São Paulo, segunda-feira, 21 de março de 2005

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POLÍTICA DIGITAL

Claudio Prado fala sobre projeto do MinC de distribuir 262 kits multimídia para regiões carentes do país

"Vamos criar os campinhos de várzea da cultura"

DA REPORTAGEM LOCAL

Alheio à saraivada de balas que atingiram o Ministério da Cultura em 2004 por conta da polêmica Ancinav, um legítimo hippie da década de 70 arquitetava a entrada do Brasil em uma nova era. Não a de Aquário, mas a digital.
Coordenador do setor de políticas digitais do MinC, o ex-produtor de Mutantes, Novos Baianos, dos lendários festivais de Wight, Glastonbury e de Águas Claras, Claudio Prado, 61, tem posições pouco ortodoxas quando o assunto é a crise atual da indústria fonográfica ("a pirataria é um apêndice do monopólio"), o impasse nas discussões sobre TV digital ("há uma nova lógica, e há uma lógica antiga que quer se manter do jeito que está") e a própria dinâmica dentro do Ministério da Cultura ("ainda se compra papel carbono no MinC").
Entre os projetos de que participou nos últimos quase dois anos, desde a criação da Coordenadoria de Políticas Digitais, no início de 2003, esteve o lançamento nacional das licenças alternativas de direito autoral Creative Commons e a criação dos Pontos de Cultura, um dos braços do programa Cultura Viva, que promoverá a doação de "kits de cultura digital" -computadores, câmeras de vídeo e ilha de edição- para 262 projetos aprovados pelo MinC em setembro do ano passado.
Na semana passada, o programa, que conta com verba de R$ 37 milhões, firmou uma parceria com o Ministério das Comunicações para que os conteúdos produzidos nos Pontos de Cultura sejam também distribuídos via internet, rádios e TVs digitais.
Leia a seguir, trechos da entrevista de Prado à Folha. (DA)

 

Folha - Que importância você vê nos Pontos de Cultura?
Claudio Prado -
O que a mágica digital permite é que um moleque que está lá num estúdio nos Bororos ou na periferia de São Paulo, onde tiver um Ponto de Cultura, grave um negócio dele e disponibilize [na internet] no mesmo lugar que o [Gilberto] Gil. O Ponto de Cultura democratiza a idéia de estúdio e de rádio. Onde tiver um pequeno kit multimídia, no Piauí, haverá um embrião de um estúdio que pode ir ao ar em Tóquio. Se vai ao ar ou não, isso é outra questão, mas certamente os chicos sciences da vida vão aparecer nesses lugares, os talentos vão passar por ali. Estamos criando os campinhos de várzea da cultura.

Folha - E como fazer o brasileiro trocar a bola pelo computador?
Prado -
Eu acho que a dificuldade está muito mais no raciocínio de que você precisa aprender tudo o que não sabe para poder chegar a isso. E não é assim. Se você enfiar o negócio lá, é fácil: aperta o botão e gravou. É muito mais fácil nesses lugares do que num lugar onde o cara está iniciado. Nossa idéia é a autonomia, cada ponto tem que ser dono do seu processo. O equipamento é doado, e também vamos doar a capacitação, que gera a autonomia dele e do vizinho dele. Não estamos montando um sistema que está preso a uma pirâmide e vai depender de capital federal para manutenção.

Folha - Como implantar isso, considerando que o acesso à internet no país ainda é escasso?
Prado -
Temos um convênio com o Ministério das Comunicações para que cada Ponto de Cultura tenha uma antena de satélite, o que não é ideal, mas é uma alternativa para certos lugares onde outras formas de acesso não são possíveis. Mas, por trás disso tudo, existe uma luta no sentido de que exista uma política pública de banda larga no Brasil. E não acredito que essa política pública possa nascer de outro lugar que não do governo. É ele que tem que fazer e, obviamente, tem que fazer.


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