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ARTIGO
Encrenqueiro aparece em versão contida
ANDRÉ FISCHER
COLUNISTA DA FOLHA
Em sua estréia no cinema,
Eminem busca redimir
a imagem de encrenqueiro
preconceituoso e desbocado. Ou pelo menos justificá-la. Em "8 Mile", que no Brasil ganhou o insensato subtítulo de "Rua das Ilusões", ele
revive suas origens desafortunadas e o caminho que o
catapultou ao megaestrelato.
Há três anos, as paradas
foram tomadas pelo CD
"The Marshall Mathers LP",
cuja letras ferinas pregavam
morte a Ricky Martin, classificavam Britney Spears como "vadia retardada" e
plantavam o ódio contra homossexuais e mulheres,
ameaçando expulsar aos tapas os gays de sua cidade e
justificando a violência contra as caras-metades.
Sua falta de humor também fez lenda. Exigiu na Justiça a retirada da revista britânica "The Face" das bancas por ter mudado para rosa a cor de sua camisa em
uma foto. Com o tempo, seu
veneno homofóbico acabou
destilado pelo showbiz. Até
Elton John perdoou sua língua solta em uma parceria
musical. Estratégia de marketing ou o sucesso amansou o virulento repentista?
Um bom-mocismo disfarçado parece ser a tônica da
nova fase de sua carreira. No
filme, para tentar convencer
sobre sua mudança de postura em relação aos homossexuais, seu personagem
força a barra e defende um
operário gay humilhado por
colegas de fábrica. Um mea
culpa por suas pisadas de
bola anteriores.
Ainda não é possível avaliar se os olhares esbugalhados de Eminem revelam um
canastrão ou um novo talento. Por ter conseguido cruzar
a fronteira dos fãs de sua
música e alcançado gorda
bilheteria, recebeu como
prêmio de consolação a indicação ao Oscar de melhor
canção ("Lose Yourself").
Como representante bissexto do musical, "8 Mile"
surpreende. Saí de casa preparado para detestar uma
produção estrelada pelo preconceituoso Eminem e morrer de preguiça com uma temática tão específica. Mas
preciso me render e fazer
também meu mea culpa: até
que o filme não é ruim...
André Fischer é colunista da Revista da Folha e organizador do
festival Mix Brasil
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