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CD ao vivo é pouco para Djavan
FERNANDO DE BARROS E SILVA
enviado especial ao Rio
Djavan foi coerente. Gravou
seu novo CD sábado e anteontem, em duas apresentações no
teatro João Caetano, na praça Tiradentes, centro do Rio, com ingressos a R$ 5 e R$ 10. O preço
dos shows não é no caso a única
coisa popular. O CD duplo ao vivo que vai resultar deles, previsto
para ser lançado no início de setembro, parece todo ele planejado para agradar a muita gente
-e pelo caminho mais fácil.
Músicas todas conhecidas, arranjos convencionais e simples
(às vezes quase simplórios), nenhuma novidade, nenhuma inquietação, nenhuma ousadia, nenhum grande acerto, nenhum erro que deva comprometer o conjunto também.
O compositor deve incluir no
CD três ou quatro músicas inéditas, que vai gravar em estúdio. Serão ao todo 25 ou 26 canções.
"Seduzir" foi desfigurada em
novo arranjo, "Se" e "Sina" aparecem aceleradas, no mais tudo
lembra muito o original. A banda, formada por três sopros, duas
guitarras, baixo, teclados, bateria
e três vocais femininos, apenas
cumpre o script, sem brilho.
É de qualquer forma um disco
que já nasce consagrado, como
seu autor, que completa em fevereiro do ano que vem 25 anos de
carreira. A tiragem inicial é de 30
mil cópias para o CD duplo e de
100 mil para cada uma das versões
simples e avulsas, que visam alcançar o público que foi ao João
Caetano.
Deve vender bem. Mas a MPB e
o próprio cantor provavelmente
não sentiriam sua falta. Não chega
a ser um crime nem uma tragédia,
mas é pouco para Djavan. Pode
ser um ponto comercial, mas parece um desperdício artístico.
Num país, como se diz, muito
musical e saturado de músicos,
mas carente nas duas últimas décadas, pelo menos, de talentos, de
idéias e de música popular de
qualidade, Djavan é um dos pouquíssimos nomes que fizeram diferença. Uniu antes e melhor do
que ninguém o samba ao pop, e
estes às influências nordestinas
que carregou desde a sua origem
alagoana.
Americanizou ritmos brasileiros ao mesmo tempo em que
abrasileirou o pop, o soul e a balada americana, criando uma dicção originalíssima dentro da
MPB. Não foi à toa que gravou
"Samurai" com a participação de
Stevie Wonder em 82, no CD
"Luz". A música negra brasileira e
a canção romântica se modernizaram, ganharam fôlego e cores
novas com Djavan, a despeito de
algumas letras de suas músicas
serem desconexas e aparentemente desprovidas de sentido.
Tudo isso o novo CD, onde estarão, segundo Djavan, "músicas que fizeram história" em sua
carreira, deve de alguma forma
mostrar. Mas deve mostrar sobretudo um compositor acomodado, sem impetuosidade, sem
desafios, deslizando na onda da
própria fama.
Por que, afinal, regravar uma
música já diminuída pelo excesso de exposição como "Oceano"? Djavan não só gravou como a apresentou contra um fundo azul ondulante sugerindo
um... oceano. Seria essa a melhor tradução plástica ou visual
do que se encontrará em termos
musicais no CD.
Desde "Coisa de Acender", de
92, seu último grande disco, Djavan parece ter perdido o brilho
dos anos anteriores. Não será dessa vez que voltará a se iluminar. É
pena.
O jornalista Fernando de Barros e Silva
viajou ao Rio a convite da Sony Music.
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