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Oscar estrangeiro é alvo de críticas
PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA
Entra ano, sai ano, e as regras
para a escolha dos cinco finalistas
ao Oscar de melhor filme estrangeiro não mudam, apesar das
promessas em contrário.
Considerado um sistema falho e
ultrapassado dentro e fora de
Hollywood, o processo de seleção
da categoria é motivo de polêmicas constantes -mas insuficientes para modernizar as estruturas
enferrujadas da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas.
Um dos fatores que têm complicado a seleção é o aumento sucessivo do número de participantes.
O regulamento determina que
todos os inscritos precisam ser
apreciados pelas mesmas pessoas
-mas proíbe a distribuição de vídeos e DVDs. Como é impossível
que todos os integrantes da comissão especial formada para julgar a categoria assistam a todos os
concorrentes sem exceção, os títulos são agrupados em chaves a
serem apreciadas por subgrupos,
em sessões especiais.
Essa mesma exigência faz também com que apenas um seleto
grupo com tempo disponível (em
geral, profissionais aposentados e
há tempos longe da ativa) participe do processo de seleção.
Um complexo sistema de pontuação leva ao resultado final, que
até pode incluir dois filmes de
uma mesma chave -mas é claro
que quando dois ou mais concorrentes fortes caem num mesmo
subgrupo, pelo menos um deles
pode sair prejudicado.
Tal detalhe faz com que o fator
sorte tenha importância igual à
decisão dos jurados. E essa armadilha do acaso, somada ao gosto
dos votantes, que têm visível predileção por temas edificantes e
politicamente corretos, contribui
para que a lista final traga, invariavelmente, azarões inexplicáveis e ausências surpreendentes.
A última delas, motivo de grande bafafá, girou em torno de "Cidade de Deus", esnobado entre os
filmes estrangeiros de 2002 para,
no ano seguinte, surgir em quatro
categorias da disputa principal, às
quais só se habilitou por ter estreado comercialmente nos EUA.
Neste ano, 58 países submeteram filmes à Academia, com participações inéditas de Costa Rica,
Fiji e Iraque. "2 Filhos de Francisco" enfrentará um forte naipe de
candidatos em potencial entre
seus 57 concorrentes -ainda que
não tenham surgido favoritos absolutos como "A Vida É Bela" ou
"O Tigre e o Dragão".
A Alemanha vem com o drama
premiado no Festival de Berlim
"Uma Mulher contra Hitler", sobre a única mulher que participou
de um grupo de resistência contra
o nazismo. Juntam-se aqui vários
temas prediletos dos acadêmicos,
como Segunda Guerra e martírio.
Ainda da Europa não devem ser
desprezados os representantes da
França ("Joyeux Nöel", superprodução sobre uma breve trégua para celebrar o Natal em meio à carnificina da Primeira Guerra), da
Itália ("La Bestia nel Cuore", sobre dois irmãos adultos que tentam superar o trauma do abuso
sexual), e da República Tcheca
("Stesti", uma comédia delicada
sobre a vida em família, vencedora do Festival de San Sebastian).
Da Ásia, o mais forte concorrente mais uma vez vem da China,
que inscreveu outro épico visualmente espetacular ("A Promessa", de Chen Kaige). A África do
Sul, que em 2005 emplacou "Yesterday", agora apresenta "Tsotsi",
vencedor de vários prêmios do
público em festivais fortes como o
de Toronto. O filme vem sendo
descrito como um filhote adocicado de "Cidade de Deus".
Mas não se sabe como a Academia vai reagir ao palestino "Paradise Now", que conta a história de
dois homens-bomba (premiado
com o Globo de Ouro como melhor filme estrangeiro).
As respostas serão conhecidas
no próximo dia 31, data do anúncio das indicações. Mas já se sabe
que alguns filmes importantes estão de fora da disputa. "Caché",
de Michael Haneke, inscrito pela
Áustria, não pode participar porque é falado em francês e foi todo
filmado em Paris.
"Private", de Saverio Constanzo, representante original da Itália, foi substituído de última hora
pelo mesmo motivo (apesar de
ser uma produção italiana, dirigida por um italiano, conta uma
história passada na Palestina).
Outros seis filmes foram desclassificados por razões semelhantes.
Todos os anos, esse regulamento é posto em dúvida, mas pouco
se faz para mudá-lo. O problema é
criar opções criteriosas e razoáveis. Já correu um forte boato, por
exemplo, que a Academia aceitaria filmes selecionados para os
principais festivais de cinema do
mundo (Cannes, Berlim e Veneza), uma solução que seria mera
transferência do problema, livrando a Academia do critério de
pré-seleção, mas submetendo-a à
escolha dos festivais.
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