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LIVROS
Crítica/ "Neoplasticismo na Pintura e na Arquitetura"
Obra expõe utopia urbana de Mondrian
Artigos do artista plástico holandês, inéditos no Brasil, unem arquitetura e pintura em projeto modernista comum
OTAVIO LEONÍDIO
ESPECIAL PARA A FOLHA
"Neoplasticismo na
Pintura e na Arquitetura" -coletânea de textos do pintor holandês Piet Mondrian (1872-1944), em sua maioria publicados originalmente entre 1917 e
1926- reúne artigos que tratam da relação entre pintura e
arquitetura modernas.
O tema é crucial. De uma parte porque, como se sabe, a pesquisa pictórica das vanguardas
artísticas européias do início do
século 20 foi capital para a definição da forma e do espaço arquitetônicos modernos.
De outra parte porque, desde
que se firmou como movimento, vale dizer, a partir sobretudo do momento em que se institucionalizou na forma de
Congressos Internacionais de
Arquitetura Moderna/CIAM
(1928), sempre houve certa
tendência a cobrar da arquitetura moderna que fosse capaz
de superar os limites demasiadamente estéticos da pesquisa
modernista.
Social
Dizer, por exemplo, do espaço arquitetônico de Le Corbusier que desdobrava o espaço
pictórico cubista poderia significar, nesse sentido, limitar-se a
um dos aspectos de sua arquitetura. Para os mais socialmente críticos, no entanto, isso significava contornar o dado relevante: a capacidade (ou falta
dela) de realização da suposta
razão de ser da arquitetura moderna, a saber, o compromisso
social com a universalização do
acesso material à habitação e à
totalidade dos espaços da cidade.
Nessas perspectivas, a leitura
dos textos reunidos em "Neoplasticismo na Pintura e na Arquitetura" (inéditos em português, judiciosamente selecionados e muitíssimo bem traduzidos) constitui oportunidade
extraordinária para perceber
como tal questão foi interpretada por um dos chefes de fileira da pesquisa modernista.
Vida exterior
Ora, o que a leitura desses
textos deixa claro é que, para
Mondrian, a separação entre
programa pictórico e agenda
arquitetural não fazia sentido.
Não porque não houvesse, a seu
juízo, uma separação de fato
entre pintura e arquitetura.
Apenas, julgava Mondrian, a
mera renovação do espaço pictórico era uma tarefa incompleta. Imperativo era a transformação da "vida exterior" em
toda a sua abrangência.
Não deve surpreender portanto que o campo para onde
conduz a pesquisa de Mondrian seja o "ambiente". Não,
propriamente, o ambiente social (e, menos ainda, o meio
ambiente, digamos, ecológico),
mas o ambiente da vida -a vida
que "encontra sua completa exteriorização na metrópole".
Donde a conclusão de que, futuramente, a própria distinção
entre as diversas manifestações artísticas deixaria de existir: "A arquitetura, a escultura,
a pintura e o artesanato artístico se converterão então em arquitetura, isto é, em nosso meio
ambiente".
Toda a radicalidade do projeto ambiental de Mondrian reside aí. Pois, como se percebe, esta nova arquitetura-ambiente
não buscava outra coisa senão
facultar a homens e mulheres
-na casa, na rua, na cidade-
uma existência integralmente
"planar", na qual todos estariam permeados pela beleza, e
onde "o artista será absorvido
pelo ser humano total [e] o não-artista será seu igual".
Eis, dentre muitas, uma ótima razão para ler "Neoplasticismo na Pintura e na Arquitetura": por meio da leitura em
primeira mão dos textos de um
dos maiores artistas do século
20, é possível perscrutar o alcance e os limites verdadeiramente estéticos de seu projeto
moderno.
OTAVIO LEONIDIO é doutor em história e professor da faculdade de arquitetura da PUC-Rio
NEOPLASTICISMO NA PINTURA
E NA ARQUITETURA
Autor: Piet Mondrian
Tradução: João Carlos Pijnappel
Editora: Cosac Naify
Quanto: R$ 33 (232 págs.)
Avaliação: ótimo
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