São Paulo, sábado, 21 de maio de 2005

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ENSAIO/"ÉPURAS DO SOCIAL"

Obra discute o papel dos intelectuais

GILBERTO FELISBERTO VASCONCELLOS
ESPECIAL PARA A FOLHA

"É puras do Social" é um bazar crítico onde o leitor encontrará quase de tudo sobre cultura brasileira. Escrito com apuro e requinte, repleto de centenas de citações, este livro de maturidade de Joel Rufino dos Santos (a maturidade, essa terrível prenda, como poetou alguém) lida basicamente com duas coisas entrelaçadas: os pobres e os intelectuais. O principal objeto da reflexão da obra é o povo, o oprimido, o explorado, o pobre, ou melhor: os pobres que sustentam os ricos. E pobreza (a falta do necessário) difere da miséria em que a privação é absoluta.
Segundo Rufino, a arte ou a literatura apreende melhor o que é a pobreza no Brasil do que a sociologia ou a história, embora ele seja um excelente historiador dos ex-escravos e seus descendentes, nos quais se encontra a gênese da atual pobreza generalizada.
Rufino não é desses sociólogos chatos que desconfiam da expressão como se algo que esteja bem escrito carecerá de gnose, isto é, de conhecimento. Convém deixar claro: Rufino é um escritor da pesada. Afinal, quem são os pobres? São os despossuídos, os desclassificados, obrigados a se virar, a correr atrás, que não conseguem se assalariar nem arrumar emprego fixo, são os destituídos de território. O agravante disso é que as privatizações converteram todos os brasileiros em pobres desterritorializados. A verdade é que somos todos palestinos.
Este livro de Rufino merece a atenção das pessoas de bem por ter sido mentalizado sob o signo da inquietude: um livro que levanta inúmeros problemas e questões do capitalismo videofinanceiro. A fim de acabar com a existência do intelectual espúrio que joga no time dos ricos e dos poderosos, Rufino teoriza um intelectual para pobres, mas não embarca na esparrela retórica sobre os "excluídos" e a "exclusão".
O intelectual para pobres quer se olhar no espelho e não se sentir envergonhado. É o desdobramento do intelectual iracundo de que falava mestre Darcy Ribeiro. Por causa dessa filiação ideológica soa estranho e incompreensível Rufino se valer da anfibologia do "populismo", principalmente depois que o arsenal da maldade acadêmica deitou e rolou com a morte do caudilho Leonel Brizola. Trata-se de um esforço notável para tirar o intelectual da lama. A figura do intelectual no Brasil está mais suja do que pau de galinheiro. O intelectual se desmoralizou como um burocrata indiferente à miséria que o cerca num país ocupado pelo imperialismo. Intelectual de outra estirpe, o lance de Rufino é pensar o povo e o país, com o objetivo de eliminar a pobreza.
O que deveria ser motivo de reflexão para as esquerdas é a idéia de Rufino sobre o trabalhador da cultura como uma estratégia inteligente de oxigenar o Ministério da Cultura, ou seja: "O objetivo principal de uma política cultural de um governo de esquerda seria transferir renda, sob a forma de bens culturais, para os pobres". Aliás, esse livro traz um belo roteiro para um ministro da Cultura que esteja antenado no brasileiro como o melhor produto do Brasil.


Gilberto Felisberto Vasconcellos é professor de ciências sociais na Universidade Federal de Juiz de Fora e autor de "A Salvação da Lavoura" (Casa Amarela)

Épuras do Social
    
Autor: Joel Rufino dos Santos
Editora: Global
Quanto: R$ 35 (256 págs.)



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