São Paulo, sexta-feira, 19 de março de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CARLOS HEITOR CONY

O Rio não é apenas um balneário


A descoberta do pré-sal será a compensação para corrigir uma injustiça histórica


RETORNO HOJE ao assunto que abordei na crônica publicada na página 2 do último domingo: os royalties do pré-sal. Como se sabe, embora dependendo ainda da aprovação no Senado e da decisão do presidente da República, há uma onda que procura espoliar o Rio de Janeiro e o Espírito Santo dos benefícios advindos da grande reserva de petróleo que colocará o Brasil entre os gigantes da produção da fonte de energia que ainda é a maior de nossa atual civilização.
O argumento brandido pelos que desejam espoliar os dois Estados potencialmente produtores é caviloso e anti-histórico. O subsolo do país pertence à União e não aos Estados. Nem sempre foi assim, nem no Brasil nem em outros países. Nos Estados Unidos, a corrida do ouro beneficiou primordialmente a Califórnia e os Estados produtores de petróleo.
Evidente que a Federação teve seus ganhos, a grandeza de uma parte beneficia o todo. No Brasil também foi assim. Embora não seja um minério, o ciclo da borracha beneficiou enormemente a região amazônica, assim como o ciclo da cana beneficiou os Estados nordestinos que chegaram a criar uma civilização que Gilberto Freyre e José Lins do Rego denominaram como ciclo do açúcar, com os engenhos e as casas grandes criando uma civilização, que, apesar de contemplar apenas partes da nossa Federação, contribuíram para a economia nacional como um todo.
O norte fluminense, considerado uma das regiões mais pobres do país, também conheceu decadência, sobretudo após a abolição da escravatura, que trouxe o abandono quase total da lavoura canavieira pela falta da mão de obra escrava.
O exemplo mais notável dessa injustiça ocorreu em Minas, merecidamente chamada de "Gerais". Ali, o elemento econômico que gerou progresso e riqueza para o grande Estado foi o minério, o ciclo do ouro, dos diamantes e, sobretudo, do ferro. Ninguém pensou em tirar de Minas o que era de Minas, cujo ouro enriqueceu Portugal e Inglaterra e cujo ferro é ainda sustentáculo de seu progresso.
Convém repetir que esse progresso estadual beneficiou o Brasil como um todo, mas a parte do leão ficou e continua amplificando a economia mineira. No início da nossa produção petrolífera, foi o Recôncavo Baiano o grande beneficiário da incipiente riqueza mineral.
Com a descoberta do pré-sal, há um movimento que teve seu ponto alto na Câmara dos Deputados, no sentido de tornar a nova fonte de riqueza distribuída por todos os estados, como se o Rio e o Espírito Santo não fossem pedaços da própria União. Evidente que a nova riqueza dará ao Brasil um lugar de destaque entre os grandes produtores de petróleo do mundo, o benefício será geral, com distribuição de royalties de acordo com as necessidades locais.
Mas a natureza, que privilegiou o Rio com a beleza natural que ninguém disputa nem contesta, mais uma vez o coloca em situação de recuperar o que perdeu com o abandono da lavoura da cana e do café. Durante o império, a província do Rio de Janeiro foi das mais ricas, entrando em decadência que ainda hoje é visível no norte fluminense.
A descoberta do pré-sal será a compensação para corrigir uma injustiça histórica. Além do mais, a Federação será igualmente beneficiada, mas em escala que não pode nem deve provocar uma injustiça aos dois Estados em questão.
O rombo que uma distribuição igualitária trará à economia dos dois Estados é fácil de prever. O governador Sérgio Cabral chegou às lágrimas ao saber que não terá recursos compatíveis para bancar os dois eventos mundiais marcados para o Rio: a Copa do Mundo de 2014 e, sobretudo, as Olimpíadas de 2016.
Curioso é que tudo o que o Rio ganha de notável vem lá de fora, inclusive uma das sete maravilhas do mundo moderno. A depender daqui de dentro, o Rio se transformaria num balneário, numa cidade frívola, do Carnaval e do futebol. A grande oportunidade de se transformar num gigante econômico está sendo dada pela natureza e não pode ser tirada pela ganância ou pela inveja dos demais Estados da Federação.


Texto Anterior: Resumo das novelas
Próximo Texto: Dança: Morre aos 54 anos a coreógrafa Roseli Rodrigues
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.