São Paulo, sábado, 21 de fevereiro de 2004

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O papel da arte

Editora Cosac & Naify chega à marca dos 300 títulos lançados e torna-se "sucesso de crítica"

CASSIANO ELEK MACHADO
DA REPORTAGEM LOCAL

A editora Cosac & Naify chegou ao mercado em 1996 com pinta de conto de fadas. Desde que jogou suas tranças, com um sofisticado livro impresso na Itália sobre o artista brasileiro Tunga, o selo colheu dois tipos de comentários.
Se para muitos virou de imediato a princesa das editoras nacionais, como a primeira casa a levar a sério os livros de arte no país, para outros não resistiria nada; logo logo viraria sapo.
Ganharam os que apostaram em Rapunzel. Sete anos depois de sua estréia a editora acaba de romper a marca de 300 títulos lançados com a reputação precoce de uma das mais importantes da história recente do livro no país.
O sucesso do selo criado pelo historiador da arte Charles Cosac não pode ser medido por listas de mais vendidos. Das suas três centenas de lançamentos, menos de 5% já fizeram alguma visita às relações de best-sellers.
Os termômetros são os do chamado "sucesso de crítica": a) prêmios, como o Jabuti de Livro do Ano de Ficção 2003 para o infantil "Bichos que Existem & Bichos que Não Existem", do articulista da Folha Arthur Nestrovski; b) vendas de títulos para o exterior, como "Paulo Mendes da Rocha", monografia recém-comercializada para a editora da Universidade de Princeton (EUA); c) ampla repercussão na mídia, que pode ser medida pelas 4.400 menções à editora no site Google.
Outro número recém-colhido pela editora também aponta o "para o alto e avante" em um setor onde ela não brilhava alguns anos atrás. Segundo Marcelo Rogozinski, diretor-financeiro da Cosac, a empresa cresceu 28% de 2002 para 2003, no contrapé de uma queda geral do mercado editorial na casa dos 15%.
Com todas as glórias comerciais, a Cosac ainda não saiu de seu desvio para o vermelho. "Ainda somos deficitários, mas a editora vem crescendo absurdamente e já mostrou que é viável financeiramente", afirma Ivo Camargo, diretor-comercial (ex-Companhia das Letras).
O "crescimento absurdo" coincide com a aposta da editora em um plural. Na virada do ano 2000 para 2001 começou a deixar para trás o rótulo de editora "de arte" para assumir o posto de editora "das artes".
O timoneiro desse processo foi um poeta e professor de literatura brasileira da Universidade de São Paulo, Augusto Massi. Chamado para trabalhar em uma coleção literária, a chamada "Prosa do Mundo", ele conseguiu emplacar logo de saída os maiores sucessos de venda da editora. Os dois títulos iniciais da série de clássicos, um deles do aqui desconhecido autor dinamarquês Jens Peter Jacobsen (1847-85), levaram poucas semanas para esgotarem.
Massi foi então convidado por Cosac para assumir o comando total da editora. E topou.
A primeira tarefa foi uma faxina burocrática. "A editora já era arrojada, com design primoroso. Mas os livros não tinham orçamento, contrato. Pagavam exorbitâncias, até R$ 15 mil, por um prefácio qualquer", lembra Massi. O segundo momento foi o da abertura do leque. "Resolvemos apostar em áreas nas quais o Brasil está crescendo e que o mercado editorial não acompanhava."
E assim o selo Cosac & Naify passou a ser impresso paulatinamente em livros sobre arquitetura, cinema, dança, moda, design.
Outra linha adotada pelo atual editor foi a de "agregar valor", trabalhar em parceria com instituições que já tinham destaque, como a Mostra de Cinema de São Paulo, com quem a Cosac lançou coleção de livros, ou o Centro Universitário Maria Antonia, com quem co-produziu livros e exposições sobre a arte concreta de São Paulo e cursos, como um sobre literatura russa e outro sobre arte italiana (apoiada no lançamento do clássico "História da Arte Italiana", de Argan).
Massi também pôs suas fichas na "intelligentsia". Ele chamou intelectuais como Ismail Xavier para coordenar a coleção de cinema e agora vai inaugurar uma série de livros latino-americanos curada pelo crítico Davi Arrigucci Jr., que terá como um dos destaques o lançamento do esquecido uruguaio Felisberto Hernandéz.
Charles Cosac, que chegou a falar em fechar a editora em 2001, diz que isso não passa mais por sua cabeça. Garante que lá se foi a vocação de sapo.


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