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Xerife lucra vendendo ilusão
RONALDO LEMOS
COLUNISTA DA FOLHA
Uma pesquisa recente
feita na Inglaterra
mostrou que o compartilhamento de arquivos está
diminuindo entre os jovens daquele país. Após anos de crescimento ininterrupto, finalmente surgem sinais de mudança.
O fato merece uma reflexão.
Teriam os juízes e a lei inglesa
se tornado implacáveis? Será
que a criação de empresas como a Web Sheriff estaria produzindo resultados? Os consumidores ingleses de repente
mudaram seus hábitos, intimidados por campanhas antipirataria? Ou será que finalmente
começaram a surgir novos serviços que, do ponto de vista
econômico, competem com os
serviços ilegais?
Ganha um download gratuito quem respondeu a última alternativa. A pesquisa mostrou
que o fator determinante para a
redução da pirataria foi o surgimento de serviços de distribuição de música que fazem sentido para os consumidores digitais. Serviços como o Spotify ou
o We7, que possuem catálogo
vasto e oferecem a possibilidade de ouvir a música de forma
conveniente, imediata e barata.
Isso mostra algo que já era
óbvio desde o final da década de
90: o problema da pirataria não
será resolvido no campo da lei,
da polícia, ou da repressão privada. Ele será resolvido no
campo econômico. Através do
surgimento de serviços que
ofereçam catálogo ilimitado,
preço baixo, assinaturas e portabilidade total da música. "It's
the economy, stupid!" (é a economia, estúpido).
Enquanto a mudança econômica não acontece, continua a
surgir espaço para empreitadas
como a da Web Sheriff, que não
está sozinha no ramo da luta
contra a pirataria na internet.
Junto com outras empresas de
nome igualmente intimidador,
como a Media Defender (defensora) ou a Media Sentry
(sentinela), ela representa um
tipo de negócio que vem lucrando alto com a venda do impossível. Vendem a fantasia de
que o mundo pode voltar 15
anos no tempo, quando a realidade econômica da informação
era diferente.
De que o problema dos downloads na internet pode ser resolvido com a radicalização da
repressão. É como contratar
um brutamontes para sair nas
ruas de uma grande metrópole.
Pode gerar uma sensação de segurança, mas não reduz em nada a violência urbana.
Privatização
Além disso, preocupa a tendência de privatização do combate à pirataria, criando a figura de justiceiros privados na rede, levando a considerações sobre a legalidade e legitimidade
desses esforços.
A Media Defender, por
exemplo, vem sendo acusada
de utilizar ferramentas de legalidade duvidosa: ataques de negação de serviço, utilização de
arquivos falsos, dentre outras.
O efeito dessas empresas tem
muito mais a ver com marketing do que com resultados globais. Por um lado disseminam
intimidação com relação aos
usuários. Por outro, vendem a
artistas e gravadoras a esperança de "contenção" dos piratas.
Enquanto não se investir de
fato em alternativas econômicas para a música em sintonia
com a realidade dos seus consumidores, o dinheiro vai tilintar mais no cofre dos vigilantes
do que no dos seus fregueses.
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