São Paulo, sexta-feira, 18 de novembro de 2005

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CINEMA/"HERÓIS IMAGINÁRIOS"

Filme sem arrojo tranca crise familiar entre quatro paredes

PAULO SANTOS LIMA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Com "Gente como a Gente" (80), Robert Redford dava as costas para um cinema dos anos 50 e 60 que tratava a família como sintoma de questões que iam além das cercanias familiares, herdeiro da dramaturgia de Tennessee Williams e Edward Albee, na qual se partia do conflito para falar, por exemplo, sobre a inversão de papéis no casamento, caso de "Gata em Teto de Zinco Quente" (58). Os problemas dos personagens de Redford estavam entre quatro paredes, mais precisamente na perda de um filho, e desconectados de um contexto que não o de seus próprios personagens.
É o caso de "Heróis Imaginários", de Dan Harris, que repete, 25 anos depois, "Gente como a Gente", também não levando a crise doméstica de seus personagens a outras paradas e preferindo o talento dos atores à mise-en-scène. Não só, há também a perda de alguém valoroso à imagem familiar, no caso, o prodigioso primogênito de uma família classe média norte-americana. O pai, grande apostador que era do sucesso do filho, cai em depressão catatônica e aumenta sua birra ao caçula. Este adolescente não estará de todo abandonado, já que tem a mãe como sua fiel escudeira e um amigo confidente que o acompanha nas baladas.
Diante de tantos desajustes, jamais vistos como indícios de que esta família precisa repensar sua estrutura, fica claro que o caminho que a história tomará é de que pai, mamãe tresloucada e caçula rebelde precisam acertar os ponteiros. E a grande questão do filme, a de que toda família precisa de um herói, mesmo imaginário, para se sustentar, são palavras ao vento proferidas meia dúzia de vezes por algum personagem.
O que nem seria de todo mau se houvesse, ao menos, um arrojo estético ou algo espetacular, como a revelação do patriarca de "Festa de Família", de Thomas Vinterberg, para citar um exemplo.
Ou, noutro caso, se divisarmos o extraordinário "Guerra dos Mundos", de Steven Spielberg, cineasta cuja filmografia tem na família uma certeza moral e inabalável e que com este filme faz o casamento entre drama familiar e "disaster movie" para falar sobre pai e filhos vagando por um mundo apocalíptico onde as relações humanas estão arruinadas.
Daí que o valor de "Heróis Imaginários" está em ser mais um filme a engordar a grande lista de produções atuais que tratam da morte ou da destruição da célula familiar como colapso de um mundo. Um diagnóstico pertinente que não está nesta obra em si, mas em sua existência numa filmografia contemporânea.


Heróis Imaginários
Imaginary Heroes
 
Direção: Dan Harris
Produção: EUA/Alemanha/Bélgica, 2004
Com: Sigourney Weaver, Emile Hirsch
Quando: a partir de hoje no Frei Caneca Arteplex, Cine Morumbi e Lumière


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