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"A BELA E A FERA"
Montagem brasileira é honesta às duas dimensões do original
SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA
Não vá assistir à "A Bela e a
Fera" esperando um "Les
Misérables". Afinal, há muitas
Broadways, e esta da Disney é a
mais comercial. Vem sendo questionada por uma ala mais "autêntica" da Broadway, como mostra
o filme "O Poder Vai Dançar"; e
até mesmo pela indústria de desenho animado, na qual antes era
soberana, em "Shrek". Mas chega
ao Brasil como quem traz a civilização ao Terceiro Mundo, amparada por um marketing e uma
produção sem precedentes.
Isso quer dizer que a montagem
é um blefe? Não. Não chega sequer a ser ruim, já que não assume riscos. Os efeitos todos prometidos estão lá: motores erguem
em segundos monumentais paisagens saídas de quadros de loja
de móveis, marcas e personagens
seguem rigorosamente o desenho
animado, mantendo inclusive as
duas dimensões da versão edulcorada da Disney. Não se cogita
aprofundar os temas do conto
original, que quebra o maniqueísmo. A fera se torna humana graças às histórias que a Bela lhe leu,
o bem vence o mal. Algo se aproveita da moral: leiam mais, crianças, vejam menos desenho.
A propagada transformação final de monstro em príncipe, efeito que por um hábil marketing
ninguém está autorizado a revelar, é superdimensionada e decepciona quem vai lá só para vê-la. Por uma ínfima fração do investimento, e com maior eficácia
e lirismo, muitas moças se transformaram em Monga nos parques de diversão do interior.
A montagem, pode-se alegar,
pelo menos emprega atores e músicos nacionais. É injusto negar o
talento e a competência a quem
foi selecionado com tanto rigor.
Todos cantam e dançam com
uma desenvoltura que há até pouco tempo se duvidava em um
elenco brasileiro. Mas é impossível avaliar uma performance tão
pré-moldada, por mais que a produção alegue incorporar sugestões nacionais, como uma multinacional de fast food se gabando
por incorporar matéria-prima local em receitas consagradas. E é
em nome disso que se cogita uma
reforma urbana em São Paulo?
"A Bela e a Fera" não é tão espetacular quanto o Holiday on Ice,
mas pelo menos dura mais do que
as peças dos parques da Turma da
Mônica. Em suma, se não é adequado gastar um noite adulta de
sábado com esse espetáculo, vale
a pena levar seu filho para assistir
a uma matinê. Ele vai achar quase
tão legal quanto o desenho, e talvez depois possa pedir para que
você leia uma história antes de ele
dormir. Quem sabe assim ele sonhe com um país distante no qual
pessoas não se transformem em
objetos, em que todos votem sem
constrangimentos externos e invistam em sua própria cultura.
A Bela e a Fera
Onde: teatro Abril (av. Brig. Luís
Antônio, 411, tel. 0/xx/11/6846-6000)
Quando: estréia hoje, às 21h; de qua. a
sex., às 21h, sáb., às 17h e às 22h, dom.,
às 15h e às 20h (160 min.)
Quanto: de R$ 50 a R$ 150
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