São Paulo, segunda-feira, 19 de outubro de 2009

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Crítica/show

"Iê Iê Iê" de Antunes se intensifica no palco

MARCUS PRETO
DA REPORTAGEM LOCAL

"Ela é americana. Da América do Sul."
Inserida logo no começo de "Iê Iê Iê", show que Arnaldo Antunes apresentou quinta, sexta e sábado passados, com lotação esgotada, na Choperia do Sesc Pompeia, a letra do forró de Dorgival Dantas aprofunda as intenções formais do novo álbum do cantor.
Assim já era o gênero iê-iê-iê, o nosso rock primitivo, a música pop brasileira dos anos 1960 em que Arnaldo foi beber para esse trabalho: americano, sim, mas daqui. Transformado e enriquecido por nossas características essenciais de rapazes latino-americanos com suas guitarras elétricas.
Em "Iê Iê Iê", esse sentido de apropriação nacional do gênero gringo vem à tona com mais intensidade ainda no palco. Arnaldo e sua banda -um time dos sonhos que tem Edgard Scandurra na guitarra, Marcelo Jeneci nos teclados, Curumin na bateria, Betão Aguilar no baixo e Chico Salem nos violões- intercalam o repertório autoral do novo álbum com improváveis leituras "jovem guardistas" de outros autores e gêneros bem brasileiros.
O hit nordestino de Dorgival Dantas é exemplar. Mas há também "Pra Aquietar", pescada do LP de estreia do compositor da Estácio de Sá Luiz Melodia -que, agora percebemos, sempre foi um iê-iê-iê.
A versão nervosa que fazem para "Vou Festejar"(Jorge Aragão e Dida Noeci), um dos maiores sucessos da carreira de Beth Carvalho, acrescenta cartas ao castelo estético pensado por Antunes. Aqui, o samba se revela um punk rock dos mais vingativos, da mesma estirpe da fase "Cabeça Dinossauro" (1986), dos Titãs.

Brega
Odair José vem reforçar a ideia de que a jovem guarda, ao menos a de "Iê Iê Iê", não é apenas Roberto e Erasmo, mas também os compositores que ficaram trancafiados, nos anos 60 e 70, nas estações de rádio AM. Arnaldo atenta aos parentescos entre "Pedido de Casamento", dele próprio, e a pouco conhecida "Quando Você Decidir", de Odair. Junto, tudo faz mais sentido.
O cenário, de Marcelo Sommer e Márcia Xavier, traz mais referências a esse quadro. Dezenas de camisetas penduradas, lado a lado, estilhaçam menções ao universo pop de todos os lugares e tempos: Beatles, Cristo Redentor, Ronald McDonald, Erasmo Carlos, Bela Adormecida, "O Poderoso Chefão". Todas convivem, se chocam, se confundem e se complementam. Como era -nossos olhos de agora conseguem perceber- a música jovem dos anos 60.

Avaliação: ótimo


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