São Paulo, quinta-feira, 20 de janeiro de 2011 |
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A cena de Berlim Um dos principais diretores atuais, Thomas Ostermeier , diretor artístico do teatro Schaubühne , defende novas linguagens cênicas e dramaturgia burguesa como crítica à ideologia europeia atual
CHRISTIANE RIERA CRÍTICA DA FOLHA, EM BERLIM Um dos maiores teatros de Berlim, o Schaubühne am Lehniner Platz fez história por seu forte viés político sob o comando do celebrado Peter Stein nas décadas de 1970 e 1980. Sua fama em produzir montagens marcantes ganhou mais vigor sob a liderança do atual diretor artístico, Thomas Ostermeier, 42, cuja trajetória reproduz o ritmo veloz e barulhento de suas montagens. Logo que terminou a escola de teatro, assumiu a direção artística do Baracke (Deutschen Theater) em 1996, transformando-o em uma das salas mais experimentais de Berlim, o que resultou no prêmio Teatro do Ano, em 1998, concedido pelos críticos da prestigiosa revista "Theater Heute". À frente do Schaubühne há mais de uma década, dirigiu montagens explosivas de clássicos como Henrik Ibsen (1828-1906) e Shakespeare (1564-1616) em circuitos como Nova York, Paris, Israel, Moscou e Tóquio. Assim, tornou-se rapidamente o diretor alemão mais conhecido dos últimos anos no cenário internacional. Responsável por estreias mundiais de autores como Jon Fosse, David Harrower, Lars Norén e Karst Woudstra, ele transformou seu teatro no maior centro de divulgação de dramaturgos contemporâneos da cena local. Na última sexta-feira, Ostermeier recebeu a Folha para uma entrevista em que discorreu sobre sua abordagem no teatro e os modos de produção em seu país. Folha - O teatro alemão contemporâneo é considerado vanguardista e pós-dramático. Sua preocupação com a narrativa vai contra essa tendência? Thomas Ostermeier - Quando Hans-Ties Lehmann definiu o pós-dramático nos anos 1990, considerou o teatro dos 1980. Naquela época, fazia sentido destruir tudo. Não conseguimos mais desconstruir o que já foi desconstruído, pois não temos mais pontos de referência. Nossa tarefa hoje é reconstruir narrativas com novas linguagens cênicas sem sermos conservadores. Como não ser conservador no Schaubühne, um teatro que, apesar de seu passado político, situa-se hoje em Charlottenburg, um dos bairros mais elitizados da cidade? Somos hoje dominados pelo cinismo apesar de sabermos que o mundo anda errado. Passamos a focar a vida privada, ter uma família e criar filhos. Enquanto geração, não temos um projeto social. Eu me manifesto politicamente enfatizando para a nossa geração que ela pensa desta maneira. E como se dá essa sua crítica à geração em termos artísticos? Recorro a uma dramaturgia altamente burguesa para refletir nossa situação hoje. Em minhas montagens de Ibsen, quis ligar nosso presente histórico ao século 19 para mostrar ao público onde estivemos e para onde voltamos, mesmo atravessando utopias radicais. A ideologia que prevalece em toda a Europa é deprimente: Estado, religião e família. É chocante ver como estamos reproduzindo valores de séculos atrás. Qual o seu método para extrair frescor de narrativas clássicas? Ainda podemos escavar um texto e chegar a resultados surpreendentes. Há coisas a serem descobertas no drama clássico que podem lançar novas abordagens ao que apenas achamos que sabemos. O foco do Schaubühne em dramaturgia internacional tem ênfase em autores britânicos. Alguma razão? Foram sempre essenciais para a Alemanha. Shakespeare influenciou Goethe [1749-1832], Schiller [1759-1805] e Buchner [1813-1837]. Nos anos 1950, foi a vez de John Osborne [1929-1994]. Depois, vieram Edward Bond e uma onda recente de dramaturgos inovadores como Mark Ravenhill e Martin Crimp. Trabalhamos também com Marius von Mayenburg e Roland Schimmelpfennig, os dois autores alemães mais produzidos aqui. Como conseguem manter um repertório tão dinâmico, considerando o tamanho de suas produções? A qualidade do nosso teatro tem muito a ver com o dinheiro de produção. Somos muito bem subsidiados se comparados a qualquer outro país do mundo. O Schaubühne, como todos os teatros do país, é financiado pela prefeitura, que destina a teatros e óperas 1,2% de seu orçamento anual. Para eles, nada. Para nós, € 12 milhões [cerca de R$ 27 milhões] por ano. Há razão para não existirem incentivos federais? Não temos um Ministério da Cultura desde o final da Segunda Guerra, quando americanos e ingleses tentaram construir aqui um Estado democrático. Queriam evitar a formação de uma identidade nacional que pudesse avançar uma ideia de nação e resultar em fascismo. Texto Anterior: Mônica Bergamo Próximo Texto: Raio-X: Thomas Ostermeier Índice | Comunicar Erros |
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