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Acontece em Kassel
Diretora artística da próxima edição da Documenta, em 2012, conta como elabora a mais importante mostra de arte contemporânea do mundo
Uwe Zucchi - 24.jan.2009/ Corbis
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Carolyn Christov-Bakargiev, 52, diretora artística da Documenta de 2012
FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL
Desde 1972, a Documenta de
Kassel é considerada a mais importante mostra de arte contemporânea. Uma das razões
para tanto é que seus diretores
têm cerca de quatro anos para
organizá-la e, como diz a norte-americana Carolyn Christov-Bakargiev, em tom metafórico,
"certos experimentos científicos não podem ser alcançados
antes de três ou quatro anos".
Indicada para diretora artística da Documenta, em dezembro de 2008, por comitê que
contou com o brasileiro Paulo
Herkenhoff e que teve como finalista Lisette Lagnado, Christov-Bakargiev, 52, ainda está na
fase inicial da pesquisa.
"Eu queria ter ido ao Brasil,
em 2009, ver o Panorama [no
Museu de Arte Moderna], do
Adriano Pedrosa, mas, como só
me desliguei do museu Castello
di Rivoli [em Turim], em dezembro, acabei não conseguindo. Mas certamente irei agora
em 2010, pois estou criando
uma rede, e o país está em minha rota", contou à Folha, por
telefone.
"Eu nunca gostei de trabalhar sozinha, eu gosto de colaborações, de pingue-pongue
com muita gente. Foi assim
que fiz a Bienal de Sydney e a
Trienal de Torino", afirma a
curadora. Christov-Bakargiev
esteve no Brasil quando organizou a Bienal de Sydney, na
Austrália, em 2008, e daqui levou quatro artistas para a exposição: Anna Maria Maiolino,
Marcellvs L., Hélio Oiticica e
Renata Lucas -que já foi convidada para a Documenta, segundo curadores próximos à
norte-americana.
Ainda sem um projeto final,
já que a mostra se realiza apenas em 2012, Christov-Bakargiev pretende manter algumas
das marcas das últimas Documentas, entre elas descentralizar a arte ocidental, como afirma na entrevista abaixo.
FOLHA - Para ser selecionada como
diretora artística você precisou elaborar um projeto?
CAROLYN CHRISTOV-BAKARGIEV -
Não foi exatamente um projeto. O comitê de seleção me contatou e, para ser aceita como
candidata, precisei responder a
três questões. A primeira foi
para que serve a Documenta e
qual é o seu papel; depois, qual
é minha metodologia -o que
foi muito interessante, pois, estranhamente, nunca pensei
nisso, e foi um exercício de autorreflexão. E, finalmente, o
que é necessário -uma questão
também interessante, porque,
afinal, o que se pode dizer que é
necessário? Mesmo a vida pode
não ser necessária e, então, mudei [a questão] para o que se pode fazer.
FOLHA - Então, o que se pode fazer?
CHRISTOV-BAKARGIEV - Bom, isso
muda com o tempo, mas, basicamente, creio que a Documenta se transformou num estado da mente na paisagem
contemporânea, tanto no mundo da arte como além dele.
Creio que tenha se tornado
um estado mental, pois nela se
pode pensar no papel da cultura no mundo. Mas isso eu escrevi há mais de um ano e, talvez, eu mesma já tenha mudado de opinião (risos).
Certo é que o mundo se
transformou de maneira dramática e radical desde 1955.
Hoje, como se sabe, é muito diferente, a arte se tornou popular -o que não era nem mesmo
nos anos 1970, quando Harald
Szeemann fez a Documenta.
Assim, ela sempre esteve vinculada a esse desejo de uma
consciência coletiva e, por outro lado, tem sido espaço para
debater sobre o alto modernismo e os tempos pós-coloniais,
uma negociação durante a globalização.
FOLHA - Mas qual é a diferença entre
a Documenta e as bienais e feiras de
arte?
CHRISTOV-BAKARGIEV - As bienais, que hoje chegam a 154 em
todo o mundo, possuem uma
certa independência territorial
e independência enquanto laboratórios de experimentação
para novas praticas artísticas e
novos modelos de sociedade. Já
as feiras de arte, assim como o
mercado da arte, não são experimentais e transferem para
um objeto artístico um tipo de
investimento simbólico de
marcas imateriais. Como vivemos numa sociedade de marcas
imateriais, que é o mundo digital, de repente as obras de arte
são o mais importante produto
da sociedade, pois são a materialização de marcas imateriais.
Além desses dois mundos,
existe a Documenta, e o que a
caracteriza é que ela ocorre a
cada cinco anos -e esse tempo
a transforma num dinossauro
muito lento. Alguém me disse
que deveríamos chamá-la de
"ela já está atrasada", o que eu
não vou fazer, mas, se pensamos no conceito de "inatualidade suprema", como tantos filósofos exploraram na importância de não se estar em dia, isso dá à Documenta um desafio,
que é ter outro tempo.
Certos experimentos científicos não podem ser alcançados
antes de três ou quatro anos, é
preciso um longo tempo para se
estudar o comportamento de
um animal, por exemplo.
Folha - E como você a vê até agora?
CHRISTOV-BAKARGIEV - É uma exposição no centro da Europa, e
sou consciente de que isso gera
um problema duplo. Por um lado, defendo que toda exposição
seja muito baseada no local onde ocorre, pois acredito que a
verdadeira experiência da arte
tem a ver com o corpo e, portanto, deve ter uma relação
com o espaço onde acontece.
A Documenta não pode se fechar nela mesma, pois o incrível movimento que fez com Catherine David (1997) e com Okwui Envezor (2002) foi ajudar a
descentralização da arte ocidental e ver a impossibilidade
de pensar através de formas
que não sejam complexas ou rizomáticas.
Seria absurdo isolar Kassel,
sem se descentralizar demais,
senão seria uma nova forma de
neocolonialismo, o que também seria absurdo. Assim, eu
não lhe contei o que vou fazer,
mas os problemas com os quais
me confronto.
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