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PERÍODO FRANQUISTA É REVISTO POR ROMANCES, LIVROS DE REPORTAGEM E ENSAIOS
Dedo na FERIDA
Defensores da causa republicana, franquistas e céticos vasculham memória da Guerra Civil Espanhola
IVAN PADILLA
FREE-LANCE PARA A FOLHA, DE BARCELONA
A Espanha quer recuperar a memória perdida. Após décadas de
silêncio, os anos sangrentos da
Guerra Civil Espanhola (1936-1939) e da repressão do regime
militar (1939-1975) instaurado
pelo general Francisco Franco
-que contabilizou mais mortos,
desaparecidos e exilados (cerca de
1 milhão) que todas as ditaduras
latino-americanas do mesmo período- são tema de romances,
ensaios e livros de reportagem.
Pelo menos duas dezenas de títulos chegaram às livrarias espanholas nos
últimos três meses, sendo que sete
deles estão na feira do livro de
Madri, aberta em 30 de maio.
As histórias são contadas do
ponto de vista dos vencidos e, na
maioria das vezes, os personagens
são reais, com nome e sobrenome. Os livros abordam temas até
agora pouco explorados, como as
execuções sistemáticas dos republicanos durante o avanço franquista, as mazelas sociais do pós-guerra, os campos de concentração, as valas comuns, a vida das
prostitutas e o amor reprimido.
A Guerra Civil Espanhola teve
início em junho de 1936, quatro
meses após a vitória nas eleições
da Frente Popular, formada por
republicanos, socialistas e comunistas. Os militares, liderados pelo
general Francisco Franco, não
aceitaram o resultado das urnas,
tomaram as armas e marcharam
de Marrocos até Madri.
Em "La Columna de la Muerte",
por exemplo, o historiador Francisco Espinosa narra o avanço
franquista em direção à capital espanhola. "Os franquistas tinham
um plano de extermínio definido.
Nos povoados por onde passavam, fuzilavam políticos e sindicalistas. O número de execuções
era de cerca de 1% da população,
com o objetivo não só de eliminar
opositores, mas também de mostrar força", diz o historiador.
Ainda tabu na sociedade espanhola, o tema dos campos de concentração é explorado em "Los
Campos de Concentración Franquista", "Una Imensa Prisión" e
"Irredentas". Nessas prisões, os
oposicionistas não eram executados, como nos campos nazistas,
mas obrigados a trabalhar.
A recessão econômica, o desemprego e a fome durante o confronto civil e nos anos de pós-guerra são tratados em obras como "Crónica de los Años Perdidos" e "El Hambre en España".
E por que o assunto volta à tona
agora, 21 anos depois das primeiras eleições pós-franquismo?
Para o historiador Salvador
Martí, da Universidade Autònoma de Barcelona, o longo tempo
da ditadura seria um dos fatores.
"A transição para a democracia
foi feita por uma geração que não
teve instrução política. A história
está sendo contada por uma terceira geração, pelos netos dos
mortos e desaparecidos", afirma.
Para Juan Diego Pérez, diretor
da editora Oberón, responsável
pela edição de uma coleção de
quatro livros sobre o tema, a explicação seria política.
A transição para a democracia
foi gradual: após a morte de Franco, em 1975, um gabinete moderado de direita assumiu o poder.
"Naquele momento instaurou-se
um "pacto da amnésia", uma decisão acertada por todos os lados
para evitar revanchismos", diz.
O lançamento mais esperado do
ano é o livro autobiográfico do escritor Jorge Semprún, que viveu
clandestino em Madri entre 1953
e 1963. Nas memórias sobre o período, o autor contará também
curiosidades como o episódio em
que, ao ser perguntado por um senhor, em um bar, em 1954, o que
tinha achado de um gol marcado
por Di Stéfano, respondeu:
"quem é Di Stéfano?". Não saber
naqueles tempos quem era o craque do Real Madrid, considerado
time oficial do regime, era mais
do que motivo para suspeitas.
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