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FERNANDO BONASSI
Alice no país das mil milícias
São 500 e poucos
anos de cartas
marcadas nas mãos
dos mesmos monarcas
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O PAÍS das mil milícias é uma
espécie de jardim de sevícias
onde a segurança pública foi
vendida para as mais malucas iniciativas de privada. Quanto às delícias
da insegurança que reina descontrolada, essa parece ser a melhor parte
administrada pelos governos eleitos
contra a população sitiada.
Porque os bandidos podem usar
fardamento e os fardados podem se
tornar bandidos num momento é
que no país das mil milícias, por
exemplo, não se sabe quem é polícia.
De malícia, muitos se fantasiam
de autoridade para entrar nas concorrências das ocorrências; uns porque arreganham imunidades parlamentares em tempos de paz; outros
porque defendem a sua sobrevivência como se estivessem em plena
guerra... São, na verdade, senhores e
soldados do mesmo tráfico de escravos, fazendo parcerias de danados
dentro da mais estreita ilegalidade!
E por falar em quem disputa legislaturas, escrevem livros sem gravuras, com letras miúdas e conjecturas
indecifráveis, já que os notáveis preferem ficar burros e famosos... Medíocres ou charmosos, o fato é que
não sabem para que lado atirar, nem
com qual deles se proteger...
Pois é num imundo confuso desse
tipo que vareja Alice, a adorável, à
procura do que comer em meio ao lixo reciclável... É vegetariana a doce
criança, mas nas hortas que se planta nesses sítios só encontra os frutos
daninhos dos presuntos de meninos
enterrados a sete palmos de terra
grilada.
Os chapeleiros dessa palhaçada
até blindaram os coletes e usam capacetes contra os gases lacrimogêneos que os fazem morrer de dar risada!
O país de Alice é tão mágico, mas
tão mágico, que certos magos encostados coçam os bagos e conquistam
13 mil por mês com o endosso cortês
de velhos comunistas!
Os comunistas são velhos, mas
preferem comer as suas criancinhas,
moreninhas e maiores de 18 anos,
em certas casinhas esquisitas...
É uma loucura arrepiada e o país
de Alice seria uma piada, não fosse
uma tragédia anunciada desse tanto! São 500 e poucos anos de cartas
marcadas nas mãos dos mesmos
monarcas ou de seus valetes, mas
como poucos súditos e vedetes sabem ler para decifrar até mesmo os
seus direitos de propriedade, jogam-se às cegas contra a própria prosperidade, sendo os primeiros colocados na escola dos malvados.
É preciso reconhecer que está tudo de cabeça para baixo, de forma
que os coitados é que são os ferrados
e os errados estão desencontrados
nos lugares exatos, batendo de cabeça em contradições e mesquinhez
paralisantes. Assim, enquanto esses
que têm rendas ficam brincando de
Banco Imobiliário, os sem-teto,
sem-terra ou sem-salário os espreitam de soslaio, como se a realidade
fosse um show meio sujo, cuja intimidade fedorenta excitasse a maioria miserável feito um chá estimulante.
No país das mil milícias, aliás, há
muitos chás! Em pedra para os pobres e em pó para os ricos, pois todos
querem sonhar... Sonham que querem casar e ter filhos, mas têm medo
dos martírios que podem vir a sofrer. Deviam é saber que, no fim, tudo não passa de um pesadelo...
Quem sabe não é por isso que ficam parados, ou cansados, de si
mesmos?!
Todos querem proteção, nem que
seja pela mão da crueldade, e Alice
paga pedágio para ir e vir, acordar ou
dormir... Mas o que Alice não entende em suas viagens lisérgicas é por
que razão os doidos violentos é que
mandam, ou legislam, pelos sãos?!
E quem são esses que preferem o
achaque dos mendigos e bandidos a
parar para fazer, distribuir ou devolver o que pensam que podem ter
sem perecer num seqüestro relâmpago?
No país das mil milícias, morre-se
num instante!
Por essas lições entediantes e
imorais de cinismo, Alice também
acabou se cansando de estudar, ficando todo dia a suspirar, meio tonta, meio trouxa e meio vadia a esperar que os adultos lhe dêem o que
não tem paciência ou maturidade
pra ir buscar...
O verbo é arriscar, mas Alice tem
preguiça de conjugar, ou pensar...
No país das mil milícias, nem convém pensar muito! Ali se cortam cabeças num minuto, já que a justiça
anda atrasada ou se faz de cabide para coelhos estressados, aposentados
com honorários de traficantes coroados; são aqueles diletantes aferrados às letras das leis pelas quais serão enforcados...
A propósito disto, Alice nem precisará ser julgada. Será apenas abatida com uma bala perdida diante das
delegacias das cidades fechadas por
falta de eletricidade.
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