BRUNO YUTAKA SAITO
DA REDAÇÃO

Em determinada altura do documentário "Tudo sobre Desejo: O Cinema de Pedro Almodóvar" (GNT), Francisca Caballero, a mãe do diretor espanhol, reclama: "No começo, seus filmes eram muito nojentos". O filho retruca: "Mas mãe, eram os anos 80!".
Personagens de filmes de Almodóvar, 51, como as freiras ninfomaníacas tomadas por viagens lisérgicas de "Maus Hábitos" (1983) ou o terrorista islâmico gay de "Labirinto de Paixões" (1982), passaram muito perto do sexo bizarro e da escatologia. Anos 80 servem como referência básica, afinal, o termo "excesso" é comum para a produção do diretor até hoje. Ao abandonar a comédia de absurdos pelo melodrama, nos anos 90, sai o riso e entram as lágrimas, igualmente em excesso.
Lembra o documentário que o espanhol faz parte de uma categoria singular de cineastas em que figuram Alfred Hitchcock e Woody Allen (que fala no programa). Poucos como ele tornaram-se caricaturas de si mesmo, criando um universo à parte. No caso de Almodóvar, um mundo que carrega todas as contradições e inspirações de uma geração que cresceu em uma Espanha tomada pela ditadura do general Francisco Franco (1939-75).
Depoimentos de atores como Antonio Banderas e Carmen Maura relembram os primeiros passos do diretor: "Todas aquelas pessoas que procuravam a liberdade encontraram um canal de expressão em Almodóvar", diz Banderas. No começo dos anos 80, estava formada a contracultura espanhola, em que o diretor estava envolvido até o pescoço.
São particularmente memoráveis as cenas de televisão do período, que mostram suas primeiras aparições, como um show ao lado de Fabio McNamara, ou trechos de suas fotonovelas.
Trabalhando em uma empresa telefônica em Madri, Almodóvar usava seu pouco tempo livre para o cinema. "Era uma vida dupla; rodava seus filmes em super-8 e exibia-os em festas e bares", diz Cecilia Roth, atriz que trabalhou em filmes como "Tudo sobre Minha Mãe" (1999).
Quando indagado sobre sua maior realização, Almodóvar diz: "Ter me tornado diretor. No meu caso, era algo tão difícil quanto tornar-se um toureiro no Japão". É o garoto punk que veio, viu e venceu no "sistema".