São Paulo, segunda-feira, 18 de dezembro de 2006

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Rosa inspira canções sobre o sertão

Antonio Candido interpreta versos que estão em "Grande Sertão: Veredas" em CD que acompanha publicação da USP

Além de "Canção de Siruiz", adaptada pelo crítico, disco traz o final do livro pela voz do bibliófilo José Mindlin

acervo Família Tess
Guimarães Rosa, homenageado por nova publicação do Instituto de Estudos Avançados da USP e por Caderno de Literatura especial do Instituto Moreira Salles

SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL

Se você acha que já ouviu, leu e viu tudo sobre "Grande Sertão: Veredas" neste ano em que se comemorou fartamente a efeméride de 50 anos da obra clássica de Guimarães Rosa (1908-1967), prepare-se.
Uma inusitada gravação de versos que estão no livro cantados (isso mesmo, cantados) pelo crítico literário Antonio Candido, 88, vem à tona, num disco lançado junto com o número 58 da revista do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP).
"Canção de Siruiz" surge numa adaptação do próprio Candido, que transpôs os versos que estão na obra de Rosa para a melodia de uma canção boiadeira que sua mãe costumava ouvir, ainda criança, quando vivia em Barbacena (MG).
"Naquela época [por volta de 1906], não havia o hábito de se encerar o chão, ele tinha de ser lavado. Quem fazia isso na casa de minha mãe era um preto alto, simpático e de bela voz", contou Candido à Folha. "Seu nome era Antonio Lino; ele cantava inúmeras canções e minha mãe aprendeu várias.
Essa melodia era de uma delas.
Ficou na minha memória e, quando fui registrar os versos de Rosa, construí essa interpretação." Marco Antônio Coelho, editor-executivo da revista, conta que a adaptação do crítico hoje é conhecida na própria região do escritor. "Ninguém sabe mais como era a "Canção de Siruiz" original, a que se conhece atualmente é a de Candido."

Bilhete
A admiração deste pelo autor de "Sagarana" (1946) e "Corpo de Baile" (1956) vem de longe.
A revista também publica um bilhete elogioso que ele escreveu a Rosa em 1965, quando ambos se encontraram em Gênova num congresso com a finalidade estimular as relações culturais entre a Europa e o Terceiro Mundo.
Estavam presentes o crítico uruguaio Emir Rodriguez Monegal, o ensaísta francês Roger Callois e o poeta italiano Giuseppe Ungaretti (os três citados no texto de Candido).
Revista e CD serão lançados hoje, num evento na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, que incluirá uma pequena apresentação musical de Ivan Vilela, músico, compositor e professor do departamento de música da ECA. Também haverá narração de passagens do romance, como o primeiro encontro de Riobaldo com Diadorim e morte deste (ou desta).
Vilela organizou a seleção de faixas que estão no CD "Sons do Grande Sertão". Além da gravação de Candido, o disco traz músicas de compositores que, de alguma forma, se inspiraram na obra para criar, como Renato Andrade, Rodrigo Delage e Wagner Dias.
"O romance é muito imagético, desenha paisagens, cria universos internos. Por isso, as sensações que causa acabam virando música para certos artistas", diz Vilela. ""Grande Sertão" influenciou muita gente por trabalhar com arquétipos.
Com isso, a leitura fica sempre próxima ao estado em que vivemos", conclui.
Também está presente na coletânea a voz do vaqueiro Manuelzão, que serviu de inspiração para Rosa em "Manuelzão e Miguilim". E quem fecha o álbum é o bibliófilo José Mindlin, 92, lendo o final do livro.
A revista traz, ainda, artigos relacionados à cultura popular do sertão mineiro, como entrevistas com os Miguilins (os contadores de histórias mirins locais) e relatos sobre o modo como a comunidade da região de Cordisburgo (cidade natal do autor) trabalha pela transmissão de seu legado. "Quisemos fazer algo diferenciado daquilo que se fez nas outras homenagens ao longo deste ano. Algo menos acadêmico, que viesse do popular", diz Coelho.

REVISTA ESTUDOS AVANÇADOS DA USP
Preço:
R$ 30
Lançamento: hoje, às 17h, no auditório da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP (r. do Lago, 876, Cidade Universitária, São Paulo)
Quanto: entrada franca


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