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Atores viram "maratonistas" dos palcos
Cléo De Páris, Ana Andreatta e Sergio Guizé são alguns dos que têm duas ou mais peças em cartaz em SP atualmente
"Campeão" da correria é Henrique Mello, que atua em espetáculos cujas sessões de sábado começam exatamente na mesma hora
LENISE PINHEIRO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
LUCAS NEVES
DA REPORTAGEM LOCAL
O nome do ator Henrique
Mello, 25, aparece nos créditos
da peça "Roxo", cuja sessão de
sábado começa às 20h30, no
Espaço dos Satyros 1, na praça
Roosevelt, centro de São Paulo.
A menos de cem metros dali, no
Satyros 2, em dia, horário e praça idênticos, tem início "120
Dias de Sodoma", que traz no
elenco o mesmo Mello. Se ainda é impossível estar simultaneamente em dois palcos, o
ator chega bem perto da façanha ao encarnar, em menos de
duas horas, um baixista iniciante e um jovem explorado
sexualmente por nobres.
Passados os primeiros 20 minutos de "Roxo", Mello deixa
para trás falas e marcações do
músico adolescente para embrenhar-se, pela próxima hora
e meia, no mundo perverso dos
contos do marquês de Sade (veja acima o passo-a-passo de
uma noite de sábado do ator).
Ele até pode ostentar o título
de "maratonista-mor" dos palcos -dada a sobreposição de
horários dos espetáculos-,
mas não está sozinho na modalidade: ao longo da semana, vários colegas de ofício se revezam entre diversos papéis. É o
caso de Ana Andreatta, 37, em
cartaz com "A Festa de Abigaiu" (qui.) e "Simpatia" (sex. a
dom.); Sergio Guizé, 27, que está em "Monólogos da Marijuana" (ter. e qua.) e "Delicadeza"
(qui. e sex.); e Cléo De Páris, 35,
em "El Truco" e "Divinas Palavras" (sáb. e dom.).
Há três meses se dividindo
entre duas montagens, Mello
diz que o pior já passou. "No começo, era punk. A cabeça ficava
fervendo. No fim, dava uma
sensação de alívio. Agora, está
mais orgânico, os conceitos estão formados", avalia. Com tão
pouco tempo para se "desligar"
de um personagem e "entrar"
no outro, ele não receia trocar
as falas? "É um medo constante, mas maior é o temor de uma
peça atrasar e afetar a minha
entrada na outra", afirma.
Falas trocadas
Quem já se confundiu em cena (num ensaio geral) foi Ana
Andreatta. Recentemente, às
vésperas da reestréia de "A Festa de Abigaiu", ela repassava o
texto de sua personagem quando se viu soltando o começo da
fala de um de seus papéis em
"Simpatia". "O diretor ficou
apavorado", lembra. Para evitar tropeços, relê diariamente
cada peça. "Memorizo a sonoridade do personagem, se fala rápido ou devagar."
"Maratonista" novata (desdobra-se entre os espetáculos
há 20 dias), ela fala das desvantagens da dupla jornada. "É
uma loucura, dá um nó na cabeça. Quero dar um tempo nisso."
Mais escolado (participou de
sete peças desde janeiro, com
temporadas concomitantes),
Sergio Guizé conta que, durante dois meses, subiu ao palco de
terça a domingo, em três montagens distintas. "Saía da comédia ["Monólogos'] para um texto superpesado ["Delicadeza'] e
emendava com Sade [em "120
Dias de Sodoma']. Não conseguia fazer mais nada. Mas, se
fosse para viver de bilheteria,
teria que atuar em cinco peças
ao mesmo tempo", observa.
Quando faz dois personagens
na seqüência, o ator usa o intervalo que lhe é dado para "tentar
voltar à neutralidade, por meio
de exercícios de alongamento e
respiração". "A maior dificuldade [para acertar o tom de um
personagem] é na hora da criação, dos ensaios. Depois, o lance é mecânico: já vem a densidade de um, a leveza do outro."
Outra que tem larga experiência em temporadas teatrais
simultâneas é Cléo De Páris. É
do período em que encenou
"Inocência" e "A Filosofia na
Alcova" que ela guarda esta
anedota: ""Inocência acabava
às 23h30 e "Filosofia" começava
à 0h. Não dava nem para comer
um salgado. Uma noite, em
meio ao silêncio absoluto de
uma cena de "Filosofia", minha
barriga começou a roncar."
Em outra ocasião, ela apresentava o infantil "O Dia das
Crianças" com o rosto todo pintado de branco. Ao fim da sessão, o táxi que a levava para o
Espaço dos Satyros, onde faria
"El Truco" meia hora depois,
servia de camarim. "Ia tirando
a maquiagem no caminho, mas
não dava tempo de terminar. A
sorte é que a primeira cena em
"Truco" era com uma máscara."
Em maior ou menor medida,
três dos atores ouvidos pela Folha dizem que acumulam trabalhos por uma questão financeira. Cléo discorda. "Para
mim, trata-se de uma necessidade artística. Talvez até compensasse mais não atuar em
tantas peças, para poder fazer
comerciais."
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