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LITERATURA
Autora fala em Frankfurt sobre primeira obra infantil que está escrevendo, com felino como protagonista
Lygia Fagundes Telles tira gato da sacola
Caio Guatelli - 18.abr.2000/Folha Imagem
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A escritora Lygia Fagundes Telles em frente à máquina de escrever, em sua casa, em São Paulo |
CASSIANO ELEK MACHADO
ENVIADO ESPECIAL A FRANKFURT
Uma dor de cabeça é a melhor
lembrança que Lygia Fagundes
Telles guarda da Feira de Livros
de Frankfurt. Foi em 1994. O
"zunzunzum" das conferências,
homenagens e autógrafos deixou
dores pontiagudas na cabeça da
escritora. "Fui logo na "apotheke"
(farmácia)", lembra.
Assim começava a nascer o primeiro livro infanto-juvenil da autora de "As Meninas". "A aspirina
veio em uma sacola estampada
com um gatinho listrado de verde
e amarelo. Fiquei apaixonada por
ele", conta Lygia, que decidiu
transformar o felino em protagonista de uma "história jovem".
A maior estrela brasileira este
ano em Frankfurt -que veio para a feira a convite da Biblioteca
Nacional- antecipou para a Folha algumas características do novo personagem, que atende pelo
nome de "Eu, o Gato" e deve estar
nas livrarias no início de 2001,
com o selo Rocco.
Nessa entrevista, a titular da cadeira 16 da Academia Brasileira
de Letras fala sobre gatos e cachorros e indica outro provável
personagem de livro infantil.
Apontando para o lenço de seda
com desenho de ferraduras que
trazia no pescoço, ela disse: "Gosto mesmo é de cavalos. Em outras
encarnações, ou transmigrações,
já fui um deles", completou com
um inevitável sorriso de gato.
Folha - Como foi que a sra. decidiu fazer seu primeiro livro infanto-juvenil?
Lygia Fagundes Telles - Foi uma
historia de amor minha com esse
gatinho. Ele era listrado de verde e
amarelo, as cores de nossa bandeira, e tinha uma expressão tão
deliciosamente encantadora que
decidi que tinha de dividi-lo com
os outros. Ele era matreiro e amoroso, malicioso e, ao mesmo tempo, inocente. No desenho, ele estava de pé, com as patas para trás,
como uma criança que cometeu
uma arte e pede desculpas. Pensei: essa vai ser minha primeira
história infanto-juvenil. Eu nunca
fiz nenhuma.
Folha - A sra. ainda tem a sacola?
Telles - Claro. Vou usar a ilustração dela na capa do livro. Ainda
não terminei de escrever, mas é
uma história de amor.
Folha - Como vai chamar esse livro?
Telles - "Eu, o Gato". Não sei se
vai fazer sucesso. Os livros são
questão de sorte. O escritor não
sabe o que vai dar certo ou não.
Meu pai era jogador. Ele apostava
na roleta. Não ganhava muito,
mas dizia: "Amanhã a gente ganha". Eu jogo com as palavras.
Em "Invenção e Memória" (seu livro mais recente) eu não apostei
tanto, mas recebi muitas fichas.
Memória e invenção são uma coisa só. A memória invade ou é invadida pelo imaginário. Se você
vai contar um fato, de repente
percebe que está inventando. O
homem é incapaz de viver sem a
invenção. A invenção é a nossa
salvação. Rima e é verdade.
Folha - E como está sendo escrever para as crianças, que são tão inventivas?
Telles - Estou fazendo com a
maior facilidade. Eu gosto muito
da invenção, do imaginário. Comecei a escrever quando criança,
antes de saber escrever. Comecei
contando histórias.
Folha - Como se chama o gato,
protagonista de seu livro infanto-juvenil?
Telles - Ele é um gato estranho.
Ele se sente ao mesmo tempo excluído e inserido. Ele conversa
com outros animais, como o coelho e o macaco, mas sempre que
lhe perguntam seu nome, ele diz:
"Meu nome é gato".
Folha - Ele é "arteiro" como o gato da sacola?
Telles - Ele começa muito travesso, insubordinado, rebelde, porque ele se sente excluído. Depois
ele fica legal. De certo modo, parece que o bem vence. Ele termina
um gato boníssimo. Há uma certa
selvageria no gato. O cachorro é
menos selvagem, parecidíssimo
com o ser humano. Os cães vão
acabar falando que nem nós. O
gato mantém a selvageria.
Folha - Seu gato tem algum parentesco com o de "Alice no País das
Maravilhas", aquele que fica sempre sorrindo?
Telles - Não. O da Alice é, perto
desse, muito bonzinho. Meu gato
tem algumas malignidades. No
começo da vida ele é até meio enfezado. Espere só pra ver.
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