|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Última Moda
Alcino Leite Neto - ultima.moda@folha.com.br
"As pessoas estão vivendo como zumbis
"Em entrevista exclusiva, a top conta que vai abrir fundação, escrever livro e diz que não assiste TV, porque é um meio pouco criativo
Para modelo, que está no
Brasil para o desfile da Colcci
que encerra o Fashion Rio,
as pessoas preferem viver
a vida das celebridades
A modelo Gisele Bündchen
está cheia de planos. Dentro em
breve, quer abrir uma fundação
e fazer um livro sobre a sua carreira. Mas seu projeto pessoal
mais acalentado é outro: deseja
se preparar para ser atriz. E a
TV não está de modo algum nos
seus planos. "Eu não assisto
TV, não tenho paciência. Tem
tantas coisas mais inteligentes
que a televisão poderia estar fazendo e não faz!... Agora, eles só
fazem "reality shows". Prefiro
uma coisa mais criativa", diz.
Gisele, a top model mais famosa do mundo, está no Brasil
para o desfile da grife Colcci,
que encerra hoje à noite a temporada outono-inverno do Fashion Rio. A Folha conversou
com a modelo num estúdio no
Rio, antes de ela ser maquiada
para a nova campanha da grife
catarinense, fotografada por
Gui Paganini e com direção de
arte de Giovanni Bianco.
Sentada na cadeira do maquiador, Gisele falou dos distúrbios alimentares no meio da
moda, da importância da educação familiar para criar segurança nas modelos, aconselhou
as pretendentes à top model e
fez um diagnóstico sobre o culto atual pelas celebridades.
"Hoje parece que as pessoas
querem saber mais sobre quem
namorou, casou ou divorciou
do que das coisas que acontecem no mundo. Você sabe por
que isso acontece? É porque
90% das pessoas estão vivendo
como zumbis", afirmou.
FOLHA - Existe hoje uma grande
preocupação com os distúrbios alimentares no meio da moda. O que
você teria a dizer às novas modelos
quanto a isso?
GISELE BÜNDCHEN - É uma situação muito delicada. Você não
pode generalizar e dizer que todas as modelos têm anorexia,
assim como não dá para dizer
que todos os jornalistas ou advogados são assim ou assado. É
óbvio que, na moda, é preciso
ser mais magra do que a média,
isso faz parte do trabalho das
modelos, e as roupas dos designers caem melhor nestas pessoas mais magras. Mas eu diria
também que é muito importante as pessoas serem saudáveis.
Eu comecei com 14 anos e sempre me alimentei superbem,
até demais. Algumas pessoas
vão além dos limites, pois se
sentem inseguras e, principalmente, não têm apoio familiar.
Acredito que esses distúrbios
são provocados por falhas na
educação familiar.
FOLHA - Na carreira, você chegou a
ser pressionada para emagrecer?
GISELE - Nunca. Eu obviamente
já vi isso acontecer. Quando fazia desfiles havia meninas que
não comiam. Mas nem todo
mundo é assim. Mas, quando
comecei, chegavam para mim e
falavam: "Você tem um nariz ridículo, nunca vai ser capa de revista". O que eu poderia fazer?
Ficar chorando ou fazer uma
plástica? Não fiz nada disso,
pois meu pai falou para mim:
"Gisele, quem tem personalidade tem nariz grande. Você tem
muita personalidade". E eu toquei a vida pra frente. Os princípios, a educação: tudo vem da
família. É a educação que te dá
segurança. Nem todo mundo
nasceu para ser Marisa Monte,
com aquela voz linda e aquele
talento todo. Se eu não sou Marisa Monte, não é por isso que
vou me deprimir. Vou continuar a minha vida.
FOLHA - Mas o que dizer às meninas que tentam ser modelos e não
estão estourando? Ou àquelas que
tentaram e não conseguiram fazer
sucesso?
GISELE - Cada um tem um caminho diferente, mas é sempre
importantíssimo ser realista.
Acho que é legal você ir até lá e
tentar, se é isso que você quer.
Mas, se não der, tudo bem.
Gente, tem 1 bilhão de meninas
querendo ser modelo. Que eu
saiba, apenas dez vão fazer sucesso. Outras vão trabalhar por
um tempo e depois terão que
fazer outra coisa. A carreira é
muito curta, é um momento. É
muito difícil conseguir atravessar este momento e continuar
com sucesso. É preciso ter senso para perceber que, se não der
para ser top model ou ser a Marisa Monte, você deve fazer outra coisa. Deve estar aberta para a vida, com suas surpresas.
Se você foca demais, obsessivamente, bloqueia as outras
oportunidades da vida.
FOLHA - O que você pretende fazer
depois que encerrar a carreira de
modelo?
GISELE - Quero fazer um livro.
Não uma biografia, que é para
quando eu tiver 90 anos. Mas
um livro sobre a minha carreira, contando o que aconteceu. A
gente tem todas essas fases,
criança, adolescente, os filhos,
virar avó, eu quero viver todas
elas. Mas decidi que não vou
mais controlar minha vida como se estivesse num túnel.
Também gostaria de tentar ser
atriz. Adorei atuar em "O Diabo
Veste Prada", foi como se tirasse férias do meu trabalho. Fiquei abalada de estar perto da
Meryl Streep, que eu amo. Mas
sei que tenho que me esforçar
muito para ser atriz. Também
estou trabalhando para abrir
minha própria fundação. Mas
ainda é uma coisa embrionária.
Estamos fazendo pesquisas há
um ano e meio para saber em
que área a atuação desta fundação seria realmente efetiva.
FOLHA - Você não gostaria de fazer
televisão?
GISELE - Não, preferiria atuar,
porque, quando você atua, existe um ato de criação. E, quando
você faz um programa de TV,
não é exatamente uma criação.
Quando eu desfilo ou fotografo,
por mais que seja eu mesma,
para cada cliente eu estou tentando trazer uma outra personagem. Se você olhar para as
minhas fotos, vai ver várias personagens. Eu não assisto TV,
não tenho paciência. Prefiro
ler. Tem tantas coisas mais inteligentes que a televisão poderia estar fazendo e não faz!...
Agora, eles só fazem "reality
shows". Eu acho isso horrível.
Prefiro uma coisa mais criativa.
FOLHA - Outro dia fotografaram
você numa praia, arrumando o biquíni, e a foto foi muito comentada
porque nela aparecia seu bumbum.
Os paparazzi perturbam muito?
GISELE - Olha, eu acho que o
mundo está ficando cada vez
mais ridículo. Eu estava numa
praia particular, sem nenhum
ser humano por perto, e surge
do nada este fotógrafo para tirar uma foto. O mundo está
cheio de problemas, e as pessoas de repente passam achar
que uma mulher arrumando
um biquíni é a coisa mais importante. Hoje parece que as
pessoas querem saber mais sobre quem namorou, casou ou
divorciou do que das coisas que
acontecem no mundo. É ridículo. Você sabe por que isso acontece? É porque 90% das pessoas estão vivendo como zumbis. Elas têm medo de olhar para dentro delas mesmas. Preferem viver a vida das outras pessoas, e não as suas vidas. Elas
não estão despertas para o
mundo, para as suas vidas. São
como zumbis.
Fashion Rio sofre com fórmulas clonadas
A edição outono-inverno
2007 do Fashion Rio termina
hoje com uma nova apresentação de Gisele Bündchen no desfile da grife Colcci. A presença
da top já não é novidade na
temporada carioca, mas mesmo assim funcionou como um
dos atrativos de uma temporada marcada pela falta de idéias
e pelo excesso de fórmulas
prontas repetidas à exaustão.
Num momento em que o
Brasil briga para criar uma
identidade para a moda nacional e luta por espaço no mercado estrangeiro, é no mínimo
decepcionante constatar que
muitas marcas continuam
usando referências tão explícitas e até mesmo literais a coleções apresentadas anteriormente na Europa e nos EUA.
Aproveitando o fato de que o
inverno brasileiro é leve e, portanto, pede roupas um pouco
mais frescas, muitas grifes e estilistas pescaram idéias da temporada internacional de verão e
deram a elas um verniz adequado à estação fria.
Subprodutos das últimas coleções de grifes como Prada,
Calvin Klein, Marni e Gucci
apareceram várias vezes na
passarela, em apresentações
sem nenhuma originalidade.
Muitas delas não mereciam estar numa semana de moda do
porte do Fashion Rio-ficariam
mais bem situadas num evento
comercial, no qual a criatividade não fosse exigência básica.
De uma forma geral, as grifes
com propostas menos pretensiosas e focadas numa elegância jovem e sem afetações de luxo apresentaram os melhores
resultados. Nesse segmento, a
Sommer foi um dos destaques.
A estilista Thaís Losso trabalhou com mais segurança sua
pegada ultrapop e, principalmente nos looks masculinos,
resgatou shapes e elementos do
universo lúdico do criador da
marca, Marcelo Sommer.
Elegância cool
Outro ponto alto foi a grife
masculina Reserva, que voltou
a chamar a atenção com sua
moda que valoriza o melhor do
lifestyle carioca, aliando uma
atitude cool a uma elegância
pautada principalmente pelo
conforto e pela praticidade. A
Cantão e a Maria Bonita Extra
também mostraram boas coleções, com peças que funcionam
tanto dentro do desfile quanto
separadas nas araras.
O segredo dessas marcas, que
não precisaram de pirotecnias
nem malabarismos, está em
entender as necessidades e desejos dos clientes, olhando
mais para as ruas brasileiras do
que para outros países.
com VIVIAN WHITEMAN
Texto Anterior: Greenaway, Paglia e intelectuais vêm ao país Próximo Texto: Café: Barista veterana vence disputa e representará Brasil no Japão Índice
|