São Paulo, sexta-feira, 21 de janeiro de 2005

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Diretor de "A Primeira Noite de um Homem" (67) lança no Brasil seu "Perto Demais"

Alice & Dan & Anna & Larry

SÉRGIO DÁVILA
DA CALIFÓRNIA

Hollywood e a Terra seriam um lugar melhor se houvesse mais diretores como o alemão naturalizado americano Mike Nichols, de "Perto Demais" ("Closer", no original), que estréia hoje no Brasil.
Em 73 anos de vida e 40 de carreira, produziu apenas 19 longas, e nenhum deles é desprezível. Pelo contrário, há jóias como os clássicos "Quem Tem Medo de Virginia Woolf" (66), "A Primeira Noite de um Homem" (67), "Ardil 22" (70) e -por que não?- "Lembranças de Hollywood" (90) e "Segredos do Poder" (99).
Quando não tem o que dizer nas telas, se cala. Ou produz peças memoráveis na Broadway ("Descalços no Parque", "Um Estranho Casal"). Ou minisséries como "Uma Lição de Vida" e "Angels in America" (total de 11 Emmy).
No ano passado, ele decidiu que tinha algo a dizer. E dirigiu "Closer", após assistir em Londres à bem-sucedida peça homônima de Patrick Marber. Trocou algumas coisas (no teatro, Clive Owen interpretava o papel que no filme é de Jude Law) e... fez um dos grandes filmes do ano. Para adultos, sem efeitos especiais, nem baseado em HQs ou livros para crianças -só isso já faria de Nichols um pária no cinema atual.
Ou não? "Dirigir é criar eventos", disse em entrevista da qual a Folha participou, em Los Angeles. "[Elia] Kazan dizia que dirigir é transformar psicologia em comportamento, o que é uma boa definição." Realmente, a máquina faz de "Perto Demais" um filme-evento, mas no fundo se trata de uma obra simples, com quatro personagens principais, que se amam como na "Quadrilha" de Drummond e passam 104 minutos se desentendendo.
O problema é que os quatro personagens -Alice, que ama Dan, que ama Anna, que não sabe se ama Larry- são interpretados, respectivamente, por Natalie Portman, Jude Law, Julia Roberts e Clive Owen. Como dirigir tantos egos? Nichols tenta matar a charada. "Dirigir atores, sejam eles famosos ou não, é meio parecido com viver. Vocês tem de se amar para dar certo. E, pelo menos durante o filme, nós nos amamos." Tanto que, a pedido de Portman, Nichols cortou as cenas em que ela aparecia completamente nua.
"Natalie é minha amiga de muitos anos. Fizemos "A Gaivota", de Tchecov, no projeto Shakespeare in the Park, no Central Park, há alguns anos, com Christopher Walken, Meryl Streep, Philip Seymour Hoffman, foi uma coisa gigantesca", ele explica. "E ela estava perfeita. Foi vendo-a atuar ali, no parque, ao ar livre, com a luz do fim do dia do verão de cenário, que eu pensei que tinha de fazer um filme com ela. Quando vi a peça, pensei imediatamente nela no papel da stripper. O script original pedia nudez completa, filmamos tudo, sem que eu dissesse uma palavra. No final, tirei as cenas mais diretas. Assim deve ser a relação, mútua. Você não exige nada dos atores, eles que devem fazer."
E ilustra com uma história. "Sempre me lembro do que me contou uma amiga que foi assistente de direção de William Wyler em "Jezebel" (1938). No filme, Bette Davis tinha de descer uma escada. Willy era conhecido por fazer 20, 30 tomadas de cada cena. Agora, já estava na 65ª e continuava filmando. Minha amiga pergunta: "O que você quer da cena, Willy?". Ele responde: "Numa das primeiras tomadas, Bette fez um gesto com o vestido que achei interessante, mas a luz não estava boa. Estou esperando que ela repita o gesto". "E por que você não manda ela repetir?", pergunta ela. "Porque aí ela estaria fingindo, e não atuando, e isso estragaria tudo.'"
Mike Nichols se prepara para a estréia do musical "Spamalot" em Nova York -sua versão e de Eric Idle para o teatro do filme "Monty Python em Busca do Cálice Sagrado" (1975). A peça recebeu boas críticas em Chicago. "Quando cheguei para ensaiar pela primeira vez com o elenco, pensei em piadas, nonsense, todos aqueles chavões que nos vêm à cabeça quando ouvimos o nome Monty Python", disse. "Até que percebi: é tudo sobre classe. Claro! Estamos falando de britânicos, para eles tudo é questão de uma classe se sobrepondo ou explorando a outra. Daí em diante foi fácil."


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