São Paulo, quinta, 20 de março de 1997.

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`Ventania' é banho de sangue, diz Villela

PATRICIA DECIA
da Reportagem Local

``Um banho de sangue.'' Assim o diretor mineiro Gabriel Villela definiu a peça ``Ventania'', um musical escrito por Alcides Nogueira que tem sexo, drogas e rock'n'roll como seu trinômio de sustentação e que chega hoje a São Paulo.
Além das alegorias e metáforas barrocas de Villela e do texto ``cortante e rasgado'', como definiu Nogueira, a peça tem um terceiro elemento fundamental: a homenagem ao dramaturgo José Vicente de Paula, 51, um dos mais importantes dos anos 70, autor de ``O Assalto'' e ``Hoje é Dia de Rock''.
``Sempre tive uma paixão pelo Zé Vicente. Acho um absurdo ele ter sido colocado à margem. Minha dramaturgia é pontuada por referências, e a referência brasileira mais próxima é o Zé Vicente'', diz Nogueira.
Segundo ele, ``Ventania'' não é biográfica. ``A peça pega o universo de Zé Vicente, que propicia uma releitura bem legal. O que interessa para mim é estabelecer um canal e dizer o que os sonhos dos anos 70 significam nos anos 90'', afirma o autor.
A história de uma família -a mãe-morta, que renasce para contar sua trajetória e de seus três filhos-, norteada pela divindade que traz a ventania, é o fio condutor do espetáculo.
A mãe (Malu Valle) representa os valores dos anos 70, o filho Zé (Davi Taiu) é chamado ``filho do sol'', Vicente (Eriberto Leão) é o ``filho da noite'' e Sílvia Buarque interpreta Luiza, uma garota cega que é ``a filha do crepúsculo''.
``A peça é cindida entre os aspectos lunar e solar, coisas telúricas e forças demoníacas. Dessa grande cisão surge o desafio de como juntar noite e dia, numa coisa muito bonita que talvez seja até o crepúsculo'', diz Alcides Nogueira.
``Queria que acontecesse com `Ventania' o que aconteceu com `Um Dia de Rock'. É quase uma celebração. A peça fala da dor, mas, mais que isso, da necessidade, da possibilidade e da vontade de recuperação do prazer'', diz o autor.
Barroco
Para Alcides Nogueira, ``Ventania'' é o espetáculo menos barroco de Gabriel Villela.
``Gabriel é um parâmetro de qualidade estética. O teatro dele provoca a reação de ame-o ou deixe-o. Eu gosto disso, gosto de coisas radicais. Meu texto é o anti-Gabriel Villela e, quando conseguimos juntar as duas coisas, foi muito bonito. Acho que `Ventania' até muda a estética do Gabriel. É sua peça menos barroca.''
Para o diretor, o encontro de suas características com o texto de Nogueira exigiu uma adaptação.
``A metáfora e a alegoria são as molas mestras com as quais eu consigo trabalhar. Como sei que os autores dos anos 70 recorreram a essas figuras por causa da censura, achei conveniente adotar o princípio como concepção do espetáculo. Alcides não usa isso com frequência, mas ele tem um conhecimento de causa muito grande. A gente foi se adaptando'', afirma Gabriel Villela.
Reação alérgica
No Rio de Janeiro, onde estreou, a peça de Nogueira e Villela provocou, algumas vezes, ``reações alérgicas'' nos espectadores, segundo autor e diretor.
``É uma peça sanguinolenta. É sangrar o bode. Talvez, mais do que rituais do catolicismo, esse seja um procedimento do candomblé'', diz Villela.
Alguns dos elementos que podem ter provocado tal reação, segundo eles, são as cenas de sexo, logo no início da peça, e o uso de sangue.
``O sexo acontece no proscênio, com a luz muito forte. Um casal, no Rio, saiu na hora, considerando a cena um sacrilégio'', afirma o diretor.

Peça: ``Ventania'' Direção: Gabriel Villela Autor: Alcides Nogueira Com: Sílvia Buarque, Eriberto Leão, Davi Taiu, Malu Valle Quando: de hoje a 20 de abril, sextas e sábados, às 22h, e domingos, às 19h Onde: Tom Brasil (r. das Olimpíadas, 66, Vila Olímpia, tel. 011/820-2326) Quanto: de R$ 15 a R$ 40
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