São Paulo, sexta-feira, 21 de março de 2008

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Macunaíma musical

Livro vira música em CD da cantora Iara Rennó, com participação de Tom Zé, Siba e outros

Julia Moraes/Folha Imagem
A cantora e compositora Iara Rennó, que lança "Macunaó.peraÍ.matupi ou Macunaíma Ópera Tupi"

RAQUEL COZER
DA REPORTAGEM LOCAL

"Me espanca devagar que isto dói dói dói..." Com levada ragga, a faixa "Dói Dói Dói", do primeiro CD solo de Iara Rennó, não dá pista do caráter octogenário de seu refrão. Ele foi extraído de "Macunaíma: o Herói sem Nenhum Caráter", de Mário de Andrade (1893-1945).
O inegável ar "um tapinha não dói" do trecho foi um dos primeiros sinais de musicalidade que a cantora avistou, há nove anos, na obra-prima do modernista. Desde então, este e mais 13 excertos do livro a levaram a gestar o recém-concluído álbum "Macunaó.peraí.matupi ou Macunaíma Ópera Tupi".
"O próprio Mário de Andrade assumiu esse caráter musical ao definir a obra como rapsódia, remetendo aos cantos populares", diz Iara, 31, uma das três vocalistas do grupo DonaZica, sobre o projeto idealizado durante a faculdade de letras na USP. "Isso era latente nas estrofes do livro, mas só então vi que a prosa também tinha ritmo", conta.
Como "Macunaíma" já tinha inspirado filme, peça de teatro, mas "nada totalmente voltado para a música", a cantora sentiu-se imbuída da "missão" de lançar um CD. Para isso, cooptou cerca de 60 músicos, incluindo Tom Zé, Arrigo Barnabé, Siba e Moreno Veloso. "Foi natural, como Mário de Andrade fazia em suas pesquisas folclóricas, buscar gente de lugares e estilos diferentes. Acho que é por isso que o disco não é facilmente "categorizável"."
De fato, a unidade existe apenas na temática. Compostas por Iara, as faixas vão do ragga à ciranda e têm produção de oito músicos diferentes (incluindo ela própria). "Mais que o trabalho de cantora e compositora, vejo este como um trabalho de produção, de articular times", diz a filha do letrista e jornalista Carlos Rennó e da cantora Alzira Espíndola.

Tom Zé
Iara saiu em busca dos convidados após visualizar os gêneros possíveis para cada trecho do livro. Tom Zé, que subiu aos palcos como mendigo na turnê de "Estudando o Pagode", põe a voz na divertida "Conversa" -um canto de pedinte com tratamento eletrônico, sob produção de Buguinha Dub. O rabequeiro Siba foi convidado a produzir e a tocar em "Boi". "São várias quadrinhas reunidas, de cantiga de roda a bumba-meu-boi, e transformei tudo em ciranda", diz a cantora.
O texto que abre o livro, um dos três em prosa que viraram música (as outras faixas saíram de versos), foi o primeiro em que Iara "viu" uma melodia. "Todos os períodos têm o ritmo de sete ou oito sílabas poéticas: "No fundo do mato-virgem nasceu Macunaíma, herói de nossa gente. Era preto retinto e filho do medo da noite'", recita. Estava pronta a primeira estrofe da canção "Macunaíma", que o DonaZica gravou em 2003. "Eu cortei orações para manter o ritmo, mas não acrescentei nada às palavras de Mário", diz.
Algumas das músicas podem ser ouvidas na página myspa ce.com/iararenno, mas o CD ainda não chegou às lojas. "Estou negociando a tiragem comercial com alguns selos", diz. Concluído com o apoio da Petrobras, o álbum terá sua primeira tiragem, de 3.000 cópias, destinada em boa parte a escolas da rede pública. O lançamento comercial deve acontecer em dois meses, prevê Iara.
"Quando o DonaZica gravou "Macunaíma", soube que professores usavam a música como material didático. Achei a proposta linda, e, quando apresentei o projeto à Petrobras, resolvi que faria essa distribuição", conta. Outra parte da tiragem foi dividida entre músicos, divulgação e contrapartida para o MinC e para a Petrobras.


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