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Artista explora cultura de massa e tensão sexual
Na galeria Luisa Strina, inglês David Haines retrata jovens rapazes e seus tênis
"Eu compro sapatos usados porque neles você sente o cheiro da pessoa que usou, o gosto", diz artista que expõe pela segunda vez no Brasil
SILAS MARTÍ
DA REPORTAGEM LOCAL
As mãos de David Haines parecem macias demais para um
homem obcecado por pés -na
verdade, sapatos. Ele tira as luvas grossas que usava na montagem e deixa ver a pele fina das
palmas ao receber a reportagem da Folha na galeria Luisa
Strina, em São Paulo.
Estranha a delicadeza porque é com essas mãos de aspecto frágil que ele desenha a lápis
odes ao sapato como instrumento e objeto de humilhação
e desejo -as 11 telas grandes e
pequenas expostas a partir de
hoje na galeria dos Jardins.
"Eu compro sapatos usados,
porque neles você sente o cheiro da pessoa que usou, o gosto.
Dá para chegar perto de alguém só pelos pés", diz Haines.
Nascidos desse fetiche, seus
desenhos retratam jovens rapazes e seus tênis, em rituais
estranhos e poses com um ar
blasé. Não disfarçam uma forte
tensão sexual, que vem embalada por uma reflexão sobre a
cultura de massa e a junk food.
"São todos garotos de programa que eu encontrei na internet e pedi que posassem para mim", conta Haines. "As
imagens não são sexuais, mas
há um grande desejo por trás."
Haines diz tentar organizar o
caos da vida on-line rastreando
a mitologia que se cria em torno de personalidades fake, cibernéticas. Não quer contar
uma história, mas capturar
uma imagem que permita várias leituras, seja pelo confronto direto com o retratado, seja
pelas marcas e símbolos reproduzidos nas imagens.
Sobre os logos de Nike,
McDonald's e Adidas que aparecem nos retratos, esclarece
que não se trata de um discurso
contra o marketing corporativo. "Marcas conhecidas são
símbolos reconfortantes. Se
você anda por uma rua escura e
desconhecida e vê uma placa
do McDonald's, é algo que dá
confiança", diz Haines.
Mas fora desse discurso, chama a atenção o desenho que recria com um realismo fotográfico as dobras nos tecidos, a
textura dos tênis, o arrepio dos
cabelos desses jovens. Valoriza
a representação e surpreende
num momento em que a arte
despreza o figurativo.
Na entrevista, ele pára e olha
de perto os desenhos e aponta
cada detalhe que copiou do tênis original. Chega a arriscar
excessos como dizer que Rembrandt dava a mesma atenção à
luminosidade em sua obra.
Todo o apuro, apesar da excentricidade do tema, seria
convencional, não fosse Haines
um artista contemporâneo.
Respaldado pela busca on-line
de seu leitmotiv, consegue dar
carga atual a seus desenhos.
Mas não passa em branco o fato de esses serem retratos de rituais sadomasoquistas e de forte apelo fetichista -fator de
choque que se perde com graça
na técnica clássica.
DAVID HAINES
Quando: de seg. a sex., das 10h às
19h; sáb., das 10h às 17h; até 21/6
Onde: galeria Luisa Strina (r. Oscar
Freire, 502, Jardins; tel. 0/xx/ 11/
3088-2471)
Quanto: entrada franca
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