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São Paulo, quarta-feira, 19 de novembro de 2003

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Mau Mau, mais representativo DJ do país, lança seu primeiro disco de produções próprias

BALA NA AGULHA

Flávio Florido/Folha Imagem
Retrato em múltipla exposição do DJ e produtor Mau Mau



Álbum compila hard tecno, disco, house e breaks, influências dos clubes pelos quais o artista passou


THIAGO NEY
DA REDAÇÃO

Os DJs brasileiros não seriam o que são hoje se não fosse por Mauricio Fernando Bischain. Desde que iniciou, há 17 anos, já foi a atração principal em festas em todos os Estados brasileiros e por duas dezenas de países pelo mundo. Nesta semana, lança seu aguardado primeiro álbum de produções próprias, "Music Is My Life". Ainda assim, Mau Mau não conseguiu convencer os próprios pais. "Minha mãe vive me perguntando quando é que eu vou parar de tocar em festinhas, voltar a estudar e arrumar "emprego"."
Aos 35 anos, após o começo no lendário clube paulistano Madame Satã, que abrigava o que existia de mais novo no rock dos anos 80, a consolidação de seu nome nas discos undergrounds Sra. Krawitz e Hell's Club, de sua participação no projeto M4J, em que trazia à eletrônica ritmos brasileiros, e de ter sido escalado para praticamente todos os grandes eventos de eletrônica do país, Mau Mau chega ao ápice. "Music Is My Life", que sai pelo selo Segundo Mundo e distribuição nacional da Sony, sintetiza em 13 faixas tudo por que o DJ já passou: disco, hard tecno, house e breaks.
"Passei por vários clubes diferentes, acompanhei vários estilos que aconteceram. No álbum procurei captar um pouco disso, de cada época, do que me influenciou. É um apanhado disso tudo", ele conta à Folha. E tem mais.
 

Folha - Por que um disco só agora? Você não se sentia seguro?
Mau Mau -
Comecei a produzi-lo há um ano e meio. Queria criar um estilo, e não simplesmente copiar algo. Nesse tempo fui tentando encontrar um caminho. E eu sempre me envolvi com outros projetos, ficava empurrando, empurrando. Mas acho que agora está com a minha cara.

Folha - E como é essa cara?
Mau Mau -
É uma mistura de tudo... Minha música se aproxima do tech-house, mas tem muita influência do tecno de Detroit e com um pouquinho de timbre brasileiro, tudo muito discreto.

Folha - Você sempre usou a música brasileira em suas músicas e sets. Hoje essa mistura está completamente difundida...
Mau Mau -
A música eletrônica cresceu, se ramificou e se misturou a tudo o que se possa misturar. Aparecem fórmulas, as pessoas copiam, modificam. Depois do sucesso do Marky e do Patife, isso explodiu. Hoje você vê tema de novela tocando bossa nova com eletrônica... Mas acho que é um caminho natural, não tem como fugir. Tem tanto o lado bom, que gera emprego, oportunidade para muita gente, e o lado ruim, pois há o oportunismo.

Folha - A eletrônica gera muito dinheiro hoje. Você ficou rico?
Mau Mau -
Consegui ganhar alguma coisa, mas não estou rico, milionário. Eu poderia ter ganho muito dinheiro me vendendo.

Folha - Quando?
Mau Mau -
Por exemplo, já tenho vários remixes de artistas conhecidos, Marina Lima, Rita Lee, Adriana Calcanhoto. Eu poderia muito bem ter feito "babas" para tocar no rádio e vender um monte de discos, mas não, quis fazer um trabalho em que acreditasse.

Folha - Já aconteceu de ir a um lugar e tocar sem motivação, apenas para receber seu cachê?
Mau Mau -
Atualmente minha agenda é supercheia, toco de quatro a cinco vezes por semana, é cansativo. Aconteceu de ir a um lugar que não estivesse tão bom e que, sim, foi chato de tocar.

Folha - Com quem você gostaria de trabalhar?
Mau Mau -
Com Cesar Camargo Mariano, acho um músico bem bacana, gosto da Maria Rita...

Folha - Você é fã de MPB?
Mau Mau -
Não sou fã, mas cresci ouvindo música brasileira.

Folha - Você toca bastante no exterior, tem uma residência num clube de Paris. Mas DJs como Marky, Patife, Anderson Noise, Renato Cohen aparentam ser mais conhecidos. Isso te incomoda?
Mau Mau -
São coisas diferentes. A música do Marky entrou na parada britânica, eu fiquei supercontente. Já os DJs de tecno, eles tiveram o boom por causa de "Pontapé", a música do Renato, que é um artista muito bom. No meu caso, tem muita coisa que eu fiz, já toquei muito no exterior, mas não me importava em divulgar. Já as pessoas que trabalham com eles fizeram um marketing, como se essas coisas fossem as mais importantes do mundo. Da mesma forma que eles tocaram em vários lugares, eu também toquei, mas nunca tive a preocupação de que todo o mundo ficasse sabendo. Mas fico contente por eles terem conseguido esse espaço, como eu consegui o meu.

Folha - O que você fazia quando começou como DJ?
Mau Mau -
Eu trabalhava como caixa do Bradesco, foi meu primeiro emprego. E fazia parte de um grupo de dança de rua. Cursei um ano de publicidade na PUC.

Folha - O Hell's é citado como um marco na eletrônica brasileira. Por que esse clube foi tão importante?
Mau Mau -
Por vários motivos. Foi o primeiro after hours do Brasil; reuniu um grupo de pessoas que ia desde gente da moda a jornalistas, um pessoal ligado a arte, formadores de opinião. Mas o principal foi o conceito: foi o primeiro clube que teve um direcionamento musical, o tecno. Eu tocava o que queria, e as pessoas iam para ouvir o que eu tinha para mostrar e adoravam. Foi o primeiro clube em que todas as pessoas dançavam viradas para o DJ.

Folha - Como você escolhe o que entra em seus sets?
Mau Mau -
Não me preocupo em tocar um hit que é sucesso. Ao contrário: se tem uma música que todo mundo está tocando, eu não toco, porque não precisa, prefiro mostrar coisas novas. Não precisa ser apelativo, apelar para hits. E se eu tiver que ficar tocando os mesmos discos, acharia um saco. Muitos DJs mantêm o mesmo repertório por semanas. Não conseguiria fazer isso, me repetir para agradar o público.

Folha - Você acha que o DJ tem uma importância social?
Mau Mau -
Muito. Por exemplo, os cybermanos. Eles têm uma filosofia, um estilo de se vestir, códigos, tudo ligado à música que eles escutam e com seus DJs.

Folha - Mesmo sendo um DJ reconhecido no exterior, lançando disco, até seus pais não entendem sua profissão. O que acontece?
Mau Mau -
É que na época dos meus pais isso não existia. É difícil para eles. Mas agora eles estão vendo que estou feliz, que não vou parar de uma hora para outra.

Folha - Você já teve dificuldade por causa disso?
Mau Mau -
Sim, não tive apoio nenhum dos meus pais, e, quando comecei, as pessoas não entendiam, falavam para tocar o que estava nas rádios. Foi uma batalha, uma persistência... Várias vezes pensei em desistir.


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