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A ENTREVISTA
"Violência não tem a ver com rap', diz B-Real
especial para a Folha, em Los Angeles
Como vocalista e fundador do
Cypress Hill, uma das primeiras
bem-sucedidas bandas de rap dos
EUA com integrantes de origem
latina, o rapper B-Real assistiu de
camarote a ascensão do hip hop ao
olimpo da música pop norte-americana.
Viu a realidade das ruas tomar
conta das letras, vivenciou a violência das gangues de Los Angeles
(Costa Oeste dos EUA) e, enquanto isso, lançou quatro discos, sendo que o último, "IV", foi lançado
nos EUA em outubro.
Em entrevista exclusiva à Folha,
B-Real fala sobre o novo disco, sobre o movimento hip hop e sobre a
rixa que divide as Costas Leste e
Oeste dos Estados Unidos num
verdadeiro cabo de guerra musical.
(AE)
Folha - Foi mais difícil para vocês
serem reconhecidos por serem
brancos num meio essencialmente
negro como o hip hop?
B-Real - Ser branco e latino acabou sendo uma vantagem e uma
desvantagem ao mesmo tempo. A
desvantagem era ter que tentar
provar nosso talento para uma indústria dominada por negros, em
que ter a pele escura era como que
um pré-requisito para ser um bom
rapper. A vantagem foi termos sido a primeira banda de origem latina a fazer rap com apelo universal. Tinha um público grande esperando por isso.
Folha - Quais DJs e MCs da "velha
escola" serviram de influência para
o Cypress Hill?
B-Real - Minhas inspirações sempre foram o Run D.M.C., Melle
Mel, Public Enemy, Boogie Down
Productions, Beastie Boys.
Folha - Da "nova escola", que
bandas se destacam?
B-Real - Gosto muito de Wu-Tang Clan, DMX, Busta Rhymes,
Mobb Deep, Flipmode Squad.
Folha - O que mudou no rap nesses últimos dez anos?
B-Real - O rap tem fases cíclicas.
Primeiro surgiu o rap pesado, depois veio um rap com preocupações mais ideológicas e políticas.
Daí surgiu o rap com fortes influências dance e pop, com artistas
como Puffy Daddy e Mase. Agora o
hardcore está voltando, fechando
o círculo. Tem sido sempre assim:
a cada cinco anos, o rap entra numa nova fase, muda drasticamente. Hoje o rap hardcore está novamente em alta e todo mundo está
falando de tráfico de drogas ou de
roupas caras. Provavelmente a
próxima onda será a volta do rap
ideológico. Mas é isso que permite
que o rap cresça.
Folha - Qual a diferença entre o
rap da Costa Leste e o da Costa
Oeste dos EUA?
B-Real - O rap da Costa Leste, que
é representado por Nova York, é
mais rápido, mais enérgico, com
um clima de festa. O rap da Costa
Oeste, representado por Los Angeles, é mais sossegado, com mais influências do rhythm and blues.
Quanto às letras, a Costa Leste se
refere mais a dinheiro, riqueza. As
letras são mais livres. Na Costa
Oeste as músicas são pequenas historinhas, que podem ter como tema as gangues, o amor, as drogas,
qualquer aspecto da vida. Existem
também diferenças de linguagem,
de estilo, de atitude, de roupas.
Mas tudo é hip hop, e essas diferenças são bem-vindas.
Folha - Quais as diferenças do
Cypress Hill nesse novo trabalho?
B-Real - Acho que a principal
mudança é a variedade. O disco
tem música para rir, música para
dançar, música para chorar e música para se enraivecer. Nos nossos
últimos trabalhos, o clima pesado
e sombrio dominava do começo ao
fim. Não havia nada fora aquilo.
Com "Cypress IV" nós conseguimos abranger estilos diferentes.
Folha - Quais suas expectativas
de vendas para este disco?
B-Real - Acredito que cheguemos
a vender 1 milhão de cópias e rezo
para vendermos 2 milhões! Acho
que é um dos melhores discos da
banda, junto com nosso álbum de
estréia.
Folha - O festival itinerante e alternativo Lollapalooza foi cancelado este ano, enquanto a Smokin'
Groove Tour (só com artistas de
rap) e o Smoke Out tiveram ingressos esgotados. O rap está substituindo o rock?
B-Real - Não acho que o rock esteja morrendo como tem sido dito,
só acho que muita gente do meio
roqueiro não sabe o que está fazendo e acaba metendo os pés pelas
mãos. O que não falta é banda boa,
só que elas não sabem se organizar,
se promover. No Smokin' Groove
a gente se envolveu diretamente na
produção. No Smoke Out nós fizemos praticamente tudo -organização, produção, divulgação- sozinhos. Provamos que, mesmo não
sendo promotores, sabemos o que
estamos fazendo. Sabemos como
lotar um lugar, como criar expectativa. Foi um dos maiores shows
do verão em Los Angeles.
Folha - Você acha que o rap promove a violência?
B-Real - Alguns artistas sim. Outros podem parecer que estão promovendo violência, mas na verdade estão se opondo a ela. Eles usam
a situação de violência como um
exemplo do que não fazer. Existem
grupos que incitam a violência e
existem grupos que simplesmente
falam da violência que já existe,
que é parte da realidade deles.
Folha - E a guerra entre gangues
em Los Angeles?
B-Real - Isso é resultado da incapacidade das pessoas de resolver
suas diferenças de forma inteligente. Essa guerra sempre existiu e vai
sempre existir, infelizmente. Às
vezes, parece que vai acabar, mas
sempre volta.
Folha - Ela tem a ver com rap?
B-Real - Não. Violência, gangues
e todos os outros aspectos da vida
nas ruas existem desde muito antes do surgimento do rap. Se o rap
acabar amanhã, as gangues ainda
vão continuar se matando. Gangues e drogas e qualquer outro tipo
de violência vão sempre fazer parte
da vida nas cidades. É uma grande
besteira essa história de que o rap
provoca, incentiva, perpetua ou
glorifica essa violência.
Folha - Vocês vão fazer turnê?
B-Real - Sim, e estaremos nos
apresentando no Brasil com certeza. É um dos nossos lugares favoritos para tocar. É sempre legal fazer
show no Brasil.
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