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Comida
O bom uísque à casa torna
Maior colecionador de uísque do mundo, o brasileiro Claive Vidiz, 72, vende acervo com 3.384 garrafas da bebida para a Diageo; coleção será levada para um castelo na Escócia, onde será exposta
JANAINA FIDALGO
DA REPORTAGEM LOCAL
Das 3.384 garrafas de uísque
colecionadas ao longo de 35
anos pelo paulistano Claive Vidiz, 72, apenas um Johnnie
Walker Blue Label Baccarat e
um Johnnie Walker Blue
Oldest assinado pelo piloto
Juan Pablo Montoya continuarão em solo brasileiro.
A maior coleção de uísques
do mundo foi comprada pela
maior empresa de bebidas premium do mundo, a Diageo, que
até janeiro do ano que vem levará o acervo para a Escócia,
provavelmente para o Dramuir
Castle. O acordo será marcado
por uma celebração regada à
uísque, na próxima segunda, no
museu construído pelo colecionador no fundo de sua casa.
Depois de tantos anos dedicados a reunir exemplares raros da chamada "água da vida"
em um acervo que faz até destilarias babarem de inveja, por
que se desfazer da coleção?
"Tenho três filhos. Embora
eles tenham me ajudado, não
têm o mesmo amor que eu, não
vão seguir esta trajetória.
Quantos anos mais tenho de vida? Quero que isso aqui continue bem, nas mãos certas", diz
Vidiz. "É o prazer de ter criado
uma obra e ela não ser dividida
e ter continuidade."
A coleção não só será preservada e mantida unida como levará seu nome: "Claive Vidiz
Scotch Whisky Collection".
"Compramos a coleção como
se compra uma obra de arte, assumindo a responsabilidade de
carregar aquele patrimônio
adiante", diz Claudia de Souza,
54, diretora de assuntos corporativos da Diageo.
Guaraná e água?
O fato de o Brasil ser hoje o
quarto maior mercado consumidor de uísque escocês do
mundo não impede que estrangeiros se surpreendam com a
notícia de que o maior colecionador de "scotch whisky" do
mundo é um brasileiro -Vidiz
está no "Guinness Book".
"Seria como chegar na Escócia e encontrar um escocês louco com uma coleção de 3.000
garrafas de pinga", brinca. "Se o
escocês médio tiver duas garrafas de uísque na casa dele, é
muito. E abertas, claro!"
A exclamação da frase acima
tem um motivo claro e é a característica mais interessante
da coleção: todas as bebidas estão intactas. "Já aconteceu de
eu estar viajando, chegarem
amigos aqui e a minha mulher
ter de mandar comprar uísque
no mercado, com medo de abrir
uma garrafa errada."
Foi esse, aliás, o motivo que o
levou a montar um pub junto
do museu onde pudesse servir,
entenda-se bem, outros uísques aos amigos. "Vinham aqui,
olhavam e depois? Alguém ia
querer abrir uma garrafa da coleção e a amizade ia acabar."
Pois o ciúme e o carinho que
Vidiz tem da coleção quase causou um estrago no casamento
quando, ao mexer em um estojo, a mulher dele deixou a tampa de um decanter cair sobre
uma botija raríssima de Glend
Fiddich. "Enquanto não repus
a garrafa, não tive sossego."
Quem ouve Vidiz falar de uísque com tanta paixão pode ter a
impressão de que ele é um bebedor nato. Engano: a primeira
gota de uísque que ele colocou
na boca foi aos 33 anos.
"Estava fazendo carreira em
uma empresa farmacêutica.
Um dia estava no Rio e dei de
cara com o presidente da companhia. Ele me convidou para
tomar uns aperitivos. Perguntou o que eu ia beber, e eu tinha
duas respostas para uma pergunta deste tipo: Guaraná da
Antarctica ou água mineral."
Bem, Vidiz foi "obrigado" a
tomar não só uma como duas
doses de uísque -quer dizer,
uma e meia; metade foi para o
tapete. "Não ia. Era um gosto de
remédio horrível."
Ao contar o ocorrido para o
chefe, Vidiz ouviu uma pergunta e um conselho que mudou o
rumo de sua vida: "Você quer
fazer carreira como executivo?
Aprenda a beber, ou desista".
"Continuou sendo amargo e
um desprazer por algum tempo. Devagar comecei a me acostumar, a gostar e a amar. Depois descontei todos os anos
em que não tomei uísque."
O início da coleção
Por outra coincidência, mais
tarde Vidiz se deparou com a
bebida de novo. À frente da filial de uma indústria farmacêutica inglesa, ele recebia constantemente funcionários da
matriz, todos bons bebedores
de uísque. Para diminuir os
custos, fez um acordo para que
os próprios visitantes comprassem no Duty Free seis garrafas,
depois reembolsadas aqui.
"O acordo funcionou espetacularmente, mas todos traziam
uísques famosos. Até que um
dia fui receber um senhor, o
Gilbert McDonald. Olhei para
mão dele, procurando a sacola
do Duty Free, e nada. Ele percebeu minha angústia e disse:
"Claive, trouxe suas garrafas. Só
que sou escocês e conheço uísque. Queria trazer estas marcas. Você vai levá-las para casa
e me prometer que só as abrirá
em ocasiões especiais e com
quem conheça uísque."
O executivo não cumpriu a
promessa -elas continuam fechadas-, mas transformou seis
em 3.384 garrafas, organizadas
em ordem alfabética. "Só senti
que era coleção quando cheguei
a 111 garrafas", diz. "Decidi que
seria só de uísque escocês. Mais
tarde quebrei a regra e permiti
que o irlandês entrasse, mas há
menos de 20. Americano tenho
no bar, aqui não."
Inevitável perguntar o valor
estimado de um acervo tão vasto... "Os poucos que quiseram
saber, nem respondi porque
não sei. Tem garrafas tão raras,
que só se fossem colocadas em
leilão saberíamos o preço."
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