São Paulo, sexta, 21 de março de 1997.

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Orquestra de meninos do CE lança CD

PAULO MOTA
da Agência Folha, em Fortaleza

A sinfonia fina de uma orquestra formada por meninos pobres da periferia de Fortaleza vai poder ser escutada em todo o país.
No próximo mês, os 80 músicos da orquestra sinfônica da Escola de Música do Ancuri, em Fortaleza, iniciam os ensaios para a gravação do seu primeiro CD. O lançamento está previsto para o final do ano.
A Fundação Cultural da Prefeitura, que mensalmente investe R$ 35 mil na escola, deve financiar o disco. O repertório prevê desde clássicos como Mozart e Bach, a nomes da MPB como Luis Gonzaga e Luis Assunção.
O presidente da fundação, Cláudio Pereira, diz que a ``cor local'' dos arranjos criados pelos meninos do Ancuri faz a diferença. ``Recentemente o pessoal da Orquestra da Baviera ouviu a música deles e ficou maravilhado'', disse.
Criada em 1991 pelo frei franciscano Wilson Fernandes, a escola difunde música erudita para 180 alunos que moram perto de Ancuri, um dos bairros mais pobres da periferia de Fortaleza.
O vice-diretor da escola, Josué Costa, diz que a instituição foi criada para a visita do papa João Paulo 2º a Fortaleza, em 1980.
Encarregado pela Igreja de formar uma orquestra para se apresentar exclusivamente para o Papa, Fernandes tentou manter a orquestra funcionando depois da visita, mas teve dificuldades para encontrar músicos em Fortaleza.
``A orquestra morreu dois anos depois da visita do papa, também por falta de recursos financeiros. Em 1991, o frei voltou de um curso de pós-graduação em música na França e fundou sua própria escola'', diz Costa.
Na Escola do Ancuri, a idade mínima para matricula é de 6 anos. Nas aulas, os alunos recebem noções de teoria da música, num curso com duração de seis anos, e audições de músicas clássicas.
Costa diz que a realidade de dificuldades econômicas dos alunos não interfere na assimilação do conteúdo. ``Eles estranham no começo, mas, depois, assoviam o bolero de Havel com a mesma naturalidade com que cantam um forró'', diz Costa.
Na área de difusão, a escola mantém uma banda de música com 40 integrantes e uma orquestra de flautas com 45 componentes.
A regência dos dois grupos e da orquestra sinfônica é feita por três ex-alunos da ``orquestra do papa'', que fizeram cursos de pós-graduação na França.
A manutenção e fabricação de parte dos instrumentos é feita pelos próprios alunos, numa oficina anexa à escola.
Os integrantes da banda de música recebem uma bolsa de R$ 250 mensais, mas os componentes das orquestras nada ganham.
Costa diz que a principal dificuldade da escola é manter os alunos depois que eles atingem a adolescência.``A pressão da família por trabalho é grande e muitos abandonam a música'', diz Costa.
A orquestra sinfônica dos meninos do Ancuri não cobra nada por suas apresentações e costuma se exibir em praças de bairros populares e instituições de Fortaleza.

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