São Paulo, sexta-feira, 19 de outubro de 2007

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Heloisa Seixas se expõe em relato da doença da mãe

Na não-ficção "O Lugar Escuro", escritora conta a própria história ao discorrer sobre mal de Alzheimer e lembrar reações da família

Sem pretensões científicas, livro ajuda a entender a situação, afirma autora, para quem escrever foi um "acerto de contas com final feliz"

LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO

No romance "Diário de Perséfone", de 1998, Heloisa Seixas acompanha uma escritora que diz ser necessário ancorar no papel sua dor para que esta saia de dentro dela. Seixas encarna sua personagem em "O Lugar Escuro", que chega às livrarias na próxima semana.
O livro é um relato da doença da mãe, que sofre de mal de Alzheimer associado a outras formas de senilidade. Sua queda começou há dez anos, acentuou-se há cinco, e, no início de 2007, Seixas resolveu contar essa história, que acabou se tornando um livro sobre sua própria história e de sua família.
"O mais difícil foi admitir a raiva. Mas ela aconteceu quando minha mãe estava bem ainda, tinha autonomia de vôo. Era uma mente totalmente destroçada num corpo são. Parecia às vezes que estava brincando comigo. Eu tinha raiva daquela pessoa em quem ela tinha se transformado", conta a escritora, 54, que concluiu o livro em pouco mais de um mês.
A degeneração da mãe -que está com 84 anos e cujo nome não aparece no livro, assim como o de nenhum outro personagem- foi substituindo a raiva por compaixão, diz Seixas.
"Escrevi o livro porque achei que a história estava resolvida na minha cabeça. Mas foi importante como um arremate dessa serenidade. É um acerto de contas com final feliz", afirma ela, não vendo no seu texto nenhum apelo para que sintam pena dela. "Autocomiseração é muito ruim, porque você tende a ter um apego à dor. Quando se expõe, é para se livrar dela."
E Seixas, em seu primeiro livro de não-ficção, expõe-se bastante. Fala, entre outras coisas, de como o pai trocou a mãe por outra mulher; de como a mãe nunca digeriu isso e foi alterando sua personalidade, tornando-se conservadora e temerosa; de como sempre se sentiu preterida pela mãe, que preferiria seu irmão; das situações constrangedoras ocorridas em função da doença; da constatação de que a morte seria um alívio para a mãe; dos casos de loucura da família, inclusive o seu quase-caso.
"Eu própria vivi, a vida toda, na fronteira", escreve, para, duas páginas, depois concordar com a explicação que uma analista lhe deu: "[...] eu fora salva pela palavra, a palavra escrita". "Escritor é uma mistura de esquizofrênico com exibicionista", acredita ela, que trocou o jornalismo pela literatura.

Fator genético
"O Lugar Escuro" não é um livro de divulgação científica.
Há nele poucas informações sobre o mal de Alzheimer, doença que atinge principalmente a memória e cujas causas ainda são investigadas -o fator genético pode ser um dos componentes, para assumida preocupação de Seixas. Mas a escritora vê no seu relato emotivo um apoio para quem convive com pessoas nesse estado.
"Eu gostaria de ter lido algo assim no início do processo [da doença]. Teria entendido melhor a situação", diz ela, que classifica como "tragédia" o que aconteceu à mãe.


O LUGAR ESCURO
Autor:
Heloisa Seixas
Editora: Objetiva
Quanto: R$ 25,90 (136 págs.)


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