São Paulo, sábado, 18 de julho de 2009

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LIVROS

Crítica/"Cadernos de Guerra e Outros Textos"


Escritos possibilitam revisão da obra de Marguerite Duras

Registros dos anos 40 incluem versões de textos que ela publicaria décadas depois

ADRIANO SCHWARTZ
ESPECIAL PARA A FOLHA

"Cadernos de Guerra e Outros Textos" funciona simultaneamente como porta de entrada e "porta de saída" da imensa obra literária de Marguerite Duras (1914-1996). O volume contém desde trechos de livros iniciais da escritora francesa, dos anos 50, como "Uma Barragem contra o Pacífico", até versões primeiras de romances que ela publicará muito mais tarde, nos anos 80, como "A Dor".
Os textos, redigidos entre 1943 e 1949, período crucial da vida da autora, cumprem assim o papel de mostrar ao leitor uma espécie de painel de sua produção, ao mesmo tempo em que dão a aqueles que já a conhecem a possibilidade de reviver de um jeito diferente o contato com situações e personagens recorrentes.
Como quase tudo o que ela fez, estes cadernos são fortemente autobiográficos, e não foi pequena a atenção que eles receberam dos biógrafos de Duras, como os organizadores do volume salientam. Reaparecem ali a infância vivida na Indochina, a relação com a mãe, a iniciação amorosa, o retorno para a França, os anos da ocupação nazista e da resistência.
Há passagens primorosas, como esta, do segundo caderno, reaproveitado depois em "A Dor", que narra a volta do marido de um campo de concentração em que estivera cativo: "Não seria uma coisa extraordinária se ele voltasse. Atenção: não seria extraordinário.
"Alô?" "Quem é?" "Sou eu, Robert". Seria normal e não extraordinário. Tomar cuidado para não fazer disso um acontecimento que pertença ao extraordinário, o Extraordinário é um mal-entendido. Ser razoável. Eu sou razoável. Espero por Robert, que deve voltar. O telefone: "Alô." "Alô, você tem notícias?" Dois tempos. O primeiro: acontece que o telefone toca, não é inútil esperar que ele toque, um telefone serve para tocar. O segundo: merda. Vont ade de vomitar."
Além dos quatro cadernos, a edição da Estação Liberdade traz também outros quatro textos autobiográficos do final da década de 30 e seis pequenas narrativas de ficção um pouco mais tardias.


ADRIANO SCHWARTZ é professor de literatura da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP.


CADERNOS DE GUERRA E OUTROS TEXTOS

Autora: Marguerite Duras
Tradução: Mário Laranjeira
Editora: Estação Liberdade
Quanto: R$ 56 (384 págs.)
Avaliação: ótimo


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