emoção mais contida de "O
Filho" não é a mesma que a emoção explosiva do final de "Rosetta", mas a intensidade é semelhante. "Rosetta" talvez tivesse
maior impacto em função da dramática pobreza em que vivia a
personagem-título. Mas é outra a
questão do novo filme, mais centrado na moral do que no social.
Apesar de essencialmente cinematográfico, contando uma história simples com economia de
recursos e de diálogos, "O Filho"
tem uma dimensão que raramente o cinema consegue atingir. E
justamente por não se esquivar
dos grandes temas humanos, ainda que com um tratamento econômico e desespetacularizado, é
um "pequeno grande filme".
O Filho
Le Fils
Produção: Bélgica/França, 2002
Direção: Jean-Pierre e Luc Dardenne
Com: Olivier Gourmet, Morgan Marinne
Quando: a partir de amanhã
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