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DRAUZIO VARELLA
Desencontros sexuais
Desentendimentos entre mulheres e homens começam no instante em que o espermatozóide penetra o óvulo.
Como o óvulo sempre carrega
um cromossomo sexual X, se o espermatozóide trouxer um cromossomo Y, haverá formação do
par XY e nascerá um menino. Se
trouxer um cromossomo X, o par
XX dará uma menina.
Dos primeiros estágios do embrião à vida adulta, nosso cérebro
e os demais tecidos serão bombardeados incessantemente pelos
hormônios sexuais condicionados
à configuração XX ou XY. Eles
decidirão não apenas se teremos
testículos ou ovários, pênis ou clitóris, mas as características arquitetônicas dos circuitos de neurônios envolvidos no processamento das emoções e na estrutura
básica do pensamento racional.
Nas mulheres, em obediência a
uma ordem que parte de uma
área cerebral chamada hipotálamo, a hipófise libera o hormônio
FSH (hormônio folículo estimulante), que agirá sobre os folículos
ovarianos, estimulando-os a produzir estrogênios, encarregados
de amadurecer um óvulo a cada
mês.
FSH e estrogênios dominam os
primeiros 15 dias do ciclo menstrual com a finalidade de tornar a
mulher fértil, isto é, de preparar
para a fecundação uma das 350
mil células germinativas com as
quais nasceu.
Atento ao desenrolar dos acontecimentos, ao detectar a ovulação no 14º dia do ciclo, o hipotálamo muda radicalmente de orientação e avisa a hipófise de que está na hora de liberar mais LH
(hormônio luteinizante) para
obrigar o ovário a produzir progesterona, com a função de preparar terreno para a passagem segura do óvulo fecundado pela
trompa, para a sua implantação
no útero e para assegurar continuidade à gravidez e ao aleitamento.
Se não houver fecundação, o ciclo terá sido fútil: a camada interna do útero (endométrio) desabará e os vasos que a irrigam sangrarão por alguns dias. Então, o
todo-poderoso hipotálamo dará
ordem para iniciar o ciclo seguinte.
Estrogênios e progesterona não
são os únicos hormônios sexuais
capazes de influenciar o comportamento feminino, mas são os
mais importantes. Reduzida à essência, a ação dos estrogênios, liberados em grande quantidade
na primeira metade do ciclo, é
preparar para o sexo; a da progesterona, na segunda metade, é assegurar a integridade da gravidez.
Níveis elevados de estrogênio
reduzem a fome, exaltam o olfato,
o paladar, a disposição e a libido,
tornam a pele sedosa e brilhante,
bem como a vagina lubrificada e
aquecida, diminuem a consistência do muco que obstrui o colo
uterino para impedir a entrada
de germes e aumentam a libido. O
impacto estrogênico no cérebro
desperta ímpetos sedutores, estimula a agressividade, a independência e a capacidade de planejamento, melhora o humor e tem
efeito antidepressivo.
A predominância de progesterona nas duas semanas que antecedem a menstruação torna a pele menos brilhante, provoca retenção de líquido, inchaços, turgescência e dor nas mamas, diminuição da lubrificação vaginal e
da libido, dificuldade de atingir o
orgasmo, aumento do apetite e da
temperatura corporal. A mulher
se torna mais dependente, irritada com as atitudes masculinas,
insegura, carente de proteção,
menos criativa, menos carinhosa
com os filhos e menos indulgente
com os familiares.
Nos homens, o panorama hormonal é dominado pela testosterona, responsável pelo aumento
das massas óssea e muscular e pelos caracteres sexuais secundários. Sua influência no comportamento pode ser resumida na
aquisição de duas características
predominantemente masculinas:
espírito de competição e agressividade, graças às quais nossos antepassados exerceram poderosa
atração sexual sobre suas companheiras desejosas de garantir a
sobrevivência da prole acima de
tudo.
Nos homens, os níveis sangüíneos de testosterona aumentam
rapidamente com a chegada da
puberdade, mantêm-se elevados
até os 25 ou 30 anos e entram em
declínio muito lento, que se acentua depois dos 65 anos. Descontado o salto da puberdade, não
ocorrem variações hormonais imprevisíveis.
Nas mulheres, os ciclos que se
iniciavam aos 16 ou 17 anos no
início do século passado, hoje se
instalam cada vez mais cedo, sem
sabermos exatamente por quê.
Não são raras as meninas que
menstruam pela primeira vez aos
11 anos. A partir de então, eles se
repetem mensalmente até a instalação da menopausa, lá pelos 50
anos, quando a função ovariana
entra em falência. Da puberdade
à menopausa a seqüência só é interrompida em caso de gravidez e
amamentação, fases dominadas
pela progesterona, o hormônio da
maternidade.
A complexidade hormonal das
mulheres, seres cíclicos, é incomparável à nossa. Diante delas somos singelos, para não dizer simplórios: nossas concentrações de
testosterona num dia qualquer
são praticamente idênticas às do
dia anterior e às do mês seguinte.
Só com o passar dos anos podemos notar o declínio lento. Em
contraposição, nelas a composição e o equilíbrio entre os níveis
estrogênios e de progesterona variam não apenas no decorrer da
vida em função da maternidade e
da menopausa, mas de um dia
para o outro. Não existem dois
dias de um ciclo menstrual em
que as concentrações de estrogênios ou de progesterona sejam as
mesmas.
Talvez por causa dessas diferenças as mulheres digam que os homens são todos iguais, enquanto
nós dizemos que não dá para entender as mulheres.
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