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OUTRA FREQUÊNCIA
Governo discute se programa para índios é ilegal
LAURA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
Um programa de FM dirigido
a índios e outros moradores
da fronteira do Brasil com o Paraguai, no Mato Grosso do Sul, corre o risco de ser considerado ilegal
pelo governo federal.
Transmitida em nheengatu (segundo o dicionário Aurélio, língua que se originou do tupi), a
atração pode ser enquadrada numa lei de 1963 que proíbe veiculações em língua estrangeira. Pela
regra, só emissoras de ondas curtas podem operar com outros
idiomas, mediante autorização
do Ministério das Comunicações.
Mistura de termos indígenas
com espanhol e português, o
nheengatu originou-se do período da colonização brasileira. Calcula-se que seja utilizado por cerca de 370 mil pessoas no MS.
A essa população é dirigido
"Nheengatu", programa da FM
educativa de Campo Grande que
vai ao ar três vez por semana e
tem estréia marcada na TVE do
Estado em agosto.
Sua sobrevivência no rádio e
migração para a televisão são objetos agora da seguinte análise,
em curso no ministério: essa é ou
não uma língua "estrangeira"?
O processo interno foi aberto
pela pasta em decorrência de uma
notificação recebida do escritório
da Anatel (Agência Nacional das
Telecomunicações) em Campo
Grande. Segundo a assessoria da
agência, o comunicado foi enviado em agosto de 2002, informando a existência de um programa
em "idioma diferenciado, com
guarani e espanhol". Responsável
pela fiscalização, a Anatel questionava se o caso deveria ou não ser
enquadrado na proibição legal.
"Além de tantos crimes históricos contra os índios, querem cometer mais um", afirmou Bosco
Martins, presidente da FM e da
TVE, que recebeu do ministério
solicitação para encaminhar informações sobre o programa.
"O nheengatu foi proibido por
D. João 4º, em 1727, que queria
oficializar o português. Hoje, permanece vivo como uma forma de
resistência cultural", afirma Marlei Sigrist, professora de cultura
brasileira da Universidade Federal do MS, que desenvolveu um
estudo sobre o programa.
"Queremos obter mais detalhes
sobre essa língua para saber se é
ou não estrangeira e se o programa está transgredindo a lei. Vamos trabalhar com cautela porque não temos a idéia de tirar o
programa do ar", disse à Folha
Antônio Armando Moreira, que
acompanha o caso no ministério.
Para Marcos Bitelli, especialista
em leis de radiodifusão, o
"Nheengatu" não pode ser proibido. "A lei que estabelece restrições
a irradiações em idioma estrangeiro não pode ser aplicada ao
nheengatu, que era a principal língua brasileira na colonização."
laura@folhasp.com.br
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