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CRÍTICA
"Weeds" ironiza os paradoxos da América
BIA ABRAMO
COLUNISTA DA FOLHA
Os seriados vêm levantando a ponta do tapete do modo de vida norte-americano para
revelar o lixo que tentam empurrar para baixo. "Weeds", série recém-estreada no GNT, é o mais
recente de uma linhagem que
ainda inclui "Six Feet Under" e
"Desperate Housewives".
"Weeds" recicla o argumento
de "O Barato de Grace", filme inglês sobre uma dona-de-casa que
vê no tráfico de maconha uma
maneira de ganhar a vida depois
que enviúva. Na TV, em vez da
Inglaterra rural e da suavidade
matronal de Brenda Blethyn do
filme de Nigel Cole, temos uma
cidadezinha da Califórnia e o
charme irônico de Mary-Louise
Parker.
O mote inicial é em tudo semelhante, mas, enquanto o filme,
por sua extensão, explora de modo concentrado a situação absurda, no seriado o absurdo funciona como provocação. É como se,
passando para o lado de "lá" da
lei, Nancy Botwin fosse alçada a
um lugar privilegiado do qual
pudesse ver melhor as contradições e ambigüidades da América
contemporânea.
A naturalidade com que aparece a solução adotada por Nancy
Botwin para ganhar a vida parece
combinar com um princípio que
rege o espírito mercantil da sociedade norte-americana: não
importa muito de onde vem o dinheiro, importa, isso sim, que ele
faça a roda do consumo girar.
Nesse sentido, vender maconha
no seriado funciona quase como
uma metáfora dos mecanismos
amorais do capitalismo moderno.
Apesar desse teor crítico, o tom
é humorístico e, estranhamente,
parece estar pouco se lixando para o politicamente correto.
Nancy compra a droga num
bairro barra-pesada, na casa de
uma família negra, em que, para
reforçar os efeitos cômicos do estereótipo, fala-se quase que um
patoá recheado de gírias.
Como em "Desperate Housewives" e "Six Feet Under", também em "Weeds" há cenários e
mise-en-scène com textura hiperrealista: as cenas da abertura
que mostram uma cidade assustadoramente uniforme, a "perfeição" que parece emanar das
casas e de seus habitantes de aparência agressivamente "saudável", os personagens tão típicos
que tangenciam o caricato...
Mas "Weeds" tem algo que essas outras não têm, e esse algo é
Mary-Louise Parker. OK, as
"housewives" desesperadas são
(quase todas) ótimas atrizes de
TV, mas Mary-Louise tem aquela qualidade reservada a alguns
poucos atores de tornar qualquer
aparição memorável, menos por
seu virtuosíssimo em cena, do
que por uma espécie de esquisitice. E é raro que mulheres explorem mais sua estranheza do que
seus outros dotes.
Mary-Louise nunca teve um
grande destaque no cinema, embora tenha papéis marcantes em
filmes considerados cult da década passada, como "Tomates Verdes Fritos" e "Grand Canyon",
mas parece agora ter achado o lugar perfeito para ser cool.
@ - biabramo.tv@uol.com.br
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