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POLICIAL
"Negro e Amargo' brinca de gato e rato
EDSON FRANCO
Editor de Veículos
Em "Negro e Amargo Blues"
-mais um lançamento da editora Record dedicado à literatura policial-, o autor norte-americano James Lee Burke brinca de gato e rato com o leitor.
São 333 páginas em que a trama, o comportamento dos protagonistas e os cenários se deslocam e levam o leitor de roldão.
Detalhista, o autor empresta
do cinema e da literatura
"noir" uma ênfase insistente
no cenário. A estratégia dá certo
quando se tem uma San Francisco como pano de fundo.
No caso da obra de Burke, a
trama se passa nos pântanos da
Louisiana e nos picos gelados de
Montana. Nenhuma das duas
locações chega a despertar o entusiasmo que estimulou o autor
a empenhar quase 40% da obra
na descrição de árvores, montanhas e lagos.
O deslocamento entre esses
dois cenários parcos é o que há
de menos interessante em "Negro e Amargo Blues".
Já o deslocamento e mudança
de caráter dos personagens faz
valer a pena o esforço para
transpor o furor descritivo espalhado pela obra. É nesse ponto que a história começa, e a trama ganha corpo.
Fantasmas
Resumidamente, o livro conta
a história de Dave Robicheaux,
ex-policial que vive numa estação de pesca com uma menina
salvadorenha que ele resgatara
de um acidente.
Robicheaux viu sua mulher
ser assassinada e acompanhou a
morte do pai. Os fantasmas aparecem para atormentar, aconselhar e redimir o ex-policial.
São os autores involuntários
das melhores reviravoltas e, por
meio das reminiscências de Robicheaux, acabam imprimindo
um tom proustiano à trama.
Essa relação do ex-policial
com o passado ganha tanta importância que a história policial
de fato acaba ficando em segundo plano.
Tanto é que os possíveis criminosos são revelados logo no
início. Mas o autor reverte as
coisas -seu maior mérito na
obra- e se diverte levando o
leitor para um jogo cuja meta é
tentar descobrir qual crime teria
sido cometido.
Para complicar, Burke envolve o ex-policial no crime por
descobrir.
Pronto, quem chegou a esse
ponto da história cai irremediavelmente na ratoeira armada
pelo autor e só larga o livro na
333ª página.
A partir daí, começa um festival de virtuosismo narrativo
que reveste de universalidade o
mais trivial dos fatos.
Percebe-se então que "Negro
e Amargo Blues" é um romance
policial diferente.
No lugar do mistério, entra a
angústia. Em vez do medo, a incerteza elevada à enésima potência.
As armas existem por todos os
cantos, mas seus estampidos
são escamoteados pelos disparos verbais. Na maioria das vezes, o leitor é poupado das cenas
mais violentas.
E é preciso ter muita fé no taco
narrativo para acobertar as passagens com altas doses de adrenalina em detrimento de mais
uma descrição de panoramas
bucólicos.
Mas nessa toada a obra vai até
o fim, momento em que o leitor
percebe que tem nas mãos um
livro que é um grande representante da literatura policial. E o é
muito mais pelo que sugere do
que pelo que mostra.
Livro: Negro e Amargo Blues
Autor: James Lee Burke
Lançamento: Record
Quanto: R$ 26 (333 págs.)
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