São Paulo, terça-feira, 18 de agosto de 2009

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Mostra no Rio expõe os "vários" Nabucos

Evento destaca pluralidade do pensamento do intelectual

Em 2010, ano do centenário de sua morte, ABL fará ciclo de conferências; e dossiê feito por especialistas internacionais será lançado


Divulgação
Joaquim Nabuco em retrato do período como embaixador nos EUA

LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO

Para se pensar num político brasileiro que faça jus à expressão "homem público", que seja um ativo intelectual e que sobreponha os valores universais aos objetivos individuais, é preciso, salvo poucas exceções, recorrer ao passado. Preferencialmente, a Joaquim Nabuco.
Amanhã, quando se completam os 160 anos de seu nascimento, será inaugurada no Museu Histórico Nacional, no Rio, a exposição "Joaquim Nabuco: Brasileiro, Cidadão do Mundo".
É o ponto de partida de uma série de eventos e lançamentos motivados por outra data: o centenário de morte de Nabuco, em 17 de janeiro de 2010.
Em comum entre as iniciativas, a busca de dar conta dos vários adjetivos que Nabuco recebeu ao longo da vida: abolicionista, monarquista, diplomata a serviço da República, jornalista, escritor, sedutor...
"Nabuco são muitos", resume a cientista política Helena Severo, curadora da exposição que começa no Rio e, que se depender dela, chega a São Paulo em janeiro de 2010.
Um dos tantos é o político que, quatro vezes eleito deputado, tinha uma visão "universalista", como ressalta o historiador José Murilo de Carvalho. A liberdade dos escravos, sua maior bandeira, não poderia ser contestada em nome da suposta soberania do país.
"Ele não aceitava os protestos dos escravistas brasileiros contra a interferência britânica pela abolição. Não podemos ser nacionais, autenticamente brasileiros, se não incorporarmos valores da civilização", afirma Carvalho.
Para Nabuco, não bastava o fim da escravidão. "Era só o início do processo. Havia toda a tarefa de incorporar os escravos libertos na comunidade", diz o historiador. Seria uma tarefa de cem anos, especulava Nabuco, mas o tempo já se passou e ela não foi concluída.
A sua frase mais famosa ajuda a explicar tamanha demora: "A escravidão permanecerá por muito tempo como a característica nacional do Brasil". Se um recém-liberto comprava um escravo para si, é porque já estava enraizada na cultura nacional uma certa "fraqueza do sentimento do direito civil", como diz Carvalho. Ou seja, a liberdade individual está acima do bem público, princípio perverso que a classe política brasileira comprova dia a dia.
"Prefiram uma carreira obscura de trabalho honesto a acumular riqueza fazendo ouro dos sofrimentos inexprimíveis de outros homens", escreveu ele, crítico da "classe única" que dirigia o país "só se preocupando dos seus interesses de classe, de manter o jugo férreo dos seus monopólios desumanos e atentatórios da civilização universal". E recomendava: "A missão do governo é fazer por política o que a revolução faria pela força".
"Quando é vista como perversa, desviante e desnecessária, há um grande risco para a democracia", diz Helena Severo, ressaltando a importância de Nabuco nos dias de hoje.

Outras lembranças
A Academia Brasileira de Letras, da qual Nabuco foi fundador e o primeiro secretário-geral, prevê para 2010 um ciclo de conferências, uma página específica na internet e publicações, como conta o acadêmico Marcos Vilaça, pernambucano como o homenageado. Ele também conversa com o MEC e o Congresso sobre reedições populares dos três principais livros de Nabuco: "O Abolicionismo", "Um Estadista do Império", e "Minha Formação".
A socióloga Angela Alonso, autora do livro sobre Nabuco da coleção "Perfis Brasileiros", da Companhia das Letras, está organizando com Kenneth David Jackson, da Universidade Yale, o dossiê "Nabuco e a República", com textos de especialistas de vários países.
"Joaquim Nabuco: Conferências", que a editora Bem-Te-Vi lança até o início do próximo ano, também reúne autores de diversas origens, em conferências feitas em Yale (em 2008) e Wisconsin (2009).
O lado sedutor de Nabuco, que lhe valeu na juventude o apelido de "Quincas, o Belo", está mais claro em "Os Mundos de Eufrásia", biografia romanceada de Eufrásia Teixeira Leite, grande amor com quem Nabuco teve idas e vindas mas não se casou, escrita por Claudia Lage e já lançada pela Record.


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