São Paulo, domingo, 19 de julho de 2009

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Mônica Bergamo

bergamo@folhasp.com.br

Galã, eu?

Em cartaz no Rio e a caminho de SP, Edson Celulari celebra 17 anos de união com Claudia Raia, mas diz que "as pimentas" estão "debaixo do travesseiro dela"

Fernando Donasci/Folha Imagem
No camarim, o ator encarna Edna Turnblad

Dia desses, Miguel Falabella recebeu um recado na secretária eletrônica: "Fiquei no banheiro com o Edson até as 3h da manhã, ensinando ele a fazer um pezinho [movimento delicado com o pé]". A paciente professora era a atriz Claudia Raia, que vem ajudando o marido, Edson Celulari, 51, um dos principais galãs de novelas do país, a se transformar em uma delicada e rechonchuda mulher para encarnar o papel de Edna Turnblad, no musical "Hair- spray". Dirigida por Falabella, a peça acaba de estrear no Rio e deve chegar a SP em outubro.

 

Dias depois, Falabella respondeu à ligação de Claudia. "Bebê, o pezinho tá de matar." Estrela de musicais, Claudia agora divide com o marido, além de toda a vida caseira, dicas e professores de canto e dança. "Nosso instrutor de canto diz que é a primeira vez que ele vê uma mulher ensinando o marido a ser uma mulher."

 

No primeiro dia de ensaio no teatro Oi Casa Grande, no Rio, Celulari chega de camisa lilás Armani Exchange, calça azul-marinho e sapatos marrons. Carrega uma mala com objetos da personagem, mas não quer deixar a reportagem vê-lo trocando de roupa no camarim. É Falabella quem o convence. "Ele disse: "Vai, escancara logo o corpo dessa gorda, bota pra fora!'" Celulari aceita e mostra como vira "a gorda". Com cinco quilos de próteses, feitas de espuma e silicone, os 88 kg do ator Edson se transformam nos 150 kg da dona de casa Edna.

 

"Vem aqui, pega nesse peito!", diz ele à repórter e a Falabella apontando para as próteses, antes de vestir um tailleur rosa ["adoro essa roupa"] e sapatos da mesma cor, tamanho 44. Com os quilinhos extras, Celulari não cabe nas poltronas e tem que sentar de ladinho para assistir às cenas dos colegas. "Essa bunda tem vida própria, cada lado é independente", diz ele. Falabella ajuda. "É a bunda Brasília. Tem a Asa Norte, a Asa Sul e o Eixo Monumental."

 

Enquanto prova outro modelito, verde com florzinhas, Celulari diz que o pior de ser mulher são os cílios e os saltos -"Que mania essa a da mulher de ver o mundo de cima"- e que o treino para virar a gordinha Edna fez com que começasse a olhar algumas mulheres com uma ponta de inveja, mas também com mais cuidado. "A mulher é mais comparativa, mais competitiva [com outras mulheres], e isso a expõe mais."

 

Durante o ensaio, entre uma piada e outra, Falabella diz que escolheu Tilu [apelido que deu para Edson] não por ele se parecer com John Travolta [que encarnou a mesma personagem em versão para o cinema em 2007], mas porque o galã global não era uma opção óbvia.

 

""Eeeu seria uma escolha óbvia. É difícil prum homem fazer a delicadeza do braço de uma mulher, que é diferente de uma desmunhecada. [A personagem] é uma mulher, não uma bichona", diz Falabella.

 

O ensaio vai até as 4h e, no dia seguinte, no almoço no CT Brasserie, bistrô do chef Claude Troisgros, Celulari diz que não pode nem pensar em tomar uma taça de vinho. "Se eu tomo, durmo aqui mesmo."

 

Antes de fazer o pedido ao garçom, Celulari pede licença para encomendar flores, pelo celular, para o amigo e diretor Cacá Carvalho, que estrearia a peça "Os Figurantes" em SP. "Anota o texto, por favor: "Cacá e trupe, muita merda. Não da vizinha, merda de verdade. Beijos, Edson e Claudia"." Explica, Edson! "É que estourou um cano da vizinha, e eles passaram um dia, no meio do ensaio, tentando resolver."

 

Cara conhecida de novelas como "Que Rei Sou Eu?" e "Fera Ferida", o ator também tem currículo no teatro. Uma de suas primeiras montagens foi "Fedra", que estrelou com Fernanda Montenegro, em 1986. Mas foi "Calígula" (1990), em que ficava nu, sua peça mais polêmica. Antes da estreia, disse que a produção era quase um suicídio financeiro, mas que estava disposto a correr riscos.

 

A opção pelo formato mais comercial dos musicais significa que perdeu o gosto pelo perigo? "Não. Produzir cultura no país sempre é estar correndo riscos. Naquela época ou hoje." "Hairspray" capta recursos por leis de incentivo, assim como um musical que Claudia Raia está produzindo. "Por que vai impedir o musical? O público brasileiro gosta. Se você pensar que um espetáculo como esse vai se pagar apenas com dinheiro [de bilheteria], é mentira."

 

"Num momento de crise, as empresas se recolheram. Fechamos o primeiro semestre com uma dificuldade imensa, e todo mundo está captando. Não é porque sou uma pessoa conhecida pela televisão que eu vou perder certos direitos."

 

Enquanto põe os óculos de aro roxo para ler o cardápio, diz que o casal aceita participar de eventos em troca de cachê, desde que não sejam políticos. "Já recebi ofertas de cachês astronômicos para apoiar campanhas. Eu acho que o político se atrai pelo artista, o artista pelo poder do político, mas eles não combinam. É um casamento que não pode dar certo."

 

Pede uma água e escolhe o risoto de camarão, prato que no outro bistrô de Troisgros ganhou o nome de "A Paixão de Claudia e Edson", em homenagem ao casamento que deu certo. O casal que se formou a partir do par romântico da novela "Deus nos Acuda" está junto há 17 anos e tem dois filhos, Enzo, 12, e Sophia, 6. Segundo Celulari, a durabilidade da relação não é raridade só no meio artístico.

 

"Relacionamento é difícil mesmo. Tem que ter afinidade e disponibilidade para a vida a dois. A coisa mais triste é ver um casal quieto num restaurante", diz. "Se você me encontrar com a Claudia calado no restaurante, é porque tem um assaltante embaixo da mesa." Claudia disse recentemente que o "sexo continua apimentado" entre os dois e que o casal vai "mudando de pimenta, uma hora é a dedo-de-moça, outra, é o tabasco". Celulari ri. "Não tô vendo essas pimentas de que ela tá falando. Devem estar debaixo do travesseiro dela."

 

O "custo-benefício" do relacionamento, diz ele, é o que garante a fidelidade. "O ser humano é cheio de vontades, mas, se está feliz, você deve preservar quem está te fazendo feliz." Já Claudia acredita que existe um "fetiche no inconsciente coletivo" para saber como um casal como eles lida com a questão do ciúme, da fidelidade. "Não que não possa acontecer [a traição], mas ele não me dá motivos para desconfiar. Mesmo assim, com um homem desses, tem que ter sempre três olhos abertos."

 

Os três olhos de Claudia podem não ser páreo para os 300 que param para olhar Celulari no restaurante, no teatro, no shopping. Ele, que já foi chamado de "homem da vida de qualquer mulher" por Ana Paula Arósio, rejeita o rótulo de metrossexual, mas não dispensa a pedicure a cada 15 dias e os encontros com a dermatologista.

 

Já teve "personal stylist", mas desistiu porque "ficava complicado com tanta lista [de roupas]". Hoje, aceita sugestões da mulher. "Ela sugeriu que eu usasse esta malha." A marca? Não lembra e mostra a etiqueta. Dolce & Gabbana. A calça? "Pode ser do Ricardo [Almeida]." O tênis? "Não sei", diz, obrigando a repórter a checar sua sola. Lanvin. "Lanvin?", questiona, como que surpreso.

 

Ricardo Almeida, o estilista, é um amigo com quem Celulari joga tênis de mesa e conversa sobre moda. No computador, Almeida tem as variações das medidas do ator, para os planos A, B ou C. "A é normal, B é um pouquinho acima [do peso], C é um pouco abaixo." Outro amigo é Wanderley Nunes, cabeleireiro que faz a "manutenção" de suas mechas a cada 15 dias.

 

O celular toca. É Claudia. "Oi, coisa linda. Tô aqui passando por um teste que você nem imagina. Mas tô chegando." Hora de passar tempo com a família antes de mais um ensaio.

 

Apesar da cultivada imagem de bom moço, Celulari custa a entender por que ainda é tão assediado. Já se assustou com uma fã escondida dentro de seu armário em um hotel e teve de aguentar a abordagem de senhoras de 70 anos fazendo voz de garotinhas quando interpretou o "tio Glauco", fã de Lolitas, em "América". Mas a beleza incomodou mesmo quando ele, ainda adolescente em Bauru (SP), começou a fazer teatro e a ouvir que um rostinho bonito daqueles só faria sucesso na TV. "Eu queria fazer teatro. Aí, fiquei uma semana sem tomar banho. Fiquei fedido. E me olhavam do mesmo jeito."

 

Se os olhares persistem mais de 30 anos depois, pelo menos uma coisa mudou. "Hoje, tomo banho todo dia, até dois."


Reportagem ADRIANA KÜCHLER


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