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vida cigana
Caso Jean Charles, do imigrante ilegal morto pela polícia londrina, vira filme estrelado por Selton Mello e com show de Sidney Magal
Carol Fontes - 8.set.08/Folha Imagem
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Em boate de Londres, Magal faz show de uma só música, armado para o filme
PEDRO DIAS LEITE
DE LONDRES
"Tem a maior fila lá fora!", diz
o ator Luís Miranda para um
incrédulo Sidney Magal, no camarim de uma boate numa
área pobre do sul de Londres.
"Ah é? Eu achei difícil que viesse gente", responde o cantor, ao
lado de dois dos três filhos. Na
pequena sala, também está a
atriz Vanessa Giácomo, com o
filho de sete meses no colo. Em
poucas horas, Magal vai subir
ao palco, cercado por quatro
mulheres de tops decotados e
shortinhos apertados com estampa da bandeira do Brasil,
para fazer um show de uma
música só (mas tocada quatro
vezes). "Eu trouxe até uma calcinha para tacar no palco. Sem
o Henrique saber. E não é minha não, pelo amor de deus!",
diz Vanessa.
O inusitado encontro tem
um motivo: a gravação de uma
cena para o filme sobre a vida
do eletricista brasileiro Jean
Charles de Menezes, assassinado pela polícia britânica em julho de 2005, confundido com
um terrorista numa estação de
metrô em Londres. Miranda
faz o papel de Alex, um dos primos de Jean. Vanessa interpreta Vivian, outra prima do brasileiro. Henrique é Henrique
Goldman, diretor e um dos roteiristas do filme. E Magal, apesar de ser Magal mesmo, está
no lugar de Zeca Pagodinho.
Algumas semanas antes ficar
tristemente famoso, Jean
Charles viveu seu dia de herói
em Londres. Zeca Pagodinho
estava na cidade para um show
e decidiu ir ao Feijão do Luís,
um restaurante popular (e obviamente de feijoada) na Oxford street. Só que uma falha no
bufê que mantém a feijoada
aquecida quase atrapalhou os
planos do cantor. Jean Charles,
desempregado e triste, estava
por lá. Consertou o problema e
"salvou o dia". Para fazer o filme,
a negociação com Pagodinho
não avançou, e surgiu a idéia do
show. Em vez de salvar a feijoada de Zeca Pagodinho, Jean
Charles salva a apresentação de
Sidney Magal. "Mantivemos o
espírito do que aconteceu, o
Jean Charles salvando a festa
de um ídolo brasileiro", explica
o roteirista Marcelo Starobinas.
O filme parte da história de
Jean Charles (vivido por Selton
Mello) para contar a vida dos
milhares de brasileiros que moram no Reino Unido, seu cotidiano, suas dificuldades, suas
barreiras e suas pequenas alegrias. Boa parte da ação gira em
torno da chegada a Londres de
uma das primas de Jean, Vivian, que mudou para a cidade
poucos meses antes de sua
morte. "É uma menininha inocente, jovem e insegura que se
transforma numa mulher decidida. Uma caipirinha que vira
uma power girl", explica o diretor. "O Brasil não conhece o
Brasil do exterior muito bem.
Quanto mais fora do Brasil,
mais brasileiras as pessoas ficam", conta Goldman, fora do
país há mais de duas décadas.
Um cara como a gente
A histórica começa com a
chegada de Vivian a Londres e
segue até algum tempo depois
da morte de Jean. Vanessa, que
interpreta a prima, chegou a
dormir na casa dela em Gonzaga (MG) e conheceu os pais de
Jean. "É a história de um cara
como a gente, que gostava de
sair, mas que também era super
família", diz Starobinas (que
trabalhou na Folha e na BBC).
"Muita gente vai se surpreender
com quão engraçada e divertida
é a história antes de ficar trágica", afirma.
A idéia do filme surgiu em
2006, mas levou dois anos para
que o projeto conseguisse sair
do papel. Com os títulos provisórios de "Brazuca" ou "Leave to
Remain" (permissão para ficar),
deve ser lançado em meados de
2009. O filme tem produção-executiva de Stephen Frears e
Rebecca O'Brien (sócia de Ken
Loach), e é produzido pela
Mango Filmes, de Goldman, e
pela Já Filmes, de Carlos Nader. O orçamento gira em torno
de R$ 8 milhões, captados meio
a meio no Brasil e no Reino
Unido, onde teve apoio do UK
Film Council, órgão governamental, mas independente.
Alguns dos protagonistas da
vida real fazem o papel deles
mesmos no filme, como outra
prima de Jean Charles, Patrícia, e como Maurício Varlotta,
chefe do brasileiro por cinco
anos. "Ele trabalhou comigo até
acontecer essa desgraça", conta
ele, antes de se dizer "um grande fã" de Magal.
Algumas horas mais tarde,
ele é mais um nas dezenas de
brasileiros que se aglomeram
perto do palco ouvindo as ordens do diretor (as meninas
que subiram no palco têm de
subir de novo desta vez, mas na
mesma ordem!) e Magal cantar:
"Ah, eu te amo, ah, eu te amo
meu amor! O meu sangue ferve
por você!". A calcinha, branca
de bolinhas pretas, voou pro
palco.
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