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CINEMA "GOYA"
Saura pinta Goya reminiscente
PAULO VIEIRA
especial para a Folha
Goya, além de ser o nome do
talvez maior pintor espanhol
-está mal o país que teve Velázquez, Picasso?-, é também o nome do principal prêmio cinematográfico da Espanha. A aproximação do cinema com o pintor, já
realizada uma boa dúzia de vezes,
agora ganha a mão de Carlos Saura ("Tango", "Cria Cuervos").
Seria estupidez tentar superar o
cinebiografado, e Saura não tem
tal pretensão. Mas estar à sua altura já é difícil o suficiente, e o cineasta, que não tem primado ultimamente pela qualidade dos seus
roteiros (ver "Tango"), teve o
bom senso de manter a parceria
com Vittorio Storaro, o fotógrafo
de Bertolucci e do supracitado
"Tango".
Fica enfatizada, assim, uma
preocupação com a cor, definitivamente pertinente para um filme com tal protagonista. Com o
uso de transparências, velas e gelatinas, procurou-se dar relevo às
cores quentes dos quadros de
Francisco de Goya y Lucientes
(1746-1828), cores necessárias, de
eleição, sem as quais a pintura de
um sujeito atormentado, dividido
entre uma vida de benesses na
Corte -era seu retratista oficial- e a indignação diante da
corrupção humana, não ganharia
a posteridade.
Storaro fez bem seu serviço.
Já Saura, este fixou seu Goya em
seus últimos anos, já octogenário,
no exílio em Bordeaux, dado a
alucinações e "flashbacks". Quis
enfatizar um lado mais expressionista, por assim dizer, do pintor.
Assim, Goya já surge em cena em
meio a um surto psicótico e passa
o filme a lastimar sua surdez.
É de se imaginar que a estratégia
ensejará reconstituições dos famosos quadros dos horrores de
guerra e da fase negra, a temática
hardcore com que Goya, nas palavras de Malraux, antecipa a modernidade. Enseja, de fato, mas
não orienta o filme.
Optando por um Goya reminiscente, Saura ficou à vontade para
fazer um inventário de "fim de
viagem" do homem. O recurso,
óbvio, facilita a narrativa, mas
beira a cronologia.
Resta um pintor que volta e
meia se amargura por servir a
Corte que assumidamente bajula.
Excita-o muito, contudo, a vida
cortesã: só assim se tornará um
pintor de renome, só lá poderá
cortejar a duquesa que posa para
sua "Maja Desnuda".
Não há dúvida que o pintor, vaidoso e autocentrado, tem essas facetas preservadas por Saura. Mas,
com isso, os coadjuvantes quase
mal chegam a ser dignos do qualificativo. Como uma reconstituição histórica, "Goya" é nulo. Como homenagem sincera, polegares ao alto.
De Aragão, qual Goya, Saura
parece ter gostado do gênero que
ora abraça -cinebiografias de
aragoneses famosos. O próximo,
já em fase de filmagem, é Buñuel.
Um Saura surrealista? Ops, essa
acho que eu não vou pagar para
ver.
Avaliação:
Filme: Goya (Goya en Burdeos)
Direção: Carlos Saura
Produção: Espanha/Itália, 1999
Com: Francisco Rabal, Jose Coronado, Maribel Verdu
Quando: a partir de hoje, no Top Cine 2
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