São Paulo, sexta-feira, 20 de abril de 2007

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Museu da Língua expõe originais e cartas de Clarice

Mostra, que abre na terça-feira, marca os 30 anos da morte da autora de "A Hora das Estrela", lançado há três décadas

Exposição revela a correspondência da escritora com Fernando Sabino e Carlos Drummond de Andrade, entre outros


Erico Verissimo/Acervo de Paulo Gurgel Valente
Foto de Clarice, feita por Erico Verissimo, em 1956, em Washington


EDUARDO SIMÕES
DA REPORTAGEM LOCAL

Em uma de suas crônicas compiladas no livro "A Descoberta do Mundo", a jornalista e escritora Clarice Lispector afirmava: "Amo a língua portuguesa [...]. Eu até queria não ter aprendido outras línguas: só para que a minha abordagem do português fosse virgem e límpida". Passadas quase três décadas de sua morte, o amor de Clarice pelo idioma não poderia ter melhor abrigo do que o Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, que abre na próxima terça-feira uma exposição em sua homenagem.
A mostra, que também marca os 30 anos de lançamento de seu livro mais popular, "A Hora da Estrela", vai ocupar o primeiro andar do museu, onde ficam as exposições temporárias, como a dedicada a "Grande Sertão: Veredas", de Guimarães Rosa, que ficou em cartaz durante nove meses, até o dia 28 de fevereiro.
Manuscritos e originais datilografados inéditos, assim como a também inédita correspondência com escritores como Rubem Braga, João Cabral de Mello Neto, Fernando Sabino, Carlos Drummond de Andrade, Erico Veríssimo e Lúcio Cardoso, ajudam a compor o retrato da autora proposto pelos curadores Ferreira Gullar, poeta, crítico e colunista da Folha, e Júlia Peregrino, além dos cenógrafos Daniela Thomas e Felipe Tassara.
A pesquisa e montagem da exposição duraram cerca de três meses e meio. Já na entrada, o público será apresentado a Clarice através de telas de filó, de 6 m x 4,2 m, com imagens da autora em quatro diferentes épocas de sua vida. Por meio das telas, as pessoas poderão ler trechos selecionados de sua obra que se referem à "filosofia clariceana", suas perspectivas sobre vida e morte, natureza, tempo, a língua portuguesa, a escrita etc.
"Foi uma grande responsabilidade fazer uma síntese da obra de Clarice para o público. Seu universo é complexo e ao mesmo tempo generoso, o que tornou um tanto difícil fazer a seleção de frases e trechos", explica Peregrino. "A idéia, de qualquer jeito, não era esgotar o espectador, e sim deixá-lo instigado a, depois que sair da exposição, conhecer mais a fundo a vida e obra de Clarice."

Trajetória
Clarice Lispector nasceu no dia 10 de dezembro de 1920, em Tchetchelnik, na Ucrânia, e chegou ao Brasil aos dois meses de idade, naturalizando-se brasileira em 1943. Foi criada em Maceió e Recife, e aos 12 foi para o Rio de Janeiro, onde se formou em direito, trabalhou como jornalista e iniciou sua carreira literária. Lançou seu primeiro livro, "Perto do Coração Selvagem", com apenas 23 anos. Escreveu 26 livros e foi traduzida em 15 línguas.
Casada com o diplomata Maury Gurgel Valente, Clarice viveu muitos anos no exterior e teve dois filhos. Foi do acervo de um deles, Paulo Gurgel Valente, que Peregrino extraiu boa parte do material inédito da mostra. Como uma caderneta com anotações para o seu segundo romance, "O Lustre", as carteiras de identidade da autora e cartas curiosas, como a que ela escreveu para o presidente Getúlio Vargas pedindo a aceleração no seu processo de naturalização.
Mesmo pedido feito por André Carrazzoni, diretor do jornal "A Noite", onde ela trabalhava, em carta endereçada a Oswaldo Aranha, ministro das Relações Exteriores. No texto, Carrazzoni defendia que Clarice, além de jornalista brilhante, era "filha do nosso clima sentimental e moral".
Outra curiosidade são os originais de "Água-Viva" (1973), também inéditos, segundo Peregrino, e que trazem uma lista de recomendações para a própria autora, desde as mais objetivas, como "copiar páginas soltas" e "ler cortando o que não presta", à mais poética "abolir a crítica que seca tudo".
Boa parte do material exposto no Museu da Língua será reunida no catálogo da mostra, que será vendido a R$ 20. O volume trará ainda textos de Ferreira Gullar, Benedito Nunes e Nélida Piñon, uma cronologia e reprodução de documentos, originais e cartas. Da Estação da Luz, onde fica em cartaz até o dia 2 de setembro, a exposição parte para o Centro Cultural dos Correios, no Rio, onde Clarice morreu, em dezembro de 1977, apenas um dia antes do seu aniversário.


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