São Paulo, quinta-feira, 19 de abril de 2001

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GASTRONOMIA

EXÓTICO

Estabelecimentos americanos comercializam carnes como a do leão

O rei dos animais vira churrasquinho de rico

SÉRGIO DÁVILA
DE NOVA YORK

O leão pode ser o rei dos animais, mas também rende um bife delicioso, que lembra a carne de porco em gosto e consistência. Já a zebra, sua colega de estepes e savanas, fica mais saborosa se preparada como churrasco.
Era inevitável. Depois de anos e anos de exuberância irracional na economia e já esgotadas as incursões à alta culinária francesa e italiana, o norte-americano endinheirado começa a descobrir a graça das carnes exóticas.
Já há pelo menos cinco estabelecimentos no país que comercializam tais produtos, sendo o maior o site 888eatgame ("eat game", ou "coma caça"). No item "carnes realmente exóticas", as ofertas vão dos já citados leão e zebra a lhama e cascavel.
E sai? Bastante, segundo o proprietário do site, Greg Landry, que não revela números. Ele só pede um prazo razoável de entrega, pois tem de importar pedido a pedido de seu fornecedor africano, e aconselha que o cliente faça amizade com o açougueiro local, pois o pacote despachado traz sempre uma peça inteira.
Não é barato, também. Um espetinho de leão pode custar R$ 130 o quilo. Já o lombo está um pouco mais caro: R$ 160 a peça. Nesse sentido, vale mais a pena encomendar a lhama sul-americana, a modestos R$ 30 o quilo, mais despesas de envio.
Não é preciso se apertar na hora da degustação, pois o próprio site fornece sugestões de preparo. Tente a Caçarola de Urso à Nova Inglaterra, por exemplo: leva vinho tinto, alecrim, cebolas, pimenta em grão e cravo. Tem de deixar no forno duas horas por quilo de urso a ser consumido.
Greg Landry promete agora incorporar outro item muito pedido por seus clientes entre as opções de seu site baseado em Hollywood (não a de Los Angeles, mas sua homônima na Flórida): carne de hipopótamo.
Para os mais preguiçosos ou com menos talento culinário, já há restaurantes que oferecem carnes exóticas em seu cardápio. No Eight Mile Creek, de Nova York, por exemplo, é popular a salada com nacos de canguru.
O marsupial, servido em filés sobre um leito de lentilhas, lembra o gosto da brasileira picanha de vaca, assim como o hambúrguer de avestruz, outro dos pratos oferecidos no ponto australiano. Segundo Landry, do 888eatgame, canguru é a nova febre.
Do outro lado do país, em Santa Barbara, na Califórnia, o restaurante Cold Spring Tavern incorporou recentemente pratos à base de leão com sucesso. Agora, pensa em girafa e camelo.
Para chegar aos EUA, as carnes exóticas não passam pela fiscalização rígida que sofrem os suínos e os bovinos, principalmente nesta época de vaca louca. Não são nem mesmo reguladas pelo Departamento de Agricultura.
Estão sob o chapéu do Food and Drug Administration, agência federal americana que controla alimentos e medicamentos, que divulga uma lista dos animais que podem ser vendidos legalmente como "carne de caça".
A única exigência é que sejam "manuseados corretamente", não façam parte da lista de animais em extinção e estejam à disposição para eventual inspeção.

Como os romanos
De acordo com o historiador gastronômico Warren Belasco, da Universidade de Maryland, o interesse atual por tais alimentos pode ser reflexo da noção de que o ser humano é o mundo, portanto pode comer o mundo, uma herança do Império Romano.
Segundo escreveu o autor do livro "Appetite for Change: How the Counterculture Took on the Food Industry" (Apetite por Mudança: Como a Contracultura Enfrentou a Indústria Alimentícia, Cornell University Press, 1993), há ainda o fator chamado "magia simpática": "Se eu comer um leão, eu me torno um leão".


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