|
Texto Anterior | Índice
"Mercado" é culpado por escassez de modelos negros no mundo da moda
PAULO SAMPAIO
DA REPORTAGEM LOCAL
Ninguém na SPFW é racista.
A média de modelos negros por
desfile é dois, para cerca de 40,
mas a culpa é do mercado.
"Mercado", aqui, é sujeito indeterminado.
Os agentes de modelo dizem
que "o mercado não pede" negro. "Cabelo liso é sempre mais
requisitado", afirma o coordenador de "new faces" da Elite
Models, Marcos Cunha.
Ele diz que apresenta sem
distinção as modelos para os
estilistas, mas, de cada cinco
oferecidas, em geral apenas
uma escolhida é negra.
Cunha cita o exemplo de Rojane, vencedora do último concurso nacional da agência. "Ela
é negra, concorreu com 34 mil
inscritas e ganhou, mas, se eu te
disser que ela é tão requisitada
quanto as vencedoras brancas
de outros anos, vou estar mentindo. A proporção é 70% a
30%", conta Cunha.
Os estilistas dizem o contrário: o problema é a carência de
oferta nas agências. "Eles oferecem poucos negros. Eu sou o
primeiro a fazer homenagens:
no meu desfile coloquei a rosa
negra, que é a mais rara de todas", diz Tufi Duek, em cujo
desfile havia uma negra.
Waldemar Iódice afirma que,
graças a ele e a sua idéia de colocar Rojane (a vencedora do
concurso da Elite), vestida apenas com colares, ela foi capa de
todos os jornais. "Sempre coloquei os negros em destaque no
meu desfile, mas as agências
nos dão bem menos opções",
diz Iódice, que nesta temporada chamou dois negros.
Boa parte dos estilistas da semana de moda prefere não dar
entrevista sobre o assunto.
Para Laura Vieira, da agência
de modelos Ten, "o número de
negros que aparecem querendo
ser modelo é bem menor".
"Eles não procuram tanto a
carreira", diz Vieira.
O diretor de planejamento da
agência de publicidade F/Naszca, Fernan Alphen, afirma que
"no fundo, é preconceito puro e
simples". "Usa-se a palavra
"mercado" para justificar essa
força oculta. Na verdade, o preconceito não é racial, é social:
isola por medo do outro. O negro é supostamente mais pobre
e, por isso, não tem acesso à informação, não tem gosto. E, como a moda tem essa pretensão
de divulgar tendência, ela quer
fazê-lo entre a elite branca",
acusa Alphen.
Marco Aurélio Casal de Rey,
da Ford, agência de modelos,
explica que, nos desfiles de inverno, a situação fica ainda
pior. "Em geral os negros estão
associados a verão."
Ele conta que, mesmo as morenas, o "tipo brasileiro", muitas vezes precisam estourar fora do Brasil para então fazer sucesso aqui.
"Sou sincero: a gente oferece
negras, mas maioria dos estilistas prefere a beleza nórdica, européia", diz, sem citar nomes.
Ele explica que apenas 10% de
seu "casting" é composto por
negros. O mesmo acontece com
os orientais.
Entre as tops negras da Ford
estão Samira Carvalho, Carmelita Mendes e Patrícia de Jesus.
O empresário Helder Dias,
dono da HDA, agência especializada em modelos negros, reivindica para si a "descoberta"
de Samira. "O pessoal da Ford a
viu em um desfile da Pacco Rabane, no hotel Unique, e levou",
queixa-se Dias, ele próprio negro.
Para ele, além do racismo
com os negros, existe uma panelinha de agências, e algumas
modelos só se tornam tops
quando vão para as grandes.
Mas aí já é outra briga...
Texto Anterior: "Jet setter" é estrela da 2nd Floor Índice
|