São Paulo, sexta-feira, 19 de janeiro de 2001 |
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"O ÚLTIMO METRÔ" Filme é reencontro de Truffaut com o cinema clássico francês DA REDAÇÃO "O Último Metrô" começa por ser um filme de reencontros de François Truffaut: com a ocupação de Paris pela Alemanha, com Catherine Deneuve (por quem se apaixonara anos antes; paixão que o levou até a ficar numa casa de saúde por uns tempos) e com o seu judaísmo. O segundo reencontro não é muito relevante, a não ser por seu aspecto anedótico. O primeiro representa, de certa forma, um reencontro com sua juventude. Truffaut sempre quis fazer um filme sobre a ocupação por um ângulo particular: o de demonstrar que essa época não era, no momento, sentida como algo especialmente terrível pela maior parte da população. O terceiro aspecto é mais importante. Truffaut não soube, durante boa parte de sua vida, quem era seu verdadeiro pai. Era um tanto direitista, politicamente, e -até ligeiramente- anti-semita. A descoberta de que o pai era judeu irá transformá-lo em mais um aspecto. A presença de um judeu em cena (o diretor Lucas Steiner/Heinz Bennent) é central no filme. Ele é o homem que permanece escondido no subterrâneo de um teatro, enquanto sua mulher, Marion Steiner (Catherine Deneuve) trabalha normalmente (ou quase) e passa a ocultá-lo. "O Último Metrô" marca ainda um reencontro com o cinema clássico francês de que Truffaut se entupiu durante os anos da guerra, e não será por acaso que o filme é realizado em estúdio, reconstituindo essa atmosfera artificial característica desse tipo de filmagem. Nem que o jovem ator contratado por Marion, Bernard Granger, será Gérard Depardieu, que Truffaut reconhecia como uma espécie de novo Jean Gabin. Certas figuras secundárias, como o crítico teatral Daxiat, não apenas evocam o lado sórdido da ocupação, mas também a atração de Truffaut por um crítico cinematográfico colaboracionista. Existe, por fim, a intriga amorosa envolvendo Lucas, Marion e Bernard numa situação de clandestinidade, que evoca, por vários motivos, "Ser ou Não Ser" (1942), de Ernst Lubitsch, mestre da comédia sofisticada e mestre, em particular, de Truffaut. "O Último Metrô" é um filme de busca da identidade, que os franceses não admiram muito, em parte porque a ocupação continua em suas gargantas como assunto irresolvido, e Truffaut lhes parece pouco crítico ao período. Talvez seja possível observá-lo de outra maneira: ao acertar tantas contas com o passado, não em termos de rancor, mas de evocação de uma época, de certas pessoas e situações, é que Truffaut ingressa plenamente em sua gloriosa maturidade -era já o "cineasta de França", homem do establishment, seguro de si e de seu estilo clássico, de que "O Último Metrô" é exemplo acabado. A seguir viriam filmes como "A Mulher do Lado" (81) e "De Repente num Domingo" (83), que anunciavam a fase talvez mais fértil de sua obra. Uma fase interrompida bruscamente pela morte prematura, em outubro de 84, de câncer, aos 52. (INÁCIO ARAUJO) O Último Metrô Le Dernier Métro Direção: François Truffaut Produção: França, 1980 Com: Catherine Deneuve, Gérard Depardieu Quando: a partir de hoje no Top Cine Texto Anterior: "Pão e tulipas": Quando a gente não quer só comida Próximo Texto: "Corpo fechado": Shyamalan dialoga com "Sexto Sentido" e HQs Índice |
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