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TEATRO
Revelado em Curitiba, grupo XIX monta "Hysteria" em "espaço da exclusão" do edifício da FAU-USP, em São Paulo
Peça traz diálogo entre séculos 19 e 20
VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
Clara, Hercília, Maria Tourinho,
M.J. e Nini são internas de um
hospício carioca no século 19.
Mães, meninas, amantes, solteiras, sentimentais, brasileiras de
"existência estreita e confinada",
elas falam de si para mulheres do
século 20, "reconhecíveis". E são
literalmente assistidas pelos homens do século 20, "ignorados".
A partir de hoje, "Hysteria" os
reúne sob o teto de uma cozinha,
"espaço da exclusão" num centenário e outrora palacete do bairro
de Higienópolis, em São Paulo,
pertencente à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP.
A luz natural que entra pelas janelas como que ampara o mergulho que se fará no inconsciente
coletivo feminino marcado pelas
dores de uma opressão histórica
dentro de casa, na cama, no trabalho, na rua ou no hospício.
É o início da temporada do espetáculo do grupo XIX, revelação
da última edição do Fringe, a
mostra paralela do Festival de
Teatro de Curitiba.
Concebida por cinco atrizes e
pelo diretor Luiz Fernando Marques, a peça teve seis concorridas
apresentações na estréia nacional.
O público ideal é de 40 espectadores (20 mulheres dispostas em
sete bancos, contracenando com
as atrizes, e 20 homens sentados
em arquibancada à parte).
Entraram 150 pessoas na última
sessão em Curitiba, força da propaganda boca-a-boca. Em São
Paulo, a determinação é não passar das quatro dezenas, para que
se instaure ainda mais a intimidade entre as mulheres.
A atriz Ana Lucia Torre, 57, que
passou pelo festival com "Norma", viu uma das sessões ao
meio-dia num casarão do Largo
da Ordem, no centro histórico.
"Fiquei absolutamente encantada pela delicadeza de um jovem
diretor que, ao contrário da maioria que sai da escola com ambição
de fazer algo brilhante, enorme,
trata tudo com simplicidade. As
atrizes também demonstram
união, contam a mesma história
com cumplicidade", afirma.
O ator Eduardo Moscovis, 33,
que contracena com a atriz em
"Norma", estava ressabiado antes
de ver "Hysteria". Não gosta de
interação com o público, invariavelmente "chata", mas se convenceu a ir quando soube que o espetáculo interage "apenas" com as
mulheres. "Eu me emocionei, fiquei com inveja, com vontade de
pegar nas mãos e me juntar às
mulheres em cena", diz.
O diretor Marques, 24, teve aulas com Antônio Araújo (Teatro
da Vertigem) no Centro de Artes
Cênicas da Escola de Comunicação e Artes (ECA-USP).
"Hysteria" tem sua origem num
dos núcleos de pesquisa ao qual
Marques pertencia no curso.
"Lembro que quando o seu grupo
propôs o século 19 como tema
ninguém deu muita bola, era
muito vago. Depois, ele restringiu
o tema à escravidão, até chegar à
situação da mulher no século 19, o
confinamento, a loucura", afirma
Araújo, 36.
No curso, o encenador de "Apocalipse 1,11" deu tratamento pedagógico ao processo criativo que
pontua a discussão do sagrado em
dez anos do Teatro da Vertigem.
O texto, a montagem, a interpretação, o figurino, a relação
com o espaço não-convencional,
tudo em "Hysteria" decorre da
pesquisa do quinteto Gisela Millás
(Nini), Janaína Leite (Clara), Juliana Sanches (M.J.), Raissa Gregori (Hercília) e Sara Antunes
(Maria Tourinho), sempre em colaboração com Marques.
HYSTERIA. Direção: Luiz Fernando
Marques. Com: grupo XIX. Onde:
Palacete Vila Penteado da FAU-USP (r.
Maranhão, 88, SP, Higienópolis).
Quando: sáb. e dom., às 16h. 40 lugares
(20 homens, 20 mulheres). Quanto: R$ 20
(a bilheteria abre às 15h30). Inf.: 0/xx/
11/5677-0369. Até 14/7.
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