São Paulo, sábado, 19 de agosto de 2006

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Yoshimasu faz versão japonesa de "Galáxias"

Poeta se inspira no "espírito" de Haroldo de Campos

DA REPORTAGEM LOCAL

Em "Crisantempo", seu último livro, Haroldo de Campos (1923-2003) dedicou toda uma seção ao poeta, fotógrafo e ensaísta japonês Gozo Yoshimasu, 67. Agora, o amigo, que traduziu "Ulysses" (de James Joyce) para o japonês, tenta devolver a gentileza dedicando-se a uma adaptação, para sua língua, de uma das mais importantes obras de Campos, "Galáxias". O projeto deve ficar pronto em três anos.
"Tenho uma paixão por este projeto e estou certo de que já consegui vislumbrar o universo do Haroldo", garante Yoshimasu, que gostaria de poder lançar sua tradução do livro ao mesmo tempo que as versões para o inglês, francês e espanhol.
Yoshimasu veio a São Paulo participar do projeto "Hora H", na Casa das Rosas, que reúne estudiosos e admirados de Haroldo de Campos (com encerramento hoje à noite). Os dois se tornaram amigos entre 1992 e 1994, quando Yoshimasu passou um período dando aulas na Universidade de São Paulo.
Na época, Campos revelou a Yoshimasu seu desejo de adaptar, para o português, uma texto clássico do teatro Nô, o "Harogomo de Zeami", que a Estação Liberdade acaba de reeditar no país. "O Haroldo sempre me procurava para conversar sobre os poetas haicaístas, como Bashô. Ele tinha uma curiosidade muito grande pelos ideogramas do texto original de "Osíris, o Deus de Pedra" [Estação Liberdade, 1992]. Uma curiosidade dedicada, o que o qualificava como grande expert em cultura japonesa."
O poeta está no país desde o início do mês. Já passou por Brasília e Parati, onde participou da Flip, e apresenta amanhã, às 16h, na Primavera dos Livros (Centro Cultural São Paulo), o filme "Thousand of Islands". Espécie de "road-movie" poético, em que ele apresenta canções rurais, interpretadas por mulheres, o longa é fruto de mais de sete anos de viagens e pesquisas de Yoshimasu nas várias ilhas ao sul do Japão, como Okinawa.
"Existe lá uma grande amplitude cultural. No trajeto entre as ilhas, o que a gente nota é uma sucessão de línguas diferentes, que se superpõem. E isso transforma a poesia produzida ali", diz Yoshimasu, que identificou na região um forte impacto cultural da Coréia, China e sudeste asiático.

Espírito concreto
Viajante por excelência, Yoshimasu não passou pelo Brasil impune: escreveu o poema "Mata da Garoa", que apresenta amanhã na Primavera.
"É como um diário, ou desenho, que venho fazendo desde que cheguei ao país. Ele traz o espírito do Haroldo e por isso dedico o poema a ele. Essa experiência está gerando uma nova rota no meu trabalho", diz Yoshimasu, que compara a experiência concretista do amigo, com a poesia de seu país.
"A poesia concreta tinha visão fragmentada da realidade. E isso também é muito presente na cultura japonesa. Hoje descubro que a poesia japonesa é também concreta. E esse poema que dedico a ele é uma explosão da poesia de Haroldo."
Amanhã, Yoshimasu fará também uma performance com caligrafia japonesa, usando uma lâmina de cobre. "Ao invés de escrever as letras, vou encrustá-las. O lado gestual e cênico desta performance revela minha relação corporal com as palavras. Quero tateá-las, como fazia Haroldo."
(EDUARDO SIMÕES)


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