São Paulo, quinta-feira, 20 de julho de 2006

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Amigos e fãs se despedem de Raul Cortez

Ator, que morreu de câncer na terça, foi velado no Municipal; cinzas serão jogadas em sítio da família no interior de SP

Cerca de 10 mil admiradores, incluindo amigos como Paulo Autran e José Serra, foram prestar homenagem ao ator


DA REPORTAGEM LOCAL

Às 7h30 de ontem, o ator Paulo Cesar Pereio observava o caixão disposto no saguão do Teatro Municipal de São Paulo e se debatia com "um paradoxo": "Tenho vontade de dizer o que o [presidente dos EUA George W.] Bush disse para [o premiê britânico Tony] Blair".
A palavra é "merda". Ocorre que "no teatro essa é uma expressão de boa sorte", e Pereio ficou em dúvida se era adequada para a despedida do ator Raul Cortez, o "amigo de 40 anos", que morreu na noite de terça, de câncer.
"Há certas doenças contra as quais não adianta querer lutar. Mas ele resistiu ao máximo", observou o ator Paulo Autran, que chegou ao velório às 12h15, minutos depois de Pereio e das centenas de presentes terem encontrado o gesto exato para simbolizar seu adeus a Cortez -uma longa salva de palmas.
Os aplausos vieram depois que 96 vozes do coro do teatro, regidas por Mário Zaccaro, interpretaram trecho da ópera "Nabuco", de Verdi. "É um hino de libertação", disse o diretor artístico Jamil Maluf, explicando a escolha da peça.
Foi o momento que mais emocionou a irmã do ator, Lúcia Cortez, as filhas dele, Maria e Lígia Cortez (que prepara um livro sobre o pai), e amigos, como a atriz Maria Fernanda Cândido.
Nessa hora, do lado de fora do teatro, estimadas 5.000 pessoas aguardavam a abertura dos portões à população. Maria Aparecida Marques de Siqueira, 73, era a primeira da fila. Tomou seu lugar às 8h. "Não o conhecia pessoalmente, mas senti tanto a morte dele", disse.
Quando soube que, a pedido de Cortez, seu caixão permaneceria fechado, dona Maria Aparecida lamentou: "Que pena. Mas o importante é que eu vim. O que vale é a intenção".
Integrante da legião de fãs do ator, Maria de Fátima Cardoso Santana, 50, que escapuliu do trabalho no comércio na rua 25 de Março para homenagear Cortez, concordou com a decisão do ator. "Quando morrer, também não quero que vejam meu rosto pálido", afirmou.

Santo Amaro
O caixão foi coberto com uma bandeira do Estado de São Paulo. "Era um paulistano, de Santo Amaro, zona sul", destacou o prefeito Gilberto Kassab, que assistiu à missa de corpo presente, em que o padre pediu a Deus: "Abri para ele as portas do Paraíso e a nós, que ficamos, concedei que nos consolemos uns aos outros".
Ao lado de Kassab estavam o secretário das Subprefeituras, Andrea Matarazzo, o senador Eduardo Suplicy (PT-SP), os secretários da Cultura do município, Carlos Calil, e do Estado, João Batista de Andrade.
O candidato do PSDB ao governo do Estado, José Serra, foi durante a tarde ao velório do amigo que viu atuar pela primeira vez no teatro Oficina em "Os Pequenos Burgueses" (1963), peça de Gorki.
"Será nossa primeira campanha majoritária sem almoço na casa do Raul. Eu o visitei quando foi operado no Sírio-Libanês, em 2004. Levei o livro do [Gabriel] García Márquez que havia acabado de sair, o "Memórias de Minhas Putas Tristes", e até sugeri a ele uma adaptação teatral", disse.
O governador Cláudio Lembo (PFL) ficou menos de 15 minutos no local, o suficiente para se desentender com uma fã de Cortez (leia no caderno Brasil, na pág. A5). Sobre o ator, disse: "Tenho a imagem positiva de alguém que vibrava, que queria bem ao Brasil e, acima de tudo, representava muito bem".
O ator e secretário da Identidade e da Diversidade Cultural do Ministério da Cultura, Sérgio Mamberti, amigo de Cortez, representava o ministro Gilberto Gil, que está na França. Em nota, Gil lamentou a morte do ator e afirmou que "as centenas de personagens interpretadas por ele são o testemunho de quanto um profissional pode ser dedicado, delirante, sério e múltiplo".
Até as 16h44, quando o corpo seguiu em carro do Corpo de Bombeiros para uma cerimônia privada de cremação no cemitério da Vila Alpina, multiplicaram-se não só as visitas de autoridades ao velório mas também de anônimos (10 mil é a estimativa final da Guarda Civil Metropolitana), e de atores e diretores, como Dan Stulbach, Denise Fraga, Juca de Oliveira, Antonio Petrin, Marilia Gabriela, Betty Faria, Luiz Fernando Carvalho, Silvio de Abreu, Antunes Filho. Por decisão de Cortez, suas cinzas serão jogadas num sítio da família em Porto Feliz, no interior paulista. (SILVANA ARANTES E VALMIR SANTOS)

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