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São Paulo, segunda-feira, 21 de abril de 2003

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Os veteranos Raul Cortez e Fernanda Montenegro protagonizam drama urbano à la Hitchcock

Mistérios de Copacabana

FABIO CYPRIANO
ENVIADO ESPECIAL AO RIO

Regina viu de sua janela, em Copacabana, uma mulher morrendo, após o que parecia ser uma injeção letal. Como sempre -sua ocupação como aposentada era delatar crimes à polícia local- foi ao delegado contar o que vira.
Mas, no dia seguinte, nada sai nos jornais. Ela supõe então que Camargo (esse é o nome do suposto assassino, ela descobre), um juiz aposentado e ex-secretário de segurança do Rio, devia ter abafado o caso. A própria polícia afirma que a morte fora natural -a mulher sofria de câncer. Regina decide decifrar o mistério.
Esse é o argumento de "O Outro Lado da Rua", produção estrelada por Raul Cortez, como Camargo, e Fernanda Montenegro, como Regina, em seu primeiro papel de protagonista após o sucesso de "Central do Brasil". O filme tem na direção o estreante Marcos Bernstein, 33, que assina o roteiro com Melanie Demantas. Bernstein, aliás, foi um dos roteiristas de "Terra Estrangeira", de Walter Salles e Daniela Thomas, e também do próprio "Central".
"Gosto de trabalhar com diretores estreantes. Foi assim com Leon Hirszman ["A Falecida", de 1964" ou Luiz Fernando Goulart ["Marília e Marina", de 1976", pois é quando eles propõem uma linguagem", afirma Fernanda.
Além de contar com dois dos mais prestigiados atores nacionais, o filme tem outra marca de qualidade: a co-produção com o canal franco-alemão Arte, que pela primeira vez financia um longa-metragem latino-americano, além de contar ainda com a Columbia Tristar. Tudo graças à brasileira Katia Machado, que vive há 20 anos na França e também estréia como produtora independente com sua Passaro Films. "O Outro Lado" conta ainda com participação de Laura Cardoso.
Há três semanas, o filme, orçado em R$ 4,5 mi, começou a ser rodado, e a Folha acompanhou as filmagens na última quinta, na rua Paula Freitas, em Copacabana. As rodagens seguem até o fim de maio e o lançamento está previsto para abril de 2004.
"No Rio, há uma relação comum entre delatoras e a polícia. No Leblon, elas são chamadas de "vizinhas fofoqueiras". Li num jornal o caso de uma mulher que denunciou um assassinato, e achei que era um bom tema a ser tratado. Não fiz pesquisa a respeito, pois fiquei imaginando a solidão que passa uma pessoa para ter tal atitude e, a partir daí, desenvolvi o roteiro", disse Bernstein.
Apesar de certa semelhança com "Janela Indiscreta", de Alfred Hitchcock, a Regina, de "O Outro Lado" não espia apenas da janela. Ela frequenta o submundo de Copacabana em roupas de couro, da disco gay Le Boy a boites de prostituição, transformando a personagem em uma justiceira. "A casa é o local da solidão, mas a rua é o espaço da aventura de Regina", conta o diretor.
Entretanto, a produção busca transcender a mera ação. "No filme, nem tudo tem uma razão óbvia, explicitada, como a herança americana, mas há um lado existencial, que o aproxima da herança européia", afirma Fernanda.
Bernstein escreveu o roteiro já pensando nos atores principais, mas só foi consultá-los depois de pronto. "É um excelente roteiro", afirmam os protagonistas juntos. "Meu personagem é simples, mas difícil de fazer, pois paira sobre ele a dúvida sobre ser culpado ou não, que não posso deixar clara. Nem mesmo para a Fernanda eu contei como o imagino", diz Cortez, que a cada passo que dá na rua é saudado como "o melhor", "você é demais" ou "e aí, Raul".
Como não é difícil de supor, Regina, ao investigar a vida do juiz aposentado, acaba se envolvendo com ele. "Após várias encontros fortuitos, Camargo diz a ela: "estamos nos vendo demais, acho que precisamos nos conhecer'", conta Raul Cortez.
O encontro dos dois atores na tela marca 46 anos de trabalhos conjuntos. "Raul estreou na peça "Rua São Luiz, 27, 8º andar", de Abílio Pereira de Almeida, no TBC, na qual ele me ensinava a dançar twist. Desde então, fizemos vários trabalhos juntos", lembra Fernanda.
Filmar nas ruas de Copacabana tem sido uma aventura para a produção. Evitar aglomerações é um desafio. A cada passante que se aproxima perguntando se estão gravando uma novela, alguém sempre afirmava: "Não, é um documentário universitário", enquanto era observado por muitas mulheres, debruçadas nas janelas do outro lado da rua.



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