|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"GÁVEA DE TOCAIA"
Livro é composto de belas imagens e textos pouco esclarecedores
FELIPE CHAIMOVICH
CRÍTICO DA FOLHA
"Gávea de Tocaia" é livro
traiçoeiro. Embora apresente extensa documentação fotográfica sobre a obra de Lygia Pape, encerra-se com textos pouco
esclarecedores acerca da singularidade da artista.
Pape ocupa posição de importância na produção nacional. Nos
últimos 50 anos, esteve na vanguarda das reinterpretações da
abstração construtiva paulista e
carioca. Com "Balé Neoconcreto", de 1958, propôs uma obra
ambiental inovadora, convidando o público a abandonar a contemplação passiva e a se aproximar dos sólidos geométricos. Serviu de referência para a elaboração do "Esquema Geral da Nova
Objetividade Brasileira", manifesto da arte contemporânea publicado em 1967.
Pape assina o projeto gráfico de
"Gávea de Tocaia". Ela já produziu livros de artista e domina a mídia. Assim, o leitor terá um duplo
prazer: com a documentação de
excelente qualidade e com a edição das imagens.
Entretanto a parte escrita do livro não dá conta do recado. Há
textos de Mário Pedrosa, Hélio
Oiticica e Guy Brett.
Pedrosa e Oiticica apresentam
reflexões poéticas. Neles, o leitor
encontrará pouco esclarecimento
objetivo sobre as obras de Pape.
O texto de Oiticica, em particular, é obscuro, confuso e abundante de conceitos não definidos:
"Mesmo que [o objeto "Ovo", de
Pape" seja reconstruído como no
início para nova manipulação, essa reconstrução não indica um
processo cíclico que completa a
manipulação, mas uma sequência
linear cujo começo é aberto e cujo
fim é aberto, não tendo portanto
nem começo-começo nem fim-fim: frase fragmento como linha
quebrada" (pág. 300).
Guy Brett articula o internacionalismo de Pape apelando para a
semelhança aos dois ícones brasileiros do circuito atual de exposições globais: Lygia Clark e Hélio
Oiticica. Com uma visão estrangeira da produção brasileira, descontextualiza o cenário sociopolítico em que se dão as mudanças
estéticas no início dos anos 60,
privilegiando aspectos universais
da "arte ocidental".
A exploração das relações entre
experiência corporal e contemplação intelectual da obra de arte
é corretamente enfatizada pelo
autor anglo-saxão. Mas, por se
restringir a análises gerais, Brett
não explica a especificidade de
Pape.
"Gávea de Tocaia" desperdiça a
chance de contribuir com reflexões teóricas relevantes. A rica
parte iconográfica é interpretada
à luz de referências internacionais
previsíveis.
Avaliação:
Texto Anterior: A biblioteca de Lygia Pape Próximo Texto: Livro da Criação (*) Índice
|